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Com covid há 120 dias e doença rara, paciente é curada com leite materno

Por| Editado por Luciana Zaramela | 08 de Junho de 2022 às 10h36

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SergioPhotone/Envato Elements
SergioPhotone/Envato Elements

Para tratar uma paciente imunossuprimida de 28 anos, que estava infectada pelo vírus da covid-19, uma equipe de cientistas brasileiros testou uma nova estratégia: o consumo de leite materno, originário de uma mulher doadora que foi vacinada contra o coronavírus SARS-CoV-2. A estratégia conseguiu curar a paciente, que convivia há pelo menos 124 dias com o agente infeccioso.

Publicado na revista científica Viruses, o estudo sobre o uso materno no controle de casos prolongados da covid-19 foi desenvolvido por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A paciente beneficiada pelo experimento convive com uma doença genética rara, a síndrome de imunodesregulação, que torna seu sistema imune incapaz de combater vírus e outros patógenos.

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“Tenho acompanhado essa paciente desde criança e, quando ela me contou que estava com covid-19, fiquei muito apreensiva. O erro inato da imunidade que ela apresenta deixa seu sistema de defesa todo desregulado", explica a pediatra Maria Marluce dos Santos Vilela, professora da Faculdade de Ciências Médicas (FCM-Unicamp) e autora principal do artigo, para a Agência Fapesp.

Caso a estratégia do leite materno não fosse adotada, a pesquisadora Vilela aponta que a covid-19 poderia evoluir para dois desfechos: infecção crônica ou morte. Isso porque o próprio sistema imune da paciente não seria capaz de combater o vírus.

Entenda o quadro da paciente imunossuprimida

De forma geral, mamíferos — incluindo os humanos — produzem cinco grandes tipos de anticorpos: as imunoglobulinas IgM, IgG, IgA, IgE e IgD. No entanto, a paciente do experimento apresenta deficiências significativas na produção desses agentes de defesa. Por exemplo, costuma ter níveis mais baixos de IgE, IgA e IgG.

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Alguns pacientes com o mesmo tipo de síndrome, sofrem com a ausência completa de IgA. Este é o principal anticorpo neutralizante contra agentes infecciosos e tende a ser altamente concentrado no leite materno. Além disso, há uma produção muito baixa de IgG, ou seja, do anticorpo mais abundante no sangue e usado para eliminar vírus com os quais o organismo já teve contato prévio.

Anticorpos preciosos do leite materno

Com mais de 120 dias de covid-19, a pediatra explica que “ficamos receosos de que a infecção se prolongasse por muito tempo, o que a debilitaria ainda mais e aumentaria o risco de contaminar outras pessoas". Nessa mesma época, a pesquisadora comenta sobre a publicação de estudos demonstrando que o leite materno poderia conter anticorpos (IgA e IgG), caso a mãe estivesse imunizada. A partir daí, o estudo começou a ser desenvolvido.

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“Recomendamos a ela o consumo do leite por via oral, pois o IgA funciona como uma ‘vassoura’, ou seja, vai grudando nos patógenos ao longo de todo o trato gastrointestinal e tudo que é impróprio é eliminado nas fezes. O intervalo de três horas entre as doses — exceto no período noturno — foi pensado para não dar chance de o vírus continuar se replicando”, detalha a pediatra.

Após uma semana do tratamento, a paciente negativou para a infecção do coronavírus. Atualmente, já passou por outros testes da covid-19 e segue sem o vírus. Apesar da descoberta, a equipe de pesquisadores não deve transformar o caso em um tratamento padrão.

Vale destacar que este estudo recebeu apoio da Fapesp e também contou com a participação de pesquisadores de outras instituições, como da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e da Universidade de Oxford, no Reino Unido.

Fonte: Viruses e Agência Fapesp