O som distorcido do Universo primordial sugere que vivemos em um ‘grande vazio’
Por João Melo • Editado por Melissa Cruz Cossetti |

Observações feitas por diversos telescópios, tanto na Terra quanto em órbita, indicam que estamos cercados por incontáveis corpos celestes. No entanto, estudos mais recentes revelam que vivemos em uma região do universo com muito menos galáxias do que o esperado — o que sugere que estamos em um grande “vazio cósmico”.
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De acordo com essas pesquisas, a densidade de matéria ao nosso redor é cerca de 20% menor que a média do universo.
A cosmologia indica que a região do universo onde está a Via Láctea — chamada de universo local — está se expandindo aproximadamente 10% mais rápido do que o previsto. Essa comparação é feita com base em um parâmetro conhecido como constante de Hubble, que mede a taxa de expansão do cosmos desde seus primeiros momentos até hoje.
Os cientistas utilizam como referência o modelo cosmológico padrão, chamado ΛCDM (Lambda Cold Dark Matter), que leva em consideração a existência da matéria escura fria e da constante cosmológica.
O “som” do universo primordial
Para entender a origem dessa expansão acelerada, os pesquisadores analisam a radiação cósmica de fundo em micro-ondas (CMB, na sigla em inglês), um tipo de “eco” deixado pelo Big Bang.
Essa radiação surgiu quando o universo era cerca de 1.100 vezes menor do que é hoje e carrega marcas de flutuações de temperatura — que, na verdade, refletem variações na densidade da matéria naquele período.
“Estudando essas flutuações em diferentes escalas, podemos basicamente ‘ouvir’ o som do universo primordial, que é mais ‘barulhento’ em certas frequências”, explica Indranil Banik, pesquisador de pós-doutorado em astrofísica na Universidade de Portsmouth.
Essas flutuações geraram padrões conhecidos como oscilações acústicas de bárions (BAO), que deixaram marcas observáveis na distribuição das galáxias e podem ser medidas em diferentes distâncias (redshifts).
Medindo a história da expansão do universo
As oscilações acústicas funcionam como uma “régua padrão” no céu, visto que elas têm um tamanho conhecido e permitem que os cientistas calculem distâncias no universo com base em seu tamanho aparente.
Com isso, é possível determinar a taxa de expansão do cosmos em diferentes épocas, comparando a distância das galáxias com o redshift — ou seja, o desvio para o vermelho na luz que elas emitem, causado pela própria expansão do espaço.
“Se a escala das BAOs parecer maior em um determinado redshift, isso indica que o universo está se expandindo mais rapidamente naquele ponto”, explica Banik.
Essa técnica tem sido usada para reconstruir a história da expansão cósmica ao longo dos últimos bilhões de anos.
Universo com ou sem vazio?
Um estudo recente liderado por Banik analisou medições de BAOs feitas ao longo de duas décadas para testar a hipótese de que vivemos em um grande vazio cósmico. Os dados foram comparados a modelos com e sem esse vazio, mantendo a mesma história de expansão.
Segundo o pesquisador, os resultados mostraram que a probabilidade de vivermos em um universo com um vazio local é cem milhões de vezes maior do que a de estarmos em um universo completamente homogêneo, assumindo que o modelo padrão de cosmologia esteja correto.
Apesar disso, Banik ressalta que ainda há muito a ser investigado.
“No futuro, será fundamental obter medições ainda mais precisas das oscilações acústicas de bárions em regiões mais próximas. Isso será especialmente importante se estivermos mesmo em uma área ainda mais ‘vazia’ do universo”, afirma o cientista da Universidade de Portsmouth.
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Fonte: The Conversation