Estudo da OAB SP reflete alta exposição de mulheres a violência de gênero online
Por Vitória Zabelê | •

Uma pesquisa do Projeto Valquírias Digitais, da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo, identificou que a violência de gênero que acontece em ambientes digitais, mediada pela tecnologia, segue invisibilizada e ainda é pouco notificada no Brasil. A razão para tal são desafios que vão desde a identificação e tipificação do crime, passando pelos canais de denúncia, até a punição de infratores e educação da sociedade civil sobre o tema.
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O levantamento, conduzido pela Comissão de Privacidade, Proteção de Dados e Inteligência Artificial da OAB-SP, contou com a participação de mais de 7,4 mil profissionais de Direito de diferentes estados do país ao longo do ano de 2024.
Entre cliques e ameaças
O estudo revelou que grande parte das respondentes já presenciou ou conheceu situações de violência digital em que testemunharam agressão online orientada ao público feminino.
- 73,2% testemunharam comunicação agressiva online;
- 60,8% relataram casos de exposição de dados pessoais (doxing);
- 52,1% registraram assédio em redes profissionais.
Os dados refletem a realidade cruel enfrentada por mulheres e foram divulgados na cartilha educativa sobre violência digital contra mulheres, lançada nesta quarta-feira (1º) durante o 1º Fórum Valquírias Digitais: justiça para as mulheres no ambiente digital.
O projeto que traz à luz a questão reúne advogadas, especialistas em proteção de dados, pesquisadoras e representantes da sociedade civil em busca de soluções e prevenção.
Entre as ações previstas e sugeridas para diminuir os impactos causados às vítimas estão a produção de materiais técnicos e educativos, o fortalecimento da atuação legislativa, a expansão da rede de parceiras e apoiadoras e a consolidação de uma cultura de denúncia, acolhimento e também de responsabilização, de forma que as várias frentes se apoiem.
Solano de Camargo, presidente da Comissão de Privacidade, Proteção de Dados e Inteligência Artificial da OAB-SP vê no projeto uma forma de mudar o cenário atual.
“O Projeto Valquírias Digitais representa uma virada de chave ao propor uma atuação concreta e interdisciplinar”, acredita.
Como denunciar
A cartilha destaca os principais dispositivos legais que protegem vítimas e responsabilizam agressores, como a Lei Maria da Penha (nº 11.340/2006); o Marco Civil da Internet (nº 12.965/2014); a Lei Rose Leonel (nº 13.772/2018); e Lei Mariana Ferrer (nº 14.245/2021).
O material também indica canais de denúncia, como os telefones 180, 100 e 197, além de sites e aplicativos de acolhimento. No âmbito da advocacia, a OAB-SP mantém mecanismos de defesa das prerrogativas profissionais, na garantia do exercício da função.
Desafios da violência digital de gênero
O levantamento identificou ainda quais são os principais obstáculos e desafios recorrentes que dificultam a proteção de vítimas de violência online ou mesmo impedem as denúncias.
- Doxing: exposição de dados pessoais, facilitada por falhas de segurança digital e respostas lentas das plataformas;
- Deepfakes e inteligência artificial: conteúdos falsificados de cunho sexual que exigem novas interpretações jurídicas e dificultam a coleta de provas;
- Prevenção tecnológica: necessidade de detecção automática de conteúdos abusivos, canais de denúncia acessíveis e filtros configuráveis pelos usuários;
- Jurisdição internacional: aplicação da legislação brasileira quando agressores ou plataformas estão fora do país;
- Preservação de provas digitais: registro imediato de prints, mensagens e vídeos, uso de certificação digital e manutenção de arquivos originais para garantir autenticidade.
Educação e mobilização
O projeto reforça que os três pilares educação digital, advocacy (ações estratégicas) e mobilização social são fundamentais para enfrentar a violência de gênero na internet.
O objetivo é consolidar uma cultura de proteção, acolhimento e responsabilização no ambiente digital brasileiro para que, no futuro, seja possível frear essa crescente de casos.
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