Crítica A Princesa da Yakuza | A máfia japonesa com sotaque brasileiro
Por Durval Ramos • Editado por Jones Oliveira |
É tão raro vermos um filme de ação nacional mais puxado para a fantasia que A Princesa da Yakuza logo salta aos olhos. Longe dos debates sociais que o cinema brasileiro tanto gosta de tratar, ter uma história escapista de máfia e samurais no meio de São Paulo é algo que chama a atenção de imediato.
Baseada na HQ Samurai Shirô, do brasileiro Danilo Beyruth, o novo filme da Netflix usa a maior cidade do país como palco de uma clássica história de Yakuza, repleta de mafiosos mal encarados, traições, disputas por poder, espadas e um forte apego a tradições. É uma mistura curiosa que funciona, apesar de vários tropeços no caminho.
Isso porque a premissa básica do longa é realmente muito boa. A ideia de ter um braço da yakuza no meio de São Paulo e isso desencadear uma guerra no submundo oriental da cidade é algo tão fantasioso que se torna charmoso por si só. Contudo, o que tinha tudo para ser algo incrível esbarra em atuações medianas e um roteiro que perde tempo com as coisas erradas.
A Anastácia nipônica
A trama de A Princesa da Yakuza é praticamente uma releitura da história de uma outra princesa — a russa Anastasia, filha do czar Nicolau II que teria sobrevivido ao massacre da família real e vivido escondida até ter se tornado uma lenda. Assim, acompanhamos Akemi (Masumi), uma jovem descendente de japoneses que vive no bairro da Liberdade, em São Paulo, sem saber que é herdeira de uma poderosa família da máfia japonesa que é dizimada quando ela ainda era criança.
E tudo isso vem à tona quando ela se depara com um estranho homem sem memória (Jonathan Rhys Meyers) que carrega apenas uma katana. Com isso, ela e esse misterioso indigente entram na mira da Yakuza e precisam correr não apenas para sobreviver, mas também para decifrar o que diabos está acontecendo.
Como dito, é uma premissa muito boa e que remete aos clássicos filmes de ação japoneses, trazendo todos os elementos que marcam esse tipo de história. Até mesmo a estética foi muito bem reproduzida, aproveitando a claustrofobia das ruas da Liberdade para criar essa sensação de que os personagens estão mergulhando em uma camada invisível da cidade.
Só que a preocupação de A Princesa da Yakuza em recriar esse clima de thriller policial é tão grande que o diretor Vicente Amorim se perde no próprio ritmo da história que está sendo contada. Ele passa tanto tempo plantando e esticando mistérios que rapidamente se torna cansativo, pois a trama principal demora a se desenrolar.
São tantos personagens que sabem o que está acontecendo e não podem dizer nada ou que apenas falam de forma enigmática que chega a ser irritante. Até porque o espectador sabe desde o início qual é o grande segredo que está sendo guardado e todo esse clima que o filme tenta compor se torna apenas um andar em círculo que não leva a lugar nenhum.
Isso faz com que, embora tenha um pouco menos de duas horas de duração, o longa parece ter muito mais do que isso justamente por causa dessa lentidão que toma conta da narrativa a maior parte do tempo.
E isso prejudica também o desenvolvimento dos próprios personagens. A dupla de protagonistas já não atua muito bem — Masumi não é nem mesmo atriz, mas cantora — e a falta de tempo para explorar a relação de Akemi com o homem sem memória faz com que você não se importe de verdade com nenhum deles e muito menos com o vínculo que, em tese, eles deveriam criar.
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Por causa disso, a grande reviravolta que é apresentada fica sem peso algum.
Novo fôlego
Apesar desses tropeços, A Princesa da Yakuza se recupera muito bem em sua segunda metade — que é justamente onde a ação está concentrada. É a partir do momento em que o roteiro deixa de perder tempo criando suspense que ele ganha um novo ritmo e fica muito mais interessante.
É nesse momento que você percebe a influência dos quadrinhos e de todos os filmes de yakuza que o longa absorve. Mais uma vez, ele usa muito bem a ambientação em São Paulo para criar esse submundo e ver a personagem caindo no soco com mafiosos em meio aos becos ou fazendo a katana cantar em meio às festas cheias de néon do bairro é realmente divertido e empolgante.
Parte desse novo ar que o longa retoma acontece graças à entrada de Takeshi (Tsuyoshi Ihara) à trama. Ele carrega muito bem essa postura de mafioso japonês e entrega uma interpretação muito boa tanto quando você não faz ideia de suas motivações quanto quando ele revela o que realmente está acontecendo.
Dessa forma, apesar do começo bastante lento e sem ritmo, A Princesa da Yakuza entrega uma reta final que era justamente aquilo que a gente espera quando dá o play: uma história de ação fantasiosa e divertida em um local que nos é muito familiar. É um filme que demora a pegar no tranco, mas que vai muito bem depois que finalmente engata a marcha certa.
Vale a pena assistir a A Princesa da Yakuza?
O começo lento e até mal resolvido de A Princesa da Yakuza é realmente problemático, mas ele ainda assim entrega uma história interessante e com uma boa dose de ação — e que até poderia ter mais se não se apegasse tanto a detalhes não tão importantes assim.
A aposta nacional da Netflix pode até não ser incrível, mas é competente, intrigante e, acima de tudo, divertida. É a prova de que temos obras que podem render boas adaptações e que ainda há muita fantasia a ser explorada por aqui.
A Princesa da Yakuza pode ser assistido no catálogo da Netflix.