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Análise | Uma versão da Netflix com publicidade seria tão ruim assim?

Por| 28 de Maio de 2021 às 09h10

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Divulgação / Netflix
Divulgação / Netflix
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Se existe um mercado que não pode reclamar de monotonia esse é o de streaming. Apenas nas últimas duas semanas, a WarnerMedia realizou uma fusão com a Discovery Inc. para criar uma superplataforma de streaming e anunciou na última quarta-feira (26) a chegada do seu atual representante no setor, o HBO Max, ao Brasil. A Amazon não ficou atrás e, ainda ontem, fez um movimento dos grandes ao divulgar a compra dos estúdios MGM por US$ 8,45 bilhões. Ou seja, os players do setor estão se movimentando para competir em pé de igualdade com a poderosa Netflix.

Só que, além da concorrência, a líder do setor está enfrentando seus próprios problemas. No final de abril último, a Netflix divulgou os resultados referentes ao primeiro trimestre deste ano, alcançando o número de 208 milhões de assinantes globais. No entanto, a previsão da própria empresa era atingir 210 milhões de clientes pagos - no período, foram acrescentados cerca de quatro milhões de assinantes - sendo que os analistas esperavam seis milhões. Sem falar que isso é menos da metade dos 8,5 milhões obtidos no trimestre anterior e um quarto dos quase 16 milhões alcançados no primeiro trimestre de 2020.

A Netflix também sinalizou que seu crescimento de assinantes ainda deve demorar para se recuperar. Ela espera adicionar apenas 1 milhão de membros neste trimestre, ante os 10 milhões obtidos no segundo trimestre de 2020.

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No mais, não adiantou muito a companhia ter aumentado a sua receita em 24% em comparação ao mesmo período do ano anterior, registrando US$ 7,2 bilhões. E também ter ampliado seu lucro líquido em 140% em relação ao primeiro tri do ano passado, alcançando US$ 1,7 bilhão. Sem contar que a sua receita média por assinante é quase três vezes maior que uma de suas principais rivais, o Disney+. Mesmo com bons resultados financeiros, a empresa perdeu US$ 20 bilhões de valor de mercado.

E essa queda trouxe à tona, mais uma vez, a velha discussão: a Netflix deveria ter uma versão mais barata (ou gratuita), porém, com publicidade? E, na esteira desse tema, nós fazemos uma nova pergunta: uma versão da Netflix com publicidade seria tão ruim assim?

É o que vamos analisar nas próximas linhas.

Por que a Netflix precisaria de uma versão com publicidade?

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Primeiro, porque a empresa precisa explorar novos mercados para angariar assinantes. Muitos analistas avaliam que, nos países desenvolvidos, a companhia não tem muito mais espaço para crescer, com o número de usuários já próximo do pico.

No entanto, nos chamados mercados emergentes - Brasil incluso - há uma boa margem para conquistar novos assinantes. No entanto, nessas regiões, boa parte do público não tem um poder aquisitivo tão alto, logo, uma versão mais acessível se faria necessária. No próprio Brasil, por exemplo, o plano mais básico da Netflix custa R$ 21,90, um valor que nem todo mundo tem condições de pagar, ainda mais em tempos de crise econômica.

Além disso, é mais que o dobro do preço cobrado por uma das suas principais rivais: a Amazon, com o seu Prime Video, que cobra R$ 9,90 e ainda inclui o Prime Reading (eBooks e revistas), o Prime Gaming (para assinaturas e benefícios exclusivos em games), o Amazon Music (streaming de músicas) e o Amazon Prime, que garante frete grátis para quem compra certos produtos no e-commerce da marca.

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Analistas da Nomura’s Instinet estimaram no ano passado que a Netflix poderia ganhar mais de US$ 1 bilhão em receita publicitária anual se lançasse uma versão do seu serviço com propagandas. E, desse total, US$ 700 milhões iriam direto para a empresa na forma de lucro líquido.

E um valor desses seria mais que bem-vindo ao caixa da Netflix: a companhia planeja gastar US$ 17 bilhões em conteúdo este ano para garantir um fluxo constante de lançamentos nos próximos meses - "desde que a distribuição da vacina continue a ser bem-sucedida e a produção de suas atrações possa voltar ao normal". Vale lembrar que a empresa prometeu lançar 70 filmes - um longa inédito por semana - somente este ano.

Em quais serviços de streaming com publicidade a Netflix poderia se inspirar?

Há vários formatos, todos gratuitos. O mais famoso deles é, claro, o do Spotify. O serviço sueco de streaming de música oferece uma versão grátis onde é possível ouvir todas as músicas da plataforma, mas apenas por meio de playllists pré-definidas ou via shuffle. E também não é possível pular as canções, bem como baixá-las para escutar no modo offline ou criar as suas próprias listas de favoritos, entre outros recursos. Além disso, claro, você precisa ouvir anúncios entre todas faixas.

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Mesmo com essas limitações, dos 320 milhões de usuários ativos do Spotify atualmente, 55% (176 milhões) são adeptos do modelo gratuito do serviço. Os outros 144 milhões optam pela versão paga.

Um outro formato no qual a Netflix poderia se inspirar é o AVOD (Advertising-Based Video on Demand) e cujo representante mais conhecido é a Pluto TV. A plataforma, pertencente a ViacomCBS, chegou ao Brasil em dezembro último e oferece 30 canais lineares (ao vivo), com curadoria e conteúdo (filmes, séries e desenhos) de produtores como Nickelodeon, Nick Jr., Comedy Central, Paramount Network, Telefe, Vidcon, entre outras.

O modelo de geração de receitas da plataforma é semelhante ao das TVs tradicionais: ou seja, o serviço é totalmente gratuito aos assinantes e ganha dinheiro a partir de anúncios em intervalos comerciais de dois minutos a cada 10 ou12 minutos de uma atração transmitida. Com isso, para cada 50 minutos de conteúdo, serão dez de publicidade. E que precisam ser assistidos por completo, sem a chance de pular. A Pluto TV estima que deve faturar quase US$ 790 milhões em publicidade neste ano, somente nos EUA.

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Além disso, outros serviços de streaming de TV nos EUA também contam com anúncios para gerar parte de sua receita. Entre eles, estão o Hulu (da Disney), o CBS All Access e o Peacock, da NBCU. Podemos listar ainda o The Roku Channel (Roku), o IMDb TV (Amazon), o TUBI e o Discovery+, serviço de streaming da Discovery Inc, que acabou de se unir a WarnerMedia. E cujo modelo publicitário foi bem aceito por usuários e o mercado, segundo o seu CEO, David Zaslav.

E por que a Netflix resiste em ter publicidade em sua plataforma?

Porque, basicamente, a empresa teria de enfrentar adversários ferozes e mais consolidados para ganhar a sua fatia no bolo publicitário digital: mais precisamente a Amazon, Facebook e Google. Em janeiro de 2020, o Reed Hastings, CEO da Netflix, afirmou durante a conferência de resultados, que “não há dinheiro fácil” em um negócio de publicidade online em que tem que competir com as Big Techs.

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Na ocasião, o executivo explicou:

"Elas [as Big Techs] são tremendamente poderosas em publicidade online porque estão integrando muitos dados de muitas fontes. Isso tem um custo comercial, mas isso torna a publicidade mais direcionada e eficaz. Então, acho que esses três vão ficar com a maior parte deste negócio. "Para aumentar um negócio de publicidade de US$ 5 bilhões a US$ 10 bilhões, você precisa 'arrancar isso' dos provedores existentes. E roubar negócios de publicidade online da Amazon, Google e Facebook é bastante desafiador. Não há dinheiro fácil nisso”.

O depoimento de Hastings mostra que ele vem acompanhando o setor. O último balanço trimestral da Alphabet (controladora do Google) aponta que a receita de publicidade gerada no YouTube cresceu 49% no ano a ano, registrando US$ 6 bilhões. Para efeito de comparação, a plataforma de vídeos chegou perto da própria Netflix, que gerou US$ 7,2 bilhões em faturamento no mesmo período. E isso porque o YouTube não incluiu nesse balanço seus ganhos com assinaturas da sua versão Premium, E seus custos com produção de conteúdo são muito mais baixos que os da Netflix.

E para além da fatia publicitária nos meios digitais, uma versão com anúncios colocaria a Netflix em briga também a TV aberta. Em coluna para o Canaltech, Cesar Sponchiado, fundador e CEO da TunAd, divulgou um levantamento do Interactive Advertising Bureau (IAB) que aponta que mais da metade dos investimentos de publicidade nos streamings e TVs conectadas em 2021 virá do orçamento previsto para a TV aberta.

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Se a Netflix não vai à publicidade, a publicidade vai até ela

E mesmo que a Netflix venha resistindo bravamente em inserir anúncios em sua plataforma, isso não quer dizer que ela não possa faturar com publicidade, mais especificamente com o marketing indireto. Uma reportagem do jornal The New York Times, de dezembro de 2019, mostrou que a empresa trabalhou com a rede de lanchonetes Subway para promover o sanduíche Green Eggs and Ham Sub na série animada infantil "Ovos Verdes e Presunto", baseada no livro do Dr. Seuss.

Em outra promoção cruzada, a Netflix cobrou uma taxa de licença da marca Diesel para que essa última pudesse criar uma linha roupas inspirada na série La Casa de Papel. A empresa também já trabalhou com a Samsung e a marca Aviation American Gin em um comercial que promovia a bebida e o filme "Esquadrão 6". E considerando como o longa era ruim, você precisaria mesmo de uma bela dose de gim para encará-lo.

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O New York Times também afirmara na época que a Netflix criara uma divisão responsável por parcerias com as marcas. Até julho do ano passado, ela era liderada por Barry Smyth, então vice-presidente global do setor e que contratou profissionais da Fox, Lionsgate, entre outras empresas do setor cinematográfico. A companhia, inclusive, ampliara o escopo desse setor para a Europa. Hoje, Smyth é VP de Marketing da companhia para a região Ásia-Pacífico. Nos EUA e Canadá o cargo é ocupado por Adam Waltuch. O desafio maior, no entanto, é ver até quanto esse tipo de ação de marketing pode gerar receitas, em comparação ao modelo publicitário tradicional, com anúncios mais diretos.

Mas, marketing indireto à parte, será que a Netflix conseguirá resistir à tentação em criar uma versão da sua plataforma com anúncios? Os próximos balanços trimestrais dirão.

E você toparia usar o serviço nesse formato?

Com informações do TechCrunch, Statista, The New York Times, Variety, Deadline