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Crítica | The Block Island Sound tem muito peso e nenhuma profundidade

Por| Editado por Jones Oliveira | 19 de Março de 2021 às 21h00

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30 Bones Cinema
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Existe um simbolismo no terror de The Block Island Sound que parece enraizado no melhor do horror cósmico de H. P. Lovecraft. Personagens presos entre dois grandes azuis, o da água e o do céu, e lutando para pertencer à terra — o menor dos espaços — pode ser aterrorizante. Em meio a isso, a morte da vida selvagem e comentários conspiratórios carregam o filme de estranhezas e podem despertar a curiosidade de qualquer espectador.

Não demora, porém, para que O Mistério de Block Island (título nacional) comece a se tornar estranho no mau sentido. Se, inicialmente, a direção dos irmãos McManus consegue aproveitar bem a situação com seus planos fechados e claustrofóbicos, a partir do momento em que passa a investir mais na história do que nas sensações, o que foi despertado começa a se dissolver.

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Atenção! Esta crítica pode conter spoilers sobre o filme!

Abraço duplo, mas vazio

Existe uma preocupação onipresente na abordagem dos irmãos McManus, que corresponde a tentar manter vivo um diálogo sobre declínio mental. Ao mesmo tempo em que isso pode humanizar o filme, também faz com que as investidas sobrenaturais fiquem presas a uma condição delicada. Com isso, ambos os lados perdem força: tanto a improvável doença mental hereditária quanto as estranhas manifestações vistas por Harry (Chris Sheffield) e, antes, pelo seu pai, Tom (Neville Archambault).

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A curiosidade inicial, aos poucos, parece perder espaço para um terror visual e este terror, por sua vez, vai minando a curiosidade. É um jogo parecido o que ocorre com O Homem Invisível (de Leigh Whannell, 2020), por exemplo, mas sem a menor chance de permanecer potente por muito tempo. Naquele filme, o espectador compartilha da luta da protagonista. Em The Block Island Sound, não há esse espaço. Harry e Tom não são construídos a esse ponto e o terror é tão visível que pode se tornar, depois de algumas repetições, cômico.

Dessa maneira, o filme também se afasta de outros paralelos que poderiam ser interessantes, tanto pela sua temática de se viver no menor dos espaços quanto pela sua tentativa de ser interessante sobre questões mentais. Produções recentes como A Vastidão da Noite (de Andrew Patterson, 2019) e Deterioração (de Natalie Erika James, 2020) parecem ser mais focadas nesse sentindo, optando por deixar uma das questões em foco e alcançando, cada uma ao seu modo, o que The Block Island Sound tenta abraçar duplamente.

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Tudo está ali, mas nada está de verdade

Além de tudo, os diálogos do roteiro (escritos pelos próprios McManus) sobrecarregam o filme de temáticas pseudorelevantes, como as teorias de um personagem que aparece no início como sendo um pateta e retorna muito tempo depois só para trazer verdades que soam como conspiratórias. Os diretores investem em tudo — do velho Tom que se torna, na prática, uma aparição para Harry à relação deste com uma segunda irmã que surge quase do nada — como se estivessem criando uma grande situação a ser revelada de maneira surpreendente. Simultaneamente, pode ficar a sensação de que eles querem que tudo seja levado como sendo de extrema importância; que tudo seja parte de algo muito maior; que tudo resulte no desfecho de horror cósmico extraordinário.

Os McManus parecem esquecer, portanto, que muito do que se torna relevante em um filme é construído por detalhes. Ao buscar, aparentemente, fazer de cada pormenor algo grande, os diretores tiram os contrastes de The Block Island Sound, tiram o peso das descobertas, tiram a força de um universo que poderia, de repente, ser tão rico quanto os dos citados A Vastidão da Noite e Deterioração.

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No final das contas, a relação entre homens e peixes (ou homens e os demais animais que são estudados), que ganha uma explicação repetida pela voz off de Audry (Michaela McManus) no final, é mais um elemento com muito peso e sem profundidade. Se o ser humano já é de uma pequenez absurda em relação ao próprio planeta, quando comparado ao universo é de uma irrelevância completa. É uma pena, então, que nada disso esteja exposto no filme... por mais que tudo esteja ali.

The Block Island Sound está disponível na Netflix.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Canaltech