Como o cérebro processa a passagem de tempo
Por Nathan Vieira • Editado por Luciana Zaramela |
Como o cérebro percebe e processa a passagem do tempo? Foi essa questão que moveu um artigo publicado na revista científica Nature Neuroscience neste mês. Em experimentos, os pesquisadores aceleraram e desaceleraram os padrões de atividade neural em ratos, conseguindo distorcer sua percepção do tempo.
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Conforme aponta o estudo, a percepção de tempo do nosso cérebro é descentralizada e flexível — em vez do tique-taque preciso de um relógio — que se supõe ser modificada pela dinâmica das redes neurais. A teoria é que o órgão mantém o tempo dependendo de padrões regulares de atividade que se desenvolvem em grupos neurais conforme nos comportamos.
O estudo se desdobrou da seguinte maneira: os pesquisadores treinaram ratos para reconhecer vários intervalos de tempo, e se concentraram na atividade no estriado, uma região profunda do cérebro. Os pesquisadores perceberam que quando um intervalo de tempo é considerado mais curto, a atividade evolui mais lentamente.
Temperatura ajuda a entender como o cérebro processa o tempo
Os cientistas também usaram temperatura para manipular a dinâmica temporal de comportamentos, ao criar um dispositivo termoelétrico especial para aquecer ou resfriar focalmente o estriado enquanto registrava a atividade cerebral.
“A temperatura então nos deu um botão para esticar ou contrair a atividade neural no tempo, então aplicamos essa manipulação no contexto do comportamento. Treinamos animais para relatar se um intervalo era menor ou maior que 1,5 segundo”, afirmam os pesquisadores. O frio se mostrou relacionado com uma percepção mais curta, enquanto o calor foi associado a um intervalo mais longo.
As descobertas da equipe mostram que o estriado é essencial para decidir “o que” fazer e “quando”. Em contraste, outras áreas do cérebro lidam com a segunda questão, controlando o movimento contínuo. Atualmente, a equipe ainda investiga o cerebelo, que contém mais da metade dos neurônios do cérebro e está conectado à execução contínua, momento a momento, das atividades humanas.
Alterações na percepção de tempo
Outra região do cérebro que processa alguns aspectos do tempo é o hipocampo, que ajuda a lembrar quando devemos fazer algo e quanto tempo leva. Assim, os neurônios dessa área contribuem para nossa percepção e memória de eventos.
Especialistas acreditam que fazemos estimativas com base em quanto tempo achamos que levou para concluir aquela mesma tarefa no passado, mas nossas memórias e percepções nem sempre são precisas, e estudos chegaram a afirmar que as pessoas constantemente atrasadas têm uma percepção diferente do tempo.
Além disso, fatores pontuais podem causar essas diferenças. Por exemplo, um estudo de 2022 da revista Science Advances sugeriu que a pandemia de covid-19 alterou nossa percepção sobre a passagem do tempo. Conforme comentaram os pesquisadores, a sensação diz respeito a um fenômeno chamado “expansão temporal”, associado à solidão e à falta de experiências positivas durante o início da pandemia. Mas a sensação de expansão temporal foi diminuindo com o passar das semanas.
Fonte: Nature Neuroscience, Memory & Cognition, Journal of Experimental Psychology: General, Science Advances