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Crítica Indiana Jones e a Relíquia do Destino | Uma lenda nunca sai de moda

Por  • Editado por Jones Oliveira | 

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Lucasfilm
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Indiana Jones é um herói à moda antiga. Daqueles que não tem super-poderes, não luta para salvar o mundo e nem conta com uma conveniente invulnerabilidade a tiros e pancadas — e tampouco tem direito a uma aposentadoria. Ele é apenas alguém que se joga em direção ao perigo e corre todos os riscos que uma pessoa comum enfrentaria em nome da aventura. Embora se metesse em situações muito peculiares ao longo desses mais de 40 anos de histórias, ele sempre foi humano.

E o novo Indiana Jones e a Relíquia do Destino é justamente uma ode à humanidade desse personagem tão carismático e adorado do cinema. O herói que virou sinônimo de um gênero e que ajudou Harrison Ford a se tornar uma lenda retorna para uma última aventura que explora justamente suas vulnerabilidades e fraquezas, suas dores e perdas.

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Só que, longe de fazer desse crepúsculo um retrato da decadência do protagonista, o novo filme encerra em grande estilo a jornada dessa figura tão emblemática ao evidenciar que é a partir de suas falhas e arrependimentos que ele se torna tão próximo de nós. Apesar de tudo, ele é gente como a gente.

Em uma era em que os heróis são sempre tão super e inalcançáveis, é muito bom ter o velho Indy de volta à ação, com todas as suas limitações e manias, para nos mostrar a força de sua humanidade. Em uma trama simples que reaproveita tudo aquilo que a série sempre teve de melhor, A Relíquia do Destino nos lembra o quanto aquilo que nos inspira jamais envelhece e nunca morre — no máximo, fica dormente à espera de um novo chamado.

O crepúsculo do herói

A figura de Indiana Jones e Harrison Ford sempre foram muito interligadas e, no novo filme, isso é ainda mais forte. Afinal, a última aventura do herói marca a despedida de seu intérprete depois de 40 anos de história. E, como o próprio Ford já havia comentado em entrevistas, a ideia era fazer essa conclusão colocando o aventureiro em um dos pontos mais baixos de sua vida — em um momento de normalidade.

A trama abraça essa ideia de que Indy é o herói das antigas da forma mais cruel possível, destacando o quanto ele não se encaixa mais no mundo à sua volta. Assim como todos os tesouros que coletou em suas aventuras, ele se torna essa velharia esquecida cujo lugar é um museu. Em um momento em que todos estão olhando para o céu e admirando a conquista espacial, pouco sobrou para um velho arqueólogo.

É por isso que as duas sequências iniciais de A Relíquia do Destino são tão poderosas. Embora a primeira parte se estenda um pouco mais do que o necessário, ela serve para nos lembrar o que Indiana Jones sempre foi: esse herói que, embora muito humano e ainda falho, era alguém que não tinha medo de se arriscar. E todo esse momento é empolgante e de tirar o fôlego, do jeito que a gente espera do personagem.

Assim, quando a trama avança algumas décadas e traz um Indy já bastante envelhecido e “preso” a uma sala de aula, o impacto é enorme. Longe das aventuras e dos perigos da sua juventude, o protagonista se torna apenas um idoso preso ao passado e desconectado do presente. É um contraste feito para chocar e deixar claro que os dias de glória ficaram para trás e que não há mais espaço para um Indiana Jones neste novo mundo de astronautas e foguetes.

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E mais do que ser uma brincadeira (ou um pedido de desculpas) com o terrível O Reino da Caveira de Cristal, essa decadência do personagem serve para situar o estado de seu espírito. Mais do que o explorador aposentado, Indy é alguém que carrega suas próprias dores, como o fracasso como pai e marido.

É ao trazer Indiana Jones sem suas verdadeiras paixões — a família e a aventura — que A Relíquia do Destino trabalha a humanidade de seu protagonista. Afinal, o que nos move quando tudo o que nos resta são as memórias amargas das nossas falhas e o peso do arrependimento de não ter feito tudo diferente?

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Uma nova chance

É nesse ponto que a temática da viagem no tempo é inserida e muito bem trabalhada. E não apenas pela relíquia do título, que permitiria ao usuário voltar ao passado e reescrever a História a seu modo. Para além desse divertido MacGuffin, o longa traz Helena para também representar esse retorno para o velho Indy. A personagem de Phoebe Waller-Bridge é a afilhada de Jones e uma exploradora (a seu modo) que procura o padrinho para resolver um problema e, assim, o puxa de volta à ação.

E ela é uma das melhores coisas de A Relíquia do Destino com certa folga. Ela é quem reacende a chama do herói, dando-lhe nova motivação para viver em um momento em que ele já estava entregando os pontos e aceitando a vida comum que lhe esperava com a aposentadoria. Com sua chegada, porém, Indiana se vê impelido a se jogar mais uma vez em direção ao perigo.

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Helena é esse espírito aventureiro que o protagonista acreditava não ter mais espaço no mundo moderno. E, de certo modo, ele está certo, pois a jovem é também um fruto desse momento. Longe de ser a visão romântica que sempre acompanhou a figura de Indiana Jones, Helena está muito mais para um Nathan Drake, da franquia Uncharted: uma ladra muito carismática que está muito mais pelo lucro do que pelo valor histórico de suas jornadas.

Essa diferença é crucial tanto para reforçar o quanto o protagonista ainda está deslocado do mundo atual como também para criar uma dinâmica incrível entre os personagens. Todos os diálogos entre eles são ótimos e a entrega de Waller-Bridge nesse papel de uma cretina apaixonante é apaixonante — de modo que ninguém acharia ruim vê-la encabeçando sua própria franquia no futuro.

Só que o que torna Helena uma personagem tão interessante é o efeito que ela causa em Indy. Como dito, ela é a responsável por reacender a chama do herói, mas também de mostrar a ele que nem tudo está perdido. Ela é a família que Indy acreditava ter perdido. Sem que ele perceba — e até a contragosto —, ela se torna a chance do protagonista recomeçar.

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Soque um nazista

Embora todo o arco dramático de Indiana Jones e a chegada de Helena sejam os pontos altos de A Relíquia do Destino, a gente não pode perder de vista a parte divertida da trama. Toda a corrida atrás do Medidor de Arquimedes e a perseguição ao vilão Voller (Mads Mikkelsen) recriam aquilo que a série sempre teve de melhor.

O ritmo acelerado e os momentos bastante criativos estão presentes e muito bem trabalhados para criar tanto o senso de perigo como para desafiá-los intelectualmente. É algo que a trilogia original fez muito bem e que o diretor James Mangold consegue recriar tão bem.

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Toda a sequência inicial, com um Harrison Ford rejuvenescido digitalmente pulando sobre trens e socando nazistas, é mais do que uma apresentação do herói para as novas gerações. É uma homenagem ao legado da franquia. E a escolha de Mikkelsen para viver esse vilão que não é tão dúbio assim, mas emana uma ameaça constante que evoca demais a figra de Arnold Toth, o vilão do primeiro Indiana Jones.

E embora esse seja o primeiro filme da saga a não contar com Steven Spielberg por trás das câmeras, a escolha de Mangold para assumir o papel não poderia ser mais adequada. Ele deixa claro o quanto reverencia o personagem, os atores, seus criadores e toda a mitologia da série, mas faz questão de imprimir seu tom na película.

Isso faz com que ele conduza muito bem o clima aventuresco de sempre com essa nova toada mais melancólica do ocaso do herói que a gente já tinha visto em Logan. E ele faz essa costura tão bem e em tanta sintonia com o elenco que rende alguns momentos memoráveis — como o desabafo final de Indiana.

O adeus de Indiana Jones

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Se O Reino da Caveira de Cristal deixou um gosto amargo nos fãs, A Relíquia do Destino vem para fechar em grande estilo a história de um dos personagens mais icônicos do cinema. Com um Indiana Jones vulnerável e totalmente humano, o longa presta todas as homenagens possíveis a essa lenda sem se apoiar na muleta da nostalgia e com a força de seus próprios méritos.

Ainda que a trilha sonora marcante de John Williams esteja presente, ela é muito bem utilizada em momentos bem pontuais. São apenas alguns acordes em tom mais melancólico que surgem sempre que a fagulha da aventura insiste em aparecer nesse Indy já cansado e fragilizado. Mais do que um afago saudosista, é um lembrete de que certas coisas não morrem jamais.

Pois é exatamente essa a tônica de Indiana Jones e a Relíquia do Destino. Apesar dos arrependimentos do próprio protagonista e de ele acreditar não ter espaço mais no mundo moderno, o filme deixa claro que esse é um fogo muito difícil de se apagar. Às vezes, só é preciso um chacoalhão para que nos joguemos de volta aos riscos.

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E, acima de tudo, sempre haverá espaço para Indiana Jones.