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Medicação contra o câncer de mama mais agressivo é desenvolvida no Brasil

Por| Editado por Luciana Zaramela | 15 de Junho de 2021 às 10h10

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Twenty20photos/Envato Elements
Twenty20photos/Envato Elements

Mais de 66 mil novos casos de câncer de mama foram diagnosticados durante o ano passado no Brasil, de acordo com estimativa do Instituto Nacional do Câncer (INCA). Em 2019, mais 18,2 mil pessoas faleceram em decorrência da doença, sendo 18.068 mulheres e 227 homens, segundo o Atlas de Mortalidade por Câncer (SIM). Diante desses números, o tumor já é a primeira causa de morte por câncer na população feminina brasileira, com 14,23 óbitos a cada 100 mil mulheres. Inclusive, já supera o câncer de pulmão.

Nesse cenário, pesquisadores brasileiros trabalham em alternativas e no desenvolvimento de novas terapias para o tratamento de diferentes tipos de câncer de mama. Este é o caso da startup PHP Biotech que, em estudos pré-clínicos, avalia a eficácia de um tratamento nanomolecular contra um tipo específico da doença, o Triplo-Negativo. Atualmente, não há, no mercado, uma alternativa de terapia específica para esse tumor. Nessa empreitada contra o câncer de mama, a healthtech tem como parceiros a Kaivo Biotech e a FCJ Venture Builder.

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Para aperfeiçoar o tratamento deste tipo de câncer, a equipe investigou moléculas da biodiversidade brasileira e construiu uma alternativa sintética, que poderá ser usada em larga escala. Inclusive, o primeiro lote da molécula 3-NAntc já foi produzido nos Estados Unidos e estão sendo usadas nos testes contra o triplo-negativo em laboratório. In vitro,  equipe já observou que, quando aplicada em células tumorais, mais de 30% morreram, com uma única aplicação. 

Para entender como a molécula da biodiversidade brasileira pode contribuir no combate ao câncer de mama Triplo-Negativo, o Canaltech conversou com Patrícia Alves, doutora pela Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto (FFUP) e biotecnóloga responsável pela pesquisa.

Quais são os principais tipos de câncer de mama?

“Hoje, são 4 tipos de câncer de mama principais e são definidos, justamente, pelos receptores [proteínas que podem se conectar a determinados componentes do sangue] que eles apresentam na membrana plasmática", explica Alves, da PHP Biotech. O tipo Luminal "expressa receptores hormonais, tanto de estrogênio quanto de progesterona" e se divide em A e B, através de um fator de proliferação, que é o Ki-67. 

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O terceiro tipo é o Her-2 Enriquecido, reconhecido por apresentar uma grande quantidade do receptor Her-2 de proliferação. Por fim, há o Triplo-Negativo que "não tem receptor de estrogênio, de progesterona e o Her-2", explica a pesquisadora. Para compreender visualmente a diferença entre esses tipos, vale conferir a imagem a seguir:

Segundo o Instituto Oncoguia, o câncer Triplo-Negativo é um subtipo agressivo e que pode levar a óbito entre 30% e 40% das mulheres que o desenvolvem, já que não há um tratamento específico.  “As terapias que existem disponíveis para outros tipos de tumor não ajudam [de forma substancial] o tratamento do Triplo-Negativo, justamente porque não têm algo conhecido [como um receptor]. Como ele não tem um elemento conhecido, se utiliza a terapia citotóxica, uma terapia mais geral", explica Alves.

Em outras palavras, os quimioterápicos que são utilizados para este tipo de câncer são aproveitados de outras terapias contra tumores. Nesses casos, o foco do medicamento está em impedir a proliferação do tumor e, não, em algo específico, que diferencie o tumor da célula benigna. Caso um tratamento afete tanto as células tumorais quanto as benignas, é possível que o paciente não melhore ou ainda apresente uma piora no quadro. 

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“Essa molécula [3-NAntc] funciona [em testes] tanto para o câncer Triplo-Negativo quanto para o Luminal A", comenta Alves. No entanto, foi definido como estratégia para o desenvolvimento do medicamento focar no tipo que não conta com uma terapia específica. Em um segundo momento, a pesquisa também deve se voltar para o segundo tipo. 

Pesquisas com a molécula da biodiversidade brasileira

Um dos pontos interessantes da molécula é que ela foi descoberta a partir da biodiversidade brasileira. Isso significa que ela estava presente em elementos da natureza do país, como extratos da flora, da fauna ou do reino Fungi. No momento, a equipe ainda não pode compartilhar qual é a exata origem dessa molécula por questões estratégicas. Independente dessa origem, o procedimento de desenvolvimento é o mesmo. Primeiro a equipe observa para ver qual é a potencial ação do extrato: por exemplo, antitumoral ou antimicrobiana.

Em segundo lugar, esse extrato é dividido em diferentes porções e esse procedimento é feito por cromatografia Líquida (HPLC), onde se verifica se a parte preserva com a função principal. Essa passo é fundamental porque um extrato pode ter de 1,4 a 1,6 mil moléculas diferentes e nem todas são necessariamente benéficas para aquela finalidade. Em seguida, ocorre um trabalho com espectrometria de massa para detectar cada molécula que está ali dentro daquela seleção.

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"Já sabíamos que existia essa molécula [mãe] na biodiversidade brasileira e que era um antitumoral muito potente, mas, em simultâneo, era muito tóxica para as pessoas", explica a pesquisadora. Por isso, foi tão importante a análise desse extrato em inúmeros pedaços, em um processo de pesquisa que já completa 15 anos. 

"Hoje, temos uma molécula que é sintética, com escalabilidade industrial. Notamos que ela continua — até um pouco mais promissora — com a atividade antitumoral", explica a pesquisadora. Essa melhora na atividade se deu porque na formulação nanomolecular, em laboratório, foi possível "retirar grande parte da citotoxicidade [da molécula] para as células benignas que estavam na molécula mãe", o que foi possível alcançar após vários testes com protótipos da molécula sintética.

O que falta para a aprovação do novo tratamento?

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Atualmente, a equipe de pesquisa sabe que "essa molécula [sintética] afeta seis vezes mais uma célula tumoral do que uma célula benigna. Isso, em comparação com o que já temos no mercado, nos chamou a atenção", explica Alves. Através da quimioterapia para o Triplo-Negativo, o tratamento geralmente adotado foca tanto nas células tumorais quanto nas benignas. "Quando você vê a proporção da quimioterapia disponível no mercado, pelo menos in vitro, é 2 para 1. Você mata 2 células tumorais enquanto mata uma benigna", explica a cientista, detalhando a importância da descoberta.

Agora, a próxima etapa do projeto é a conclusão dos testes pré-clínicos. No processo de desenvolvimento, ainda estão abertas algumas questões como a via de aplicação, o que poderá ser feito através de comprimidos ou de uma injeção intravenosa, e os estudos ainda não foram divulgados em revistas científicas. Em um segundo momento, também deve ser solicitada a autorização dos testes da molécula em humanos através de uma agência regulamentadora, como a Food and Drug Administration (FDA), nos Estados Unidos, ou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). 

Vale lembrar que, mesmo com o desenvolvimento de novas técnicas para o tratamento de pacientes com câncer de mama, a mamografia é o principal exame preventivo para identificação de tumores e o diagnóstico precoce pode salvar vidas, ainda mais em mulheres acima dos 40 anos.