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Crítica Andor | Um começo sem graça em um formato equivocado

Por| Editado por Jones Oliveira | 20 de Setembro de 2022 às 13h36

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Qual é o propósito de um prequel? De forma bem objetiva, essas histórias pregressas servem para expandir uma trama que a gente já conhece, seja ampliando o universo ou aprofundando um personagem ao mostrar como ele se tornou daquele jeito. O problema é que Andor parece não ter certeza daquilo que quer ser e, no fim, se apresenta como algo esquizofrênico que aponta para todos os lados sem ser minimamente interessante — e que, pior, revela o que há de mais problemático na atual gestão do universo de Star Wars.

O mais curioso disso tudo é que, apesar de a série que chega ao Disney+ nesta quarta-feira (21) realmente soar como mais um prequel desnecessário da saga, a grande questão não é o fato de essa ser uma história que não precisava ser contada. O maior incômodo que os quatro primeiros episódios apresentam é na forma com que tudo isso é costurado.

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Além do fato de estarmos falando de um protagonista que nem é tão relevante assim, o seriado se apoia mais uma vez na ideia de fazer um grande filme de dez horas cortado em episódios. Parece um detalhe, mas é o tipo de escolha que afeta demais a narrativa e prejudica imensamente um roteiro que nem é tão bom assim.

Que história contar?

Sejamos francos: embora Rogue One tenha sido um ótimo filme, ninguém saiu do cinema querendo saber mais sobre quem era Cassian Andor (Diego Luna). Até o anúncio do seriado, eu nem sequer lembrava quem era esse personagem, ainda que ele tenha sido um ótimo rebelde ranzinza no longa. Por isso, revisitar o seu passado parecia algo desnecessário.

Ao mesmo tempo, a proposta de mostrar mais sobre a formação da Aliança Rebelde sob o ponto de vista dos anônimos soa muito interessante. Deixar claro que os heróis não eram tão bonzinhos assim e que há muitos tons de cinza nessa briga de bem contra o mal é algo que tinha tudo para enriquecer o universo de Star Wars. O grande problema é que nada disso aparece.

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Os primeiros quatro episódios — ou seja, um terço de uma temporada de 12 capítulos — são inteiramente dedicados a mostrar quem é Andor, sendo que o grande atrativo do personagem é o fato de ele não ser ninguém. Assim, passamos quase duas horas de história acompanhando uma trama irrelevante sobre um Han Solo genérico fazendo trambiques em um planeta aleatório e sendo caçado pela polícia local. Em resumo, é um completo nada que não amplia o universo e acrescenta pouco ao personagem.

Há, é claro, algumas tentativas de dar significado a esse grande marasmo inicial. A série costura passado e presente mostrando as origens de Andor quando ele ainda era uma criança em um planeta qualquer e como ele foi encontrado por sua mãe adotiva, Maarva Andor (Fiona Shaw) — forçando um paralelo com o início de sua relação com Luthen (Stellan Skarsgard), que vai ser a sua figura paterna e mentor na rebelião.

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Só que isso não funciona. O roteiro parece não saber encaixar essas peças e essas idas e vindas de flashbacks ficam jogadas e sem qualquer impacto. Até porque a gente não conhece nenhum desses personagens e o modo como tudo é apresentado é vazio e sem peso. A gente entende o que a trama está tentando contar ao mostrar que, assim como Maarva salvou Andor quando era criança, Luthen fará o mesmo ao dar um propósito a esse ladrãozinho, só que há um abismo entre perceber isso e fazer com que isso importe.

O ponto é que, ao tentar mostrar que Andor era uma pessoa comum antes de entrar para a rebelião, a série se apega a questões banais. Ela perde tempo mostrando os trambiques bobos do protagonista, criando um senso de urgência que você sabe que não vai dar em nada e aprofundando relações vazias com coadjuvantes que não são interessantes. Tudo nesse começo é descartável.

Não por acaso, temos pelo menos três episódios que são insuportáveis em que nada acontece de verdade. É quase como se, para mostrar quem é Luke, tivéssemos duas horas de história mostrando o jovem cuidando da fazenda de umidade e ordenhando baktas com o tio Owen. E a culpa disso é do roteiro, que simplesmente tropeça já na primeira e mais básica etapa da jornada do herói: a de mostrar o mundo comum do personagem.

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O maldito filme de 10 horas

É claro que você pode argumentar que o começo é lento porque isso é o início da história. Só que estamos falando de um terço de uma temporada em que absolutamente nada acontece. É como se, pensando na estrutura clássica de um filme, duas horas fossem dedicadas apenas à apresentação daquele mundo. Quem aguentaria ver isso no cinema?

É aí que Andor escancara o maior problema não só da série, mas de muito do que vem sendo feito com Star Wars nos últimos tempos: a ideia do filme transformado em série.

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A gente já tinha sentido isso em O Livro de Boba Fett e em Obi-Wan Kenobi, mas que fica ainda mais evidente por aqui. Construir a história como se fosse um enorme longa metragem e picotá-lo não é criar uma série. São formatos diferentes com características próprias e com ritmos bem distintos.

Por mais que a gente saiba aonde o roteiro de Andor quer chegar, o modo como isso é construído e contado não funciona porque a trama não foi concebida dessa forma. O resultado é que há episódios que não têm clímax algum, não acontece nada ou que terminam de forma abrupta e sem qualquer tipo de gancho para o próximo. São elementos básicos que dão ritmo à temporada e engajam o público, mas que inexistem por aqui.

Isso é tão verdade que a Disney decidiu lançar três episódios de uma só vez na estreia. E não é porque a série atrasou e ela quer compensar os fãs, mas porque esse começo não sustenta o formato semanal que outras produções tiveram.

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As coisas só começam a engrenar (e de forma ainda bastante tímida) no fim do terceiro episódio, quando Andor e Luthen se conhecem. Até então, a série vai levando o público ao banho-maria em um ritmo lento e quase insuportável.

Se Andor fosse um filme, esses quatro episódios seriam resumidos a 20 minutos de história — e sendo bastante generoso. Assim, chega a ser uma tortura a série estender isso a um terço de sua temporada. É um péssimo cartão de entrada que muda minha percepção inicial do protagonista: se, antes, eu não tinha interesse em saber quem é Cassian Andor, agora eu simplesmente não quero mais.

Vestígios do que há de bom

Mas e essas outras facetas da rebelião que pareciam tão promissoras, cadê? Pois é, estou me perguntando a mesma coisa. Dos episódios liberados antecipadamente pelo Disney+, isso aparece muito pouco no quarto capítulo e muito mais na ideia da instrumentalização dos miseráveis.

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É legal ver como figuras influentes na política, como Luthen e Mon Mothma (Genevieve O’Reilly), atuam por baixo dos panos em prol dessa defesa da liberdade sem nunca se expor, colocando miseráveis e anônimos na linha de frente na luta contra o Império enquanto seguem com seus privilégios e seus status.

Ainda assim, esse é um discurso que é abordado de forma bastante superficial nesse começo de temporada e que esperamos que seja melhor trabalhado nos próximos episódios. Por enquanto, não há nada muito contundente nesta proposta de trabalhar a dubiedade da rebelião, então há apenas fagulhas do que o roteiro pode aproveitar no futuro.

Por outro lado, há um discurso bem interessante presente no papel dos vilões da série: o autoritarismo se espalha. Em um primeiro momento, a “grande” ameaça enfrentada pelo herói não é o Império, mas a força policial local — o equivalente à guarda municipal da sua cidade, para fazer uma comparação mais justa. E, embora eles sejam a parte mais baixa dessa cadeia hierárquica, a virulência do discurso imperial “autoriza” a truculência em suas ações.

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É nesse detalhe que Andor traz um respiro de novidade para o universo de Star Wars. A gente sempre viu a instituição Império como o grande mal a ser combatido nessa galáxia muito distante, mas é muito rico ver o quanto parte da sociedade — sobretudo as forças policiais — incorporando o discurso e as práticas violentas que marcam o Imperador e seu exército.

Jornada inglória

Voltando à pergunta inicial: qual o propósito de um prequel? Ou, melhor dizendo: qual o propósito deste prequel? Bem, levando em consideração os primeiros episódios, Andor parece ainda não ter uma resposta para justificar sua existência.

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É claro que tudo pode mudar e termos uma construção que mostre que, no fim das contas, todo fã de Star Wars precisa conhecer quem é Cassian Andor. Só que, até agora, não há nada que chegue perto disso. Pelo contrário: esse começo sem graça só diminui a minha vontade de saber mais sobre ele.

Só que a culpa disso não está no personagem em si, mas na insistência da Lucasfilm de apostar nessa ideia do grande filme. Na tentativa de criar algo grandioso como o cinema, ela subestima a TV e ignora tudo aquilo que faz uma série ser interessante. O resultado é um roteiro arrastado que não entrega nada além de longas horas de coisas irrelevantes que não agregam nem ao personagem e muito pouco para o universo em si.

E é estranho ver isso vindo de um estúdio que parecia ter entendido a importância dessa narrativa serializada com The Mandalorian, que sabe muito bem aproveitar o formato episódico para apresentar novos heróis, expandir o mundo à sua volta e costurar com a história que a gente já conhece. Só que, mesmo assim, Andor faz o exato oposto em tudo que nem parece que estamos falando da mesma franquia.

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Com um começo sem graça e repleto de decisões equivocadas, a nova série de Star Wars vai ter uma dura tarefa de tentar reverter isso ao longo do restante da temporada. Boa sorte para quem for acompanhar, pois eu já desisti na largada. Prefiro continuar sem saber quem é Cassian Andor.

Andor estreia no catálogo do Disney+ nesta quarta-feira, 21 de setembro.