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Crítica | Palmer contém um mundo inteiro

Por| Editado por Jones Oliveira | 05 de Março de 2021 às 21h00

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Pode ser difícil permanecer aliado de personagens evasivos, que estão sempre mais dispostos a lidar com as situações sem muito tato. Por mais que o passado pouco explorado de Palmer (Justin Timberlake) esteja carregado de justificativas sobre quem ele é, existe um distanciamento que é alimentado pela direção de Fisher Stevens (de Amigos Inseparáveis — filme de 2012).

Mas essa distância dada pelo olhar de Stevens é analítica: ao não expor Palmer por meio de closes reveladores e ao não explorar momentos íntimos — passando, inclusive, por cenas de sexo de maneira rápida —, o diretor parece indicar que o caminho mais poderoso do seu filme não é o protagonista em si, mas tudo aquilo que conduz as suas atitudes. Seu reingresso à sociedade como ex-detento é, portanto, o que conduz a narrativa.

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Atenção! Esta crítica pode conter spoilers sobre o filme!

Uma metamorfose interna

Acontece que Timberlake é um dos atores mais carismáticos de sua geração. Todo seu carisma consegue fazer o papel contrário da ideia formal da direção e, possivelmente, criar laços entre sua personagem e o espectador. O sujeito durão, saído da prisão após 12 anos, de temperamento agressivo — algo que se sobressai primeiro na relação sexual com Shelly (Juno Temple) —, aos poucos acaba tendo sua hostilidade redirecionada durante o difícil retorno àquilo que se tem como liberdade.

E são vários os elementos que começam a fazer uma metamorfose interna em Palmer. Alguns são mais claros, como a dificuldade dele em conseguir um emprego por ter sido presidiário. Outros são, na prática, closes na alma do personagem. O carinho por Vivian (June Squibb), sua avó, por exemplo, ultrapassa qualquer embate moral: ele consegue entender, mesmo que fique chateado, o alerta de desconfiança dela para com ele e perceber que tem um lar nos braços daquela senhora.

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Sua relação, inclusive, com os mais velhos é de um respeito revelador. Seja com o zelador Sibs (Lance E. Nichols) ou até mesmo com o chefe de polícia Coles (Dane Rhodes), há sempre uma indicação de entendimento por parte de Palmer. Em certo momento, abordado pelo policial, ele diz algo como: "Seria estranho se ele agisse de outra forma." E, nesse sentido, o protagonista não está nada interessado em modificar as mentalidades dos mais experientes.

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As chaves da confiança

Por outro lado, Palmer é, justamente, quem se deixa modificar por alguém mais jovem — muito mais jovem. Sam (Ryder Allen) é uma criança que funciona como um contraponto completo à índole da personagem de Timberlake. Frágil, doce, sensível, carinhosamente expansivo, feminino e com um passado menor do que o tempo de cadeia do seu futuro tutor. Sam é tudo o que Palmer não é ou, em outra perspectiva, tudo o que Palmer perdeu.

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Talvez por isso exista, primeiro, uma ligação de estranhamento do protagonista para com o menino. Ao agir como se não aceitasse a realidade de Sam, Palmer começa a se descontruir e a demonstrar que, na verdade, ele não conhece a si mesmo. A criança, a esse ponto, faz o papel de acolhimento, de reintegração social por meio do afeto. É Sam que consegue construir uma ponte entre ele (Palmer) e o mundo. Com isso, tudo o que, a princípio, parecia ser uma postura homofóbica, transforma-se em preocupação. A agressividade daquele homem passa a agir em defesa de um pequeno que já sente as dores do preconceito.

É finalmente nessa discriminação que Palmer e Sam podem se ver como iguais. O distanciamento idealizado pela direção começa a ser desfeito. Por esse ponto de vista, ao mesmo tempo em que Sam encontra alguém que pode, de fato, ser sua família, ser seu pai, Palmer fundamenta sua relação amorosa com Maggie (Alisha Wainwright) e, por fim, recebe as chaves — que têm a simbologia da confiança — de Sibs.

O mundo inteiro

Durante todo o processo fílmico, a economia dos planos de Stevens dá espaço para as relações enraizadas na história do roteiro de Cheryl Guerriero (de Universidade do Prazer). Mas, de todo modo, é exatamente por meio da contenção, do econômico modo de decupar as cenas, que Palmer consegue atingir o emocional sem maquiagens, sem forçar o que quer que seja. Está tudo ali, do carismático e durão ex-detento ao menino que quer fazer parte do mundo das fadas.

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Eu não me acho melhor do que você. Eu só tive mais sorte talvez.

O mundo inteiro está contido em um filme que, apesar de esteticamente sem muitas pretensões, de repente, pode dizer muito mais a respeito de quem o assiste do que sobre seus personagens. Em outra medida, é a arte que parece gritar sobre o quanto o mundo poderia ser simples, mas encontra as barreiras do egoísmo, do preconceito e do ódio pelo caminho.

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*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Canaltech