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O que é a Regra de Bredt, que foi reavaliada por químicos

Por  • Editado por Luciana Zaramela |  • 

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Vladimirzotov/Envato
Vladimirzotov/Envato

Recentemente, um evento importante na química ganhou as manchetes: foi a Regra de Bredt, desbancada por uma equipe da Universidade da Califórnia, com importantes implicações para o campo da química orgânica e da farmacologia. Mas o que isso significa e por que a regra foi refutada, afinal? Para saber mais, o Canaltech conversou com Ubiracir Fernandes Lima, conselheiro do Conselho Federal de Química (CFQ).

Basicamente, de acordo com o químico, a regra dizia que um tipo específico de organização de moléculas orgânicas não era possível, já que deixaria os átomos instáveis demais, quebrando-se em seguida. Para a ciência, isso quer dizer que fabricar alguns compostos com base nessa organização seria impossível — eles poderiam incluir remédios contra câncer, por exemplo.

Segundo Julius Bredt (1855 - 1937), importante químico alemão do século XX, moléculas orgânicas que incluem carbono só poderiam, quando em dupla ligação (SP2), ter um único carbono na posição cabeça-de-ponte.

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Assim, olefinas — ou alcenos —, usadas na fabricação de remédios, possuem uma ou mais ligações duplas entre átomos de carbono, o que faz com que fiquem em um formato plano, chato. Em outras palavras, se tivessem um segundo carbono na cabeça-de-ponte, as moléculas ficariam tridimensionais, mas instáveis demais, existindo por pouco tempo antes de colapsarem.

Por que os químicos reavaliaram a regra de Bredt

A regra foi proposta em 1924, e, apesar de chegar a figurar nos livros de química por todo o mundo, muitos cientistas buscavam desafiá-la, já que isso seria benéfico para a fabricação de remédios mais eficientes. Algumas pesquisas, ao longo das décadas, indicaram que olefinas anti-Bredt (ABOs, que vão contra a regra) seriam possíveis por tempos mais longos, mas ninguém havia conseguido sintetizá-las.

Foi então que Neil Garg, da Universidade da Califórnia, exatamente 100 anos depois, conseguiu o feito: junto à sua equipe, ele tratou um composto precursor com fluoreto, o que gerou uma reação de “eliminação”. Átomos foram eliminados da molécula até gerar a infame ligação ABO, com duplo carbono.

Os pesquisadores tiveram, então, que testar vários agentes de captura para manter as moléculas estáveis. Isso permitiu a existência prolongada da ABO 3D, que poderá agora ser usada para confeccionar moléculas mais complexas. Anteriormente, comenta Lima, as moléculas eram mais previsíveis na fabricação de remédios, por exemplo, mas mais limitadas na sua composição.

O conselheiro aponta, no entanto, que o termo "refutar" não é muito adequado para a descoberta — toda regra tem sua exceção. O que os cientistas descobriram foi uma situação especial onde olefinas conseguem, de fato, sobreviver com uma ligação de carbono dupla em posição cabeça-de-ponte, mas a regra continua a valer sem uso dos agentes de captura

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Isso quer dizer que, apesar da descoberta ser revolucionária para alguns campos, como a farmácia, não será preciso "reescrever os livros de química", de acordo com Lima. O mais provável é que, em reedições futuras, a exceção possa ser inclusa como uma curiosidade ou exemplo interessante.

Qual o impacto da descoberta de Neil Garg na indústria farmacêutica?

De forma simplificada, as ABOs são compostos quirais — isso quer dizer que elas são moléculas que não se espelham perfeitamente, ou seja, inverter a ordem das moléculas pode causar efeitos diferentes dos pretendidos. A boa notícia é que a equipe de Garg conseguiu isolar uma ABO enantioenriquecida, produzindo mais de um par espelhado do que um alceno comum.

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O significado disso tudo é que as ABOs geradas podem se tornar uma base incomum para compostos farmacêuticos, abrindo a possibilidade de remédios mais complexos. Eles incluem, por exemplo, o medicamento de tratamento quimioterápico paclitaxel, formado por uma molécula de vários anéis difícil de se criar em laboratório.

Um dos compostos do paclitaxel é o taxol, que, segundo Lima, contraria a regra de Bredt. Com a descoberta, há mais um caminho viável para sintetizar o remédio anti-câncer — facilitar o processo ajudará muito na confecção de remédios contra a doença.

Garg e sua equipe estão buscando outras reações com olefinas anti-Bredt, além de estarem estudando outras moléculas com estruturas consideradas impossíveis. Isso, no futuro, poderá ajudar ainda mais a indústria farmacêutica e facilitar o tratamento de inúmeras doenças.

Artigo atualizado em 11/11/2024 

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Fonte: Nature, JACS, Organic Chemistry

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