O que são armas químicas?
Por Augusto Dala Costa | Editado por Luciana Zaramela | 11 de Março de 2022 às 20h25
Uma arma química é, por definição da Convenção sobre as Armas Químicas (CWC, na sigla em inglês), um produto químico utilizado para causar morte, incapacitação temporária ou danos permanentes a humanos ou animais através de suas propriedades tóxicas. Quaisquer equipamentos projetados especificamente para utilizar produtos químicos tóxicos como armas, como munições, por exemplo, também entram nessa definição.
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É importante notar que precursores também são considerados armas químicas — são eles quaisquer reagentes químicos que façam parte da produção de algum agente químico tóxico, independente do método ou estágio em que é adicionado. Isso inclui componentes de sistemas químicos binários ou multicomponente, ou seja, armas cuja letalidade é ativada apenas mediante a mistura de diferentes produtos.
Como estamos falando de produtos químicos, também temos que falar sobre intencionalidade. A Convenção sobre as Armas Químicas dispõe que agentes químicos tóxicos ou seus precursores podem ser desenvolvidos, produzidos, armazenados ou utilizados para propósitos que não sejam proibidos por ela — como herbicidas, pesticidas e outros produtos de uso civil e comercial pacífico — contanto, é claro, que esteja em quantidades e condições próprias para tal.
Apesar da CWC apresentar uma lista de substâncias proibidas como parte do documentos da convenção, quaisquer compostos usados com o propósito expresso de causar danos fatais ou irreversíveis em uma guerra, mesmo que não estejam na lista, também são considerados armas químicas.
Tipos de armas químicas
Há, basicamente, seis tipos de agentes químicos que podem ser usados como arma. São eles:
Agentes sufocantes
Como o nome já diz, os agentes sufocantes agem no trato respiratório, irritando nariz, garganta e principalmente pulmões. Após a inalação, os alvéolos pulmonares reagem secretando fluidos e, na prática, afogam a vítima em seu próprio líquido. Esse tipo de agente é disperso na forma de gás, e alguns exemplos são:
- Cloro (Cl);
- Difosgênio (DP);
- Fosgênio (CG);
- Cloropicrina (PS).
Agentes vesicantes (blister)
Tipo mais comum de composto químico utilizado como arma, o agente vesicante é uma substância oleosa usada tanto em forma líquida quanto aerosol ou vapor. Ela age mediante inalação e contato com a superfície do corpo, irritando os olhos, o trato respiratório e pele, e então envenenando as células. A exposição a esse tipo de agente causa bolhas grandes, por vezes o suficiente para serem fatais, geralmente causando cegueira e danos irreversíveis ao sistema respiratório. Exemplos:
- Mostarda nitrogenada (HN);
- Lewisite (L);
- Fosgênio de oxima (CX);
- Gás Mostarda (H, HD).
Agentes sanguíneos
Os agentes sanguíneos agem inibindo a habilidade das células de utilizar oxigênio (ou de transferi-lo, em alguns casos), sufocando o corpo. A absorção é feita pelos pulmões e pele, distribuindo o agente pelo sangue. Dispersos via gás, alguns exemplos são:
- Cloreto de cianogênio (CK);
- Cianeto de Hidrogênio (AC);
- Hidreto de Arsênio (SA).
Agentes nervosos
Agentes nervosos atuam atingindo uma enzima do sistema nervoso chamada acetilcolinesterase, que, numa reação em cadeia, acaba hiperestimulando músculos, glândulas e outros nervos do corpo. Isso estimula a salivação e lacrimação, causa dores de cabeça, suor, visão borrada, dificuldade para respirar e vômitos. Doses mais altas causam convulsões, perda do controle corporal, paralisia muscular e desfalecimento. São utilizados em forma líquida, aerossol ou vapor, e agem através da absorção pela pele e pulmões. Exemplos são:
- Tabun (GA);
- Sarin (GB);
- Soman (GD);
- Cyclosarin (GF);
- VX (VX).
Controle de multidões
Por último, podemos citar uma quinta categoria não mortal, que são os agentes utilizados para o controle de multidões. Eles incapacitam temporariamente a vítima irritando os olhos, boca, garganta, pulmões ou pele. Caso sejam utilizados em contextos de guerra, podem ser considerados uma arma química. O gás lacrimogêneo (CS) e o spray de pimenta (OC) são exemplos desse tipo de agente, tanto em forma líquida quanto aerossol.
Toxinas
Há, ainda, as toxinas, compostos químicos tóxicos produzidos por organismos vivos, que se enquadram tanto na categoria de armas químicos quanto na de armas biológicas, e violam a CWC caso sejam usadas em contextos bélicos. É possível produzir toxinas sintéticas em laboratório, ou seja, sem coletá-las dos organismos que as produzem naturalmente — é, no entanto, proibido desenvolver, produzir ou armazenar toxinas para propósitos de guerra.
Uso e proibição
Os primeiros usos registrados de armas químicas datam da antiguidade: o envenenamento de água entra na categoria, e temos registros dos atenienses fazendo isso com seus inimigos desde pelo menos 600 a.C; os espartanos, por sua vez, atiraram breu sulfúrico em chamas sobre as muralhas de Atenas em 423 a.C.; os Bizantinos atearam fogo em compostos químicos inflamáveis na água em batalhas navais (conhecidos como Fogo Grego) na defesa de Constantinopla, em 673 d.C.
Mas foi na Primeira Guerra Mundial (1914-1918) que as armas químicas se tornaram armas de destruição em massa. Tudo começou com um ataque de cloro em Ypres, na Bélgica, em 1915, que evoluiu para uso de gás mostarda e retaliação dos seus inimigos, a Tríplice Entente. Um terço das vítimas da guerra, cerca de 1.300.000, foram mortas ou incapacitadas pelo uso de armas químicas.
O Protocolo de Genebra, em 1925, proibiu o uso de artefatos químicos em guerra, mas não a produção e armazenamento deles, nem o uso contra não-signatários ou em retaliação ao uso de armas da mesma categoria. A Convenção de Armas Químicas só foi adotada em 1992, na Conferência sobre Desarmamento em Genebra, após 12 anos de negociações, e posta em vigor em 1997, proibindo fabricação, armazenamento e uso de compostos químicos em contextos bélicos.
Apesar das proibições, armas químicas continuam entrando em ação em guerras e ataques terroristas. Na Guerra Civil Síria, em 2013, tropas sírias utilizaram compostos químicos em Homs e Aleppo, atingindo centenas de pessoas. O ataque de gás Sarin no metrô de Tóquio, em 1995, por uma seita terrorista, é outro exemplo notável do uso clandestino de tais compostos.
Guerra na Ucrânia
A recente invasão russa na Ucrânia vem causando preocupação quanto ao uso de armas químicas ou biológicas, embora o maior temor seja o do uso de armas nucleares ou de uma catástrofe similar ao acidente de Chernobyl, Pripyat, em 1968. No momento, a maior usina nuclear da Europa, a Usina de Zaporizhzhya, está sob controle russo, bem como as instalações de Chernobyl.
Às autoridades, a maior preocupação é o potencial vazamento de agentes infecciosos de dentro dos laboratórios de biossegurança da Ucrânia, já que, em um contexto de invasão, as instalações podem ser bombardeadas ou abandonadas a qualquer momento.
Diante da ameça, a OMS recomendou, no dia 10 de março, que a Ucrânia destrua qualquer patógeno de alta ameaça alojado em seus laboratórios de saúde pública, segundo a agência de notícias Reuters. Assim, é possível evitar "qualquer possível derramamento" que possa espalhar doenças entre a população e causar ainda mais mortes do conflito armado.
Fonte: OPCW; Enciclopédia Britânica; ONU