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Livro de Miguel Nicolelis faz questionar a capacidade do cérebro humano

Por| Editado por Luciana Zaramela | 29 de Março de 2021 às 10h49

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No final de novembro, a equipe do Canaltech participou de uma conversa com o neurocientista Miguel Nicolelis, professor da Universidade Duke, nos Estados Unidos. Agora, recebemos seu livro, O verdadeiro criador de tudo: como o cérebro humano esculpiu o universo como nós o conhecemos. Nele, o autor apresenta uma teoria de como o cérebro humano evoluiu para se tornar um computador orgânico sem rival no universo conhecido.

O livro em questão chega para completar uma trilogia iniciada em 2011 com o lançamento de Muito Além do Nosso Eu (Companhia das Letras) e continuada por Made in Macaíba, publicado em 2016 pela Editora Planeta. Quem já conhece o trabalho de Nicolelis sabe que o neurocientista ressalta a importância do papel do cérebro humano sobre tudo o que conhecemos. Seu ponto de vista já atraiu críticas e já atraiu admirações, e esse livro se trata de submergir nessa ideia e entender, de uma vez por todas, do que o neurocientista está falando quando se refere ao "verdadeiro criador".

É por meio de uma escrita fluida e impactante, com breves citações de momentos de sua vida que fazem toda a diferença para tornar o autor íntimo de sua própria obra e se conectar com o leitor, que Nicolelis traz questionamentos dignos de precisar fechar o livro, parar alguns instantes para refletir e tomar um gole de chá antes de voltar para aqueles mares de informações.

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O verdadeiro criador de tudo

"No princípio, o Verdadeiro Criador de Tudo proclamou: que haja luz. Depois de um breve silêncio, ele, então, decretou: e que ela seja E = mc²". É com essa frase que o conteúdo se inicia. O autor disserta que no início, havia apenas um cérebro de primata e, de suas profundezas, veio tudo o que hoje conhecemos: a linguagem oral, a escrita, os pensamentos abstratos e, por que não, o livre-arbítrio. 

"O Verdadeiro Criador de Tudo é uma estória sobre as criações do cérebro humano e a posição central que ele deveria ocupar na cosmologia do universo. Em resumo, o universo humano inclui tudo aquilo que define, para o bem e para o mal, o nosso legado como espécie", afirma. 

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Nicolelis ainda aborda a Teoria do Cérebro Relativístico (TCR), cuja premissa é descrever como o cérebro, trabalhando isoladamente ou enquanto parte de grandes redes formadas por outros cérebros, executa os seus feitos.

Ao longo do livro, o renomado neurocientista ressalta que o cérebro computa com a sua massa, ou seja: as sinapses não só liberam neurotransmissores para fazer a transmissão de potencial de ação. Ele explica que as proteínas que formam a membrana pré sináptica mudam sua configuração terciária e quaternária no momento dessa transmissão, e que a computação se dá como uma régua de cálculo antiga, como uma orquestra sinfônica que, a cada nota produzida, reconfigura fisicamente os instrumentos. Para o neurocientista, o universo que nós conhecemos é um universo humano, ou seja: é a tradução do que existe aqui fora de acordo com os limites da mente humana.

Brainets: sincronizando cérebros

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Vale o risco dizer que um dos capítulos mais importantes dentre os 14 que compõem o livro é o 7 - Brainets: sincronizando cérebros para gerar comportamentos sociais. É nessa parte da narrativa que Nicolelis traz à tona os experimentos necessários para a compreensão da ideia de uma brainet, que parte do princípio de cérebros atuarem simultaneamente para realizar um objetivo motor único,

Na ocasião, o autor cita um estudo com voluntários realizado em Durham, na Carolina do Norte. O experimento envolvia controlar os movimentos de um braço virtual, projetado na tela do computador. Uma vez que conseguissem mover o braço virtual, a ideia era fazer com que a mão virtual alcançasse o centro de uma esfera que, no começo de cada tentativa, aparecia em locais aleatórios na tela. Só que os participantes não podiam movimentar o corpo para controlar o braço virtual: eles precisavam literalmente usar a atividade elétrica produzida pelos três cérebros para gerar o movimento.

Quando conversamos com Nicolelis, o neurocientista explicou melhor um pouco da ideia por trás da Brainet: "Oito bilhões de mentes sincronizadas instantaneamente através de um vírus informacional que poderia ser disseminado na velocidade da luz por um meio de comunicação que conectaria o cérebro de todos nós diretamente. Esse é o limite da ideia, mas esse mecanismo de sincronização das mentes humanas existe desde que nós descemos das árvores e fomos caminhar pelas savanas africanas em busca de um propósito", refletiu, na época.

No livro, o autor conta uma série de experimentos que se seguiu, para então apresentar sua definição operacional de Brainet. "um computador orgânico distribuído composto de múltiplos cérebros individuais, que se sincronizam no domínio analógico por um sinal externo, como luz, som, linguagem, química, ondas de rádio ou eletromagnéticas, e é capaz de produzir comportamentos sociais emergentes". Para Nicolelis, o computador orgânico humano é capaz de transformar informação fornecida pelo universo em um conhecimento a ser transmitido a gerações futuras, para dar continuidade à construção do seu próprio universo.

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O livro se encerra com um questionamento: o que o futuro reserva para o Verdadeiro Criador de Tudo (ou seja, para o cérebro humano)?  Essa é uma questão que nem o próprio Nicolelis sabe responder. No entanto, ele finaliza com uma afirmação poderosa: "não haverá máquina capaz de superar".