Emulsificantes de alimentos ultraprocessados prejudicam o intestino
Por Fidel Forato • Editado por Luciana Zaramela |
Não é segredo que alimentos ultraprocessados podem fazer mal para a saúde, ainda mais quando são consumidos em excesso. Nessas circunstâncias, aumentam o risco de câncer e até contribuem com o declínio cognitivo. Só que este é um alerta muito abrangente — são milhares de produtos processados e ingredientes no mercado. Aparentemente, um dos ingredientes mais comuns, os emulsificantes, podem ser responsáveis por alterações no microbioma intestinal.
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Mesmo pouco conhecidos, os emulsificantes estão na fórmula da margarina, dos sorvetes, dos bolos industrializados, do chocolate, dos pães de forma — sim, estes também são alimentos ultraprocessados. Em todos esses produtos, a inclusão do composto visa manter a textura macia, a consistência uniforme e estender o prazo de validade.
Por que os emulsificantes são usados nos alimentos?
De forma bem direta, “um emulsificante é usado para combinar água e óleo”, explica Natalie Alibrandi, fundadora e CEO da Nali Consulting, para o jornal The Guardian. O produto químico é estruturado com um lado hidrofóbico (que repele a água) e um hidrofílico (que atrai a água). Dentro de uma receita de pão de forma, é ele que dá liga, unindo o óleo e a gordura com a água, garantindo que o pão seja fofo.
Aqui, é necessário destacar que esse ingrediente não é um produto novo recém-incorporado pela indústria de alimentos. Na verdade, já é usado há mais de 50 anos e segue sendo considerado seguro para o consumo humano. A questão é que o seu impacto no microbiota intestinal — nas bactérias e microorganismos da região — nunca foi devidamente estudado.
Hoje, a suspeita é que o produto químico possa ser um dos responsáveis pelo aumento dos casos de doença inflamatória intestinal em todo o mundo, sugere Megan Rossi, pesquisadora do King's College London e fundadora da The Gut Health Clinic. “Pensamos que [os emulsificantes] podem tornar o revestimento do intestino mais vulnerável à penetração de microrganismos inflamatórios”, explica.
O impacto dos emulsificantes no microbioma intestinal
Entre os estudos que investigam o impacto dos emulsificantes no microbioma intestinal, está uma pesquisa publicada na revista científica Nature, em 2015. Liderado por Benoit Chassaing, da Université Paris Cité, o experimento mediu o impacto do produto químico em roedores. Foram testados dois tipos de emulsificantes: CMC (carboximetilcelulose) e P80 (polissorbato 80).
Segundo os autores, os roedores que tomaram a água contendo emulsificantes, independente do tipo, apresentaram mudanças significativas na diversidade das bactérias presentes no intestino, com alguns tipos sendo reduzidos. Por outro lado, a população das bactérias pró-inflamatórias se tornou maior.
Além do microbioma, os cientistas descobriram que a parede de muco, responsável por proteger o intestino, ficou muito mais fina com a dieta de emulsificantes. A hipótese é de que o produto químico tenha dissolvido o muco. Com isso, a passagem de bactérias e outras moléculas inflamatórias para o intestino aumentou. Nesse caso, distúrbios inflamatórios se tornaram mais comuns, como colite ulcerativa.
Pesquisas iniciais em humanos
Apesar das evidências em animais, as pesquisas em humanos são ainda iniciais para entender o impacto dos emulsificantes. Por exemplo, um pequeno estudo envolvendo 12 pacientes com colite ulcerativa revelou que cortar a ingestão deste produto químico melhora o tratamento e reduz o risco de reincidência da inflamação do cólon. A pesquisa foi publicada no The Journal of Nutrition, Health and Aging.
Agora, pesquisadores precisam compreender melhor os riscos dos emulsificantes para a saúde, desenhando novos estudos científicos. No futuro, é possível que alguns grupos de indivíduos sejam orientados a evitar produtos com esse ingrediente, capaz de aparentemente mudar o microbioma intestinal.
Fonte: The Guardian, Nature e The Journal of Nutrition, Health and Aging