Crítica | The One e quando a tecnologia tenta ultrapassar o amor
Por Beatriz Vaccari | Editado por Jones Oliveira | 22 de Março de 2021 às 11h29
Em um mundo em que as decisões que tomam o rumo de nossas vidas estão sendo tomadas numa faixa etária cada vez mais jovem, tudo o que possa facilitar o processo e vir como uma garantia é bem-vindo. Em The One, a nova série da Netflix, a sociedade não precisa perder tempo com uma das principais preocupações dessa geração: a de encontrar um amor.
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Seguindo uma linha similar a da série da AMC, Soulmates, a produção britânica original do streaming viaja para um mundo futurista, em que as pessoas têm a oportunidade de burlar toda a burocracia de conhecer alguém e tentar um relacionamento com um teste científico criado por uma instituição privada, chamada The One. Combinando informações colhidas a partir amostras de DNA, o experimento é capaz de juntar duas pessoas de uma forma que elas deem um match e, consequentemente, fiquem "geneticamente apaixonadas", como diz um personagem da série.
Atenção! Esse texto pode conter spoilers da série. Leia por sua conta e risco.
Levando uma vida próspera guiada por uma carreira bem-sucedida, Rebecca Webb (Hannah Ware) deixa as impressões de ser uma poderosa empresária logo nos minutos iniciais da série, tanto pelo visual quanto pelo jeito de falar e vender seu produto para as multidões que atendem às suas palestras. Numa sociedade que possui medo de não encontrar um romance de contos de fadas, a personagem vende o "felizes para sempre" que pode ser descoberto tão facilmente quanto um jogo da memória.
No entanto, o que a série deixa claro logo em seu primeiro episódio é que todo o sucesso e dinheiro que hoje rodeia Rebecca não veio de maneira fácil — e muito menos limpa. Há mais sangue nas mãos da empresária do que casais formados de fato, e embora possa parecer confuso como The One coloca a ordem dos fatos no primeiro instante, a intenção é justamente criar uma atmosfera misteriosa e intrigante, como todo maratonista de séries gosta.
Não é equivocado dizer que The One vem com uma proposta de atrair os fãs de Black Mirror enquanto a sexta temporada não chega no streaming. Diferente da produção que hoje é um dos carros-chefes da Netflix, a britânica não se trata de uma antologia e muito menos apresenta diferentes tecnologias, já que gira em torno apenas do teste genético. Além disso, todas as histórias apresentadas ao longo dos episódios acabam se entrelaçando em algum momento, e é claro, conectando-se diretamente ao experimento científico.
A série trabalha com diferentes personagens e diferentes linhas do tempo, e vale destacar o cuidado que o figurino e a maquiagem tiveram com essa segunda parte. Remetendo-se diversas vezes a eventos de anos atrás por meio de flashbacks da própria Rebecca, o visual da personagem acaba sendo característico para cada uma das épocas, seja ela ainda uma estudante de doutorado que está descobrindo a fórmula do seu sucesso ou a dona de um império multimilionário.
The One ousa em mexer e explorar várias narrativas diferentes ao mesmo tempo, o que pode soar uma decisão um tanto arriscada se não bem trabalhada. No entanto, ao espectador é quase natural pegar o ritmo da série ao se familiarizar com todos os personagens.
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É difícil afirmar qual das questões levantadas em toda a história é mais interessante: seja o mistério sujo e cheio interrogações por trás do sucesso de Rebecca Webb que é escavado a cada episódio que passa ou todas as situações que podem ser uma consequência do experimento científico da The One.
Além da história de Rebecca com seu próprio experimento, outras duas ocasiões são exploradas na série: em uma delas, Hannah Bailey (Lois Chimimba) possui a mesma insegurança que qualquer outra mulher casada teria num mundo em que um teste científico promete às pessoas o amor verdadeiro (num enredo que se assemelha muito ao primeiro capítulo da já mencionada Soulmates). Casada há anos com Mark Bailey (Eric Kofi-Abrefa), a dúvida um dia protagoniza uma conversa do casal, que leva a esposa a tomar atitudes psicopatas atrás do match do marido, botando toda a história do relacionamento em risco.
Em outra ocasião, a série também se aprofunda na história de Kate Saunders (Zoë Tapper, cuja personagem promete roubar as cenas da própria protagonista), investigadora do mistério que assombra o negócio de Rebecca até hoje, mas também uma "vítima" do experimento The One. Ao ser combinada com uma mulher que ainda não a conhece pessoalmente, a policial se entrega à experiência ao enxergar uma oportunidade de relacionamento sério, mas vê que o buraco é muito mais embaixo quando seu par ideal sofre um misterioso acidente na noite que iria encontrá-la. Como se não bastasse, uma mulher que alega ser a esposa do match de Kate aparece, mesmo a garota nunca tendo a mencionado antes em qualquer uma de suas conversas.
The One pode não se tornar um dos carros-chefes da Netflix em meio a tantas séries de sucesso presentes hoje no catálogo, mas definitivamente merece sua permanência no Top 10 de títulos mais assistidos no streaming brasileiro. Explorando os impactos que a tecnologia tem na vivência humana e nos relacionamentos interpessoais, a série ainda traz uma dose de romance e mistério, em episódios rápidos e fáceis de serem assistidos de uma só vez.
Indispensável para os fãs de um bom suspense e, é claro, para quem gostou de Black Mirror, The One está disponível na Netflix.