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Apple vs. Gradiente: o que está por trás da disputa pela marca iPhone no Brasil?

Por| 14 de Agosto de 2020 às 20h30

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Montagem Canaltech
Montagem Canaltech

O mundo foi surpreendido nesta semana com a notícia de que o processo na Justiça entre Gradiente e Apple pela marca iPhone chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF). Não é exagero: a notícia realmente chegou à imprensa internacional. Mas o que pode acontecer quando a corte suprema brasileira tomar uma decisão? O Canaltech conta, agora, para você.

A chegada do caso ao STF já havia sido noticiada em maio e agora voltou às manchetes de sites de tecnologia aparentemente após a firma de advocacia que representa a IGB Eletrônicos/Gradiente publicar um press release sobre o caso. De fato, o Supremo terá que decidir se mantém a vitória da Apple conquistada em instâncias inferiores da Justiça brasileira ou se garante direito à Gradiente, que solicitou o registro da marca ainda no ano 2000.

“O presidente do Supremo entendeu a relevância do caso para nossa soberania e a proteção à propriedade intelectual no Brasil”, disse fundador da Gradiente, Eugenio Staub, de acordo com o comunicado divulgado à imprensa. Neste momento, a marca "iphone" está registrada no INPI para a Apple, enquanto o pedido feito pela empresa brasileira consta como arquivado.

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Possíveis desdobramentos

O Canaltech entrou em contato com um especialista para entender o imbróglio. Advogado da área de tecnologia do escritório Abe Giovanini Advogados, Marcelo Cárgano explicou que, caso a Gradiente/IGB Eletrônica consiga reverter a derrota sofrida no Superior Tribiunal de Justiça (STJ), em 2018, a Apple não poderia mais utilizar o nome iPhone em seus dispositivos aqui no Brasil.

“A Apple poderia, porém, entrar em um acordo de licenciamento com a IGB que permitisse o uso da marca”, explicou Cárgano. “Noto que mesmo nos Estados Unidos a Apple já fez um acordo extrajudicial com a Cisco para usar a marca iPhone, que pertencia à subsidiária da Cisco Linksys”, observou o advogado.

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Vamos por partes. A Apple já tentou entrar em acordo com a Gradiente no passado, mas a fabricante brasileira recusou. O que não significa que, depois de ter garantido pelo STF o direito de exclusividade da marca, a empresa não aceite voltar a negociar com a Maçã, agora com a carta na manga de que, se a empresa de Cupertino não aceitar os seus termos, correria o risco de não poder usar a marca no país.

Quanto ao caso do acordo pelo uso da marca iPhone, os EUA não são o único país onde a Apple teve que ceder. No México, uma empresa de nome iFone fez o registro em 2003 e conseguiu vencer na Justiça local a exclusividade do nome. Note que, neste caso, há até uma diferença de grafia, e mesmo assim a Maçã teve que entrar em acordo para continuar vendendo seu celular no país vizinho aos EUA.

Por que o STJ deu ganho de caso à Apple?

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Na briga brasileira, a Gradiente chegou a vencer em instâncias inferiores, mas passou a sofrer derrotas conforme a Apple apelava a instâncias superiores. No STJ, a Quarta Turma entendeu que, apesar de o registro da marca dar à empresa o direito de explorá-la comercialmente, “também tem a função de proteger os adquirentes de produtos ou serviços, para que esses possam se certificar sobre a origem e a qualidade do produto ou serviço”, explicou Cárgano.

Em outras palavras, o STJ entendeu que a exclusividade no uso da marca iPhone, hoje, pode confundir o consumidor, que compraria um celular da Gradiente acreditando ser o rival feito pela Apple. Mas a decisão não se baseou apenas nisso.

“Também foi fundamental para a decisão no STJ o conceito de ‘marca sugestiva’ ou ‘evocativa’, que são expressões que sugerem determinada característica do produto ou do serviço: ‘iphone’, por exemplo, sugere ‘internet phone’”, observou o advogado. “Embora as marcas sugestivas sejam registráveis e passíveis de serem apropriadas, elas possuem um limitado escopo de proteção e devem arcar com o ônus de coexistirem com marcas relativamente semelhantes”, ressaltou Cárgano.

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Em outras palavras, o STJ entendeu que o nome "iphone" sugere uma característica do produto, mais do que uma marca. A Gradiente pode utilizar o nome em seus celulares, desde que devidamente identificado como um produto diferente daquele vendido pela Apple.

De acordo com a decisão, "iPhone" hoje está fortemente atrelado ao celular da Maçã a fim de atender a quatro funções de marca: (a) identifica o produto, distinguindo-o dos congêneres existentes no mercado; (b) assinala sua origem e procedência; (c) indica seu padrão de qualidade; e (d) funciona como instrumento de publicidade. Isso, porém, não pode ser dito dos aparelhos da linha "G Gradiente Iphone", da IGB, segundo a conclusão do STJ.

“Também contou para a decisão da Corte o fato de que, embora a IGB tenha depositado o pedido de registro em 2000, o primeiro aparelho foi lançado somente em 2012, quando a marca “iPhone” da Apple já era mundialmente famosa”, observou o advogado, ressaltando ainda que a Gradiente pode utilizar sua marca registrada, e que apenas a expressão ‘iphone’ foi vetada pelo STJ.

Gradiente vai ao STF tentar reverter a situação

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A Gradiente tenta reverter a situação na última instância da Justiça nacional. Princípios expressamente previstos na Constituição Brasileira estariam em jogo, segundo Igor Mauler Santiago, o advogado que defende a Gradiente no caso e que entrou com o pedido no STF.

“Permitir que uma empresa reivindique uma marca registrada em boa-fé por outra pune a criatividade, distorce a livre competição e vai contra princípios da propriedade intelectual brasileira”, declarou Santiago.

Bom lembrar que a história começou em 2012, quando a Gradiente lançou um celular Android com o nome iphone Neo One. Em fevereiro de 2013, o Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) concedeu à companhia brasileira o direito de uso da marca, pedido em 2000 e aceito apenas oito anos depois.

A Apple alega que, no momento em que o INPI concedeu o registro à Gradiente, seu iPhone já era vastamente popular, por isso o instituto não poderia ter realizado tal concessão, mesmo que ele tenha sido feito oito anos antes.

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No processo a defesa da IGB alega que “afirmar que as circunstâncias de concessão da marca devem prevalecer sobre as de quando foi apresentada exige que o remetente seja nada menos que profético e subverte completamente o sistema de propriedade intelectual brasileiro”.

O caso ainda não está na pauta do STF, mas será julgado em algum momento no futuro. Até lá, prevalece a decisão da mais alta instância sobre o assunto até o momento, ou seja, a vitória da Apple no STJ.