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Uso de palavras-chave pela concorrência de buscas na web leva empresas à Justiça

Por| Editado por Claudio Yuge | 02 de Fevereiro de 2022 às 19h20

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Firmbee.com/Unsplash
Firmbee.com/Unsplash

Ao realizar uma busca pelo nome de uma empresa ou serviço em ferramentas como o Google, você já deve ter se deparado com o nome de rivais, muitas vezes, aparecendo até mesmo antes dos links que buscava. Entre golpes que operam com o envenenamento de resultados de pesquisa ou termos semelhantes, esse tipo de prática também vem sendo mais e mais adotada por grandes negócios online; e, como tal, está se tornando caso de justiça.

Lá fora, a prática é conhecida como brand bidding e acontece nos bastidores dos sistemas de busca. Ao adquirirem uma propaganda para ser exibida online, os responsáveis podem aproveitar diferentes configurações que vão desde região, idade média dos usuários e aparelho usado até o posicionamento dos anúncios junto a elementos específicos. É aqui que entram as palavras-chave, que não ficam necessariamente expostas, mas estão ligadas de forma intrínseca ao próprio ato de pesquisar por um termo.

Na teoria, parece uma ideia interessante, afinal, quem não gostaria de posicionar a própria marca ao lado de uma concorrente com muito mais destaque no mercado? Na prática, começam a se acumular os casos desse tipo no judiciário brasileiro, com o uso de palavras-chave de empresas rivais sendo enquadrado como crime na Lei de Propriedade Industrial (n° 9.279/96), como o uso de “meio fraudulento para desviar clientela de outrem”.

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Em um dos maiores casos desse tipo registrados no Brasil, o Tribunal de Justiça de São Paulo determinou que a plataforma de comercialização de passagens aéreas 123 Milhas não poderia usar a palavra “Decolar”, marca de uma das rivais do setor de turismo, em anúncios do Google. De acordo com a decisão da 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, emitida em julho do ano passado, a prática permitiu que uma companhia “pegasse carona” no sucesso da outra, gerando confusão para os clientes.

Não foi, entretanto, um processo direto, com juizados de 1º grau chegando a indeferir o pedido da Decolar, devido ao fato de a marca, também, ser uma palavra comum do vocabulário e do setor de aviação. O fato de a 123 Milhas aparecer antes da própria empresa nos resultados das buscas, entretanto, levou à emissão do parecer favorável, com a empresa sendo obrigada a pagar indenizações por danos morais e materiais, além de desvincular seus anúncios da marca da concorrente.

Ainda cabe recurso e o caso continua tramitando no TJ/SP, enquanto outros processos semelhantes encontraram direcionamento judicial semelhante. Enquanto isso, a estimativa é que as empresas afetadas por brand bidding tenham um prejuízo de 30% em seus investimentos no marketing digital por conta da prática.

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“Cabe às empresas se protegerem, [já que] seu maior bem é a marca registrada. Monitorar o uso em todos os territórios de atuação é fundamental”, explica Daniel Filla, diretor-geral da AdPolice no Brasil. Para ele, o uso de serviços de monitoramento contra o mau uso de palavras-chave é essencial, tanto para detectar possíveis utilizações fraudulentas quanto para levar casos desse tipo ao judiciário.

Identificação e registro de palavras-chave

Filla cita uma tarefa hercúlea envolvida nesse tipo de controle, auxiliado por ferramentas de tecnologia. Afinal de contas, quando falamos em anúncios, o que é exibido para você sempre diferente daquilo que estará na minha tela, mesmo que a gente esteja em um mesmo local. Critérios de personalização tornam os resultados de busca e também os anúncios altamente capilarizados, com mudanças até mesmo no horário em que a busca é realizada.

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Quando um caso de brand bidding é efetivamente detectado, a AdPolice passa a registrar as ocorrências, tanto para alertar os detentores das marcas quanto informar às ferramentas de busca. “Tanto Google quanto Bing, assim como algumas plataformas menores, abrem diálogo com os anunciantes que sofrem com tais atos desleais. Conversar é uma alternativa inicial interessante”, explica Filla.

Seja como for, manter registros é essencial nesse tipo de iniciativa, focada no controle de marca. Capturas de tela, datas, horários e buscas realizadas ajudam a identificar o problema e, também, com quem se deve falar, além de auxiliar na identificação de possíveis anúncios fraudulentos de acordo com as políticas de cada ferramenta de pesquisa. “[As plataformas] também não têm como, sozinhas, identificarem atos desleais de concorrentes em diferentes mercados”, explica, afirmando que muitas delas também dependem do contato dos próprios prejudicados para tomar atitudes.

Em caso de continuidade na prática, o diretor indica escalar a situação, primeiro com o envio de uma notificação de cessar dos atos ao rival e, por fim, uma ação judicial. Isso, também, ajuda a desmistificar a questão já que, segundo Filla, muitas das empresas praticantes do brand bidding não sabem que estão cometendo um crime. “Existem agências de publicidade envolvidas [em muitos destes casos], que na busca por resultados, acabam colocando seus próprios contratantes em maus lençóis”, completa.

Concorrência direta sobre as palavras-chave

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O Google é a principal ferramenta de buscas da atualidade e, claro, se encontra no centro de questões relacionadas ao brand bidding. Enquanto observa o andamento de decisões judiciais como a emitida em favor da Decolar, a empresa mantém políticas que diferenciam o uso de marcas no texto de anúncios, uma prática proibida, e nas palavras-chave, uma modalidade aceita pela companhia.

“Consideramos o uso de marcas em termos de busca como legítimo e não fazemos nenhum tipo de investigação. Aqui, entendemos que essa utilização fomenta a livre concorrência e a disponibilização de informações para o consumidor”, explica Camila Rosa, advogada do Google. Ela compara o uso dos espaços de anúncios à gôndola de um supermercado, no qual produtos da mesma categoria, mas de marcas diferentes, aparecem lado a lado.

Na visão da especialista, esta é uma discussão com diferentes nuances, envolvendo não apenas a proteção de marca, mas também direito empresarial e do consumidor. “É muito ruim imaginar que apenas uma empresa poderia utilizar um determinado termo, ainda que seja sua marca. O assunto traz diversas frentes de diálogo, principalmente quando falamos de termos genéricos e comuns e o que [uma exclusividade] poderia representar para o restante do mercado”, explica.

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Rosa enxerga, também, uma mudança de entendimento por parte dos juristas, citando o próprio caso da Decolar como exemplo — após um indeferimento em primeira instância, houve parecer favorável e, com os recursos, a situação pode mudar novamente. “Temos dedicado esforços para fomentar a discussão, trazendo informações tanto para os detentores de marca quanto para o judiciário brasileiro”, explica.

Enquanto o Google considera a possibilidade de alterar suas políticas em caso de mudança no entendimento por instâncias maiores, como o Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou o Supremo Tribunal Federal (STF), por enquanto, o trabalho acontece com informação. A empresa está aberta a receber denúncias e indicações das empresas que se considerarem lesadas pelo uso de suas marcas, orientando e analisando cada caso de acordo com os próprios termos do segmento de anúncios. “Estamos em um momento de discussão e esses casos são muito importantes para a companhia”, completa.

Às empresas que se sentirem lesadas, a recomendação é entrar em contato com a empresa para receber esclarecimentos sobre as normas relacionadas aos anúncios e os diferentes usos de palavras-chave e marcas relacionadas. O Google possui uma central telefônica gratuita para suporte desse tipo e, também, uma central de ajuda com todos os detalhes sobre políticas e demais questões ligadas às propagandas.

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Melhores práticas de uso de palavras-chave

Para a advogada e gestora de tráfego Darel Lampert, otimizar o trabalho com anúncios e ferramentas de buscas é o melhor caminho para melhorar a eficácia das propagandas. Na visão dela, utilizar palavras-chave da concorrência pode gerar confusão entre os consumidores e, em vez disso, o ideal é investir em termos que levem a audiência ao próprio negócio.

“Sincronizar as palavras-chave para que elas reflitam o conteúdo de seus anúncios, colocando a marca em evidência, e construir novas sempre que colocar mais produtos no mercado são estratégias primordiais”, explica ela. Com isso, também, as companhias podem evitar que o clique em tags genéricas acabe transportando um cliente em potencial para os materiais de um concorrente.

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Lampert sugere o uso de ferramentas de curadoria de palavras, que mostram o volume de buscas de cada um dos termos e também variações, além de parâmetros que ajudam a otimizar as pesquisas. Acima de tudo, a especialista recomenda que as propagandas não utilizem as marcas registradas de terceiros, e sim, que trabalhem para um melhor posicionamento do próprio nome.

A especialista cita o trabalho de gerenciamento de ranqueamento e audiência como intenso, exigindo investimento em conhecimento, ações operacionais, análises e gestão de comunicação, além das correções necessárias. São diferentes profissionais trabalhando juntos por um tempo considerável, que não pode ser desprezado já que a alternativa é o insucesso.

As estratégias, inclusive, vão além apenas da utilização de palavras-chave e termos de busca. “O Google e o YouTube são ferramentas de intenção e o Facebook e Instagram, de interesse. Use o motor de buscas para levar a sua marca para quem não te conhece e as redes sociais para aqueles que já acompanham e conhecem seu trabalho. Para cada uma delas, há estratégias e materiais diferenciados que devem observar as características de cada uma”, completa Lampert.