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Mundo Mistério | Episódio 3 levanta possibilidades sobre viagem no tempo

Por| 06 de Setembro de 2020 às 12h00

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Reprodução/Netflix, Edição/Canaltech
Reprodução/Netflix, Edição/Canaltech
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Não precisa disfarçar: sabemos que pelo menos uma vez, você já pensou nas possibilidades de voltar para o passado e consertar um erro, ou de ir para o futuro e ver como está a sua vida. O conceito de viagem no tempo é muito explorado nos filmes, nas séries e até nos games, e não passou despercebido na série Mundo Mistério, da Netflix, protagonizada por Felipe Castanhari, do Canal Nostalgia. O terceiro episódio da atração visa levantar uma pontinha de esperança acerca dessa possibilidade.

Em entrevista ao Canaltech, Castanhari confessa que o episódio mais desafiador da série foi justamente o terceiro. "Para mim, o episódio mais difícil foi o episódio três, da Viagem no Tempo. Coincidentemente é um dos episódios que eu estou recebendo mais feedback positivo, e aparentemente o que está com melhor nota no IMDb", conta.

"Foi o mais difícil de fazer por causa do tema em si. Explicar a viagem no tempo de forma científica não é nada fácil, principalmente porque a gente precisa passar ali por termos científicos que não são de fácil digestão, como a teoria da relatividade e como ela se aplica à viagem no tempo. Mas ainda bem que a gente teve ajuda dos especialistas", o youtuber ainda acrescenta.

No episódio, Castanhari faz uma visita à USP - Universidade de São Paulo Campus de São Carlos, onde há relógios atômicos, e cita um experimento realizado com esses relógios que acaba sendo um dos responsáveis por essa questão da possibilidade da viagem no tempo ser real. Para entender isso melhor, conversamos com o professor Daniel Varela Magalhães, da Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo.

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Relógios Atômicos

Daniel explica que um relógio atômico é qualquer sistema que seja capaz de se referenciar a uma transição para atômica para gerar um marcador de tempo, e a diferença de energia entre níveis atômicos é discretizada, por isso falamos de saltos entre níveis atômicos. "A energia que um átomo precisa absorver para subir de nível, ou a que ele libera ao descer em energia, tem frequência característica. Algumas dessas frequências estão até em espectro visível, como algumas de sódio que são amarelas, e podemos checar visualmente", introduz o professor.

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Ele acrescenta que, quando estimulamos uma dessas transições num átomo e vemos que ela realmente acontece, sabemos que estamos na frequência certa e característica daquele átomo. Daí podemos usar essa frequência característica como um tique-taque para um contador e "constituir" o nosso relógio atômico. "Quando temos a parte sem o contador dizemos que temos um Padrão de Frequência Atômico. Como se fosse apenas a parte do pêndulo, sem os ponteiros. As aplicações de frequência e tempo tem sido cada vez maiores, porque vão abrindo novas possibilidades". Como exemplos, Daniel cita a navegação por satélite, redes de comunicação e autenticação de transações financeiras.

O episódio cita um experimento em que os relógios atômicos foram iniciados ao mesmo tempo e levados a diferentes altitudes. Quando foram colocados lado a lado de novo, estavam diferentes. "Com a alta resolução possibilitada pelos relógios atômicos, experimentos como o citado no episódio do Netflix ficam mais acessíveis. A medida de uma diferença temporal entre os dois relógios em altitudes diferentes na terra só pode ser feita com alta resolução. Os relógios atômicos são instrumentos que permitem ver melhor essas variações sem a necessidade de esperar muito tempo", diz o professor.

Ele acrescenta que, devido à alta resolução temporal dos Relógios Atômicos é que conseguimos fazer medidas de grande sensibilidade temporal mais rapidamente. "Costuma-se muito falar que um relógio atômico atrasaria 1 s em cerca de 300 milhões de anos, por exemplo, mas sua real utilidade para nós, nesse caso, é ser capaz de medir o tempo em segundos com 16 casas decimais. Daí uma diferença temporal dessa ordem seria perceptível rapidamente. Pode-se fazer a medida em 1 segundo, ao invés de esperar 300 milhões de anos para verificar a diferença temporal".

Na USP tem relógios chamados de comerciais, que são usados como ponto de partida, e relógios construídos por eles mesmos. Em vários casos, Daniel conta que em alguns casos é preciso desenvolver algum subsistema por não encontrar algo comercial com o desempenho necessário. Daniel ainda conta que no Brasil há o Serviço da Hora, no Observatório Nacional do Rio de Janeiro, que é o responsável pela Hora Legal Brasileira e o Laboratório de Tempo e Frequência, no Campus de Xerém do Inmetro, que está desenvolvendo formas de fornecer base de tempo para diferentes laboratórios. "Apesar de serem instituições diferentes, mantemos uma colaboração com complementaridade, para fortalecer essa área tão importante para o país", conclui.

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Acelerador de partículas

O episódio de Mundo Mistério também conta com a visita de Castanhari ao Sirius, o maior acelerador de partículas da América Latina, localizado em Campinas. O Sirius é uma estrutura de pesquisa administrada pela equipe do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), que por sua vez se encontra dentro do campus do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM).

Para entender melhor os conceitos trazidos no episódio, conversamos com Harry Westfahl, o diretor do LNLS. Antes de tudo, é necessário compreender que os aceleradores de partículas são instrumentos capazes de impulsionar partículas carregadas, como prótons ou elétrons, em altas velocidades, próximas da velocidade da luz. Existem vários tipos de aceleradores para diferentes aplicações, desde terapias para tratar o câncer, nos cíclotrons instalados em hospitais, aceleradores síncrotron usados em experimentos em colisões de partículas de altas energias para revelar a estrutura mais elementar da matéria em escala subatômica, como o Grande Colisor de Hádrons ou Grande Colisor de Hadrões (LHC), da Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear.

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O Sirius se enquadra nos aceleradores síncrotron que produzem radiação eletromagnética para análises da estrutura atômica e molecular de materiais. Basicamente, segundo Harry, o Sirius acelera elétrons a uma velocidade muito próxima à da luz e “guia” esses elétrons com o uso de ímãs, obrigando-os a mudar de direção. "Com isso, esses elétrons geram um tipo especial de luz, a luz síncrotron, que é capaz de revelar a microestrutura de materiais orgânicos e inorgânicos", explica o diretor.

De acordo com o diretor, as análises são realizadas em estações de pesquisa, planejadas para possibilitar experimentos diversos, e que funcionarão de forma independente entre si, permitindo que diversos grupos de pesquisadores trabalhem simultaneamente. "As diferentes técnicas experimentais disponíveis nas linhas de luz do Sirius permitirão investigar aspectos microscópicos dos materiais, como os átomos e moléculas que os constituem, seus estados químicos e sua organização espacial, além de acompanhar a evolução no tempo de processos físicos, químicos e biológicos que ocorrem em frações de segundo", disserta Harry.

Questionado sobre as principais diferenças entre o brasileiro sirius e o LHC, Harry explica que, em ambos os tipos de aceleradores, partículas são conduzidas dentro de câmaras metálicas ao longo de uma trajetória circular, e têm seu percurso guiado por ímãs. No LHC, feixes de prótons são acelerados em direções opostas para que se choquem entre si. Os pesquisadores detectam e analisam essas colisões para estudar a matéria em uma escala subatômica e investigar a estrutura mais fundamental do universo.

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"Já em uma fonte de luz síncrotron, elétrons são acelerados em uma única direção, sem colidir uns com os outros e em energias milhares de vezes menor que no LHC. Os elétrons devem circular de maneira estável por longos períodos. Este feixe de elétrons produz um tipo de luz especial, chamado de luz síncrotron. Essa luz é então usada pelos pesquisadores para estudar diversos materiais, na escala das suas moléculas e átomos", o diretor acrescenta.

E onde isso entra em viagem no tempo? Numa partícula elementar chamada bóson de Higgs, que representa uma “oscilação” no campo de Higgs. "De acordo com as previsões do modelo padrão, este campo permeia todo espaço e é responsável pela massa das partículas elementares (como quarks e elétrons por exemplo). Foram propostos muitos modelos exóticos que se relacionam de alguma forma com a descoberta do bóson de Higgs", conta o diretor.

Ele cita que em 2011, por exemplo, os físicos Chiu Man Ho e Thomas J. Weiler propuseram que se o espaço tempo tivesse uma estrutura diferente do que se acredita (algo não verificado experimentalmente), a criação do bóson de Higgs seria acompanhada de uma partícula, chamada singleto de Higgs, que poderia viajar para o passado, mas a partícula apenas, e não pessoas.

"Até onde se sabe, não existe a possibilidade de viagem no tempo envolvendo partículas. Se o singelo de Higgs fosse observado, em princípio poderia ser possível enviar informação para o passado. Mas a sua existência é apenas uma especulação teórica baseada em hipóteses até agora diferentes da realidade observada por experimentos no LHC ou em outros aceleradores", conclui Harry.

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A ciência pode nos dar uma pequena esperança sobre viagem no tempo, mas é claro que nada foi comprovado, e só nos resta assistir às séries e aos filmes mesmo. E por falar nisso, esse e outros mistérios você acompanha na primeira temporada de Mundo Mistério, que já se encontra no catálogo da plataforma de streaming.