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Crítica | Os Pequenos Vestígios é um filme vencido

Por| 22 de Fevereiro de 2021 às 09h55

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Warner Bros.
Warner Bros.

Os Pequenos Vestígios parece beber de fontes dos anos 1990 sem se preocupar em chegar ao público de maneira datada. Naquela década, logo após o sucesso oscarizado de O Silêncio dos Inocentes (de Jonathan Demme, 1991), outros filmes que trazem detetives no encalço de algum serial killer brotaram. Nessa profusão, surgiu Seven: Os Sete Crimes Capitais (de David Fincher, 1994), uma segunda obra-prima em um universo parecido.

Outros filmes foram ficando pelo caminho e, por mais que não chegassem à altura dos filmes de Demme e Fincher, tinham seu valor. Beijos que Matam (de Gary Fleder, 1997), O Colecionador de Ossos (de Phillip Noyce, 1999), Na Teia da Aranha (de Lee Tamahori, 2001)... Do mesmo jeito que esses filmes chegaram, eles foram sumindo e, mais tarde, retornaram como séries festejadas: True Detective e Mindhunter.

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Atenção! Esta crítica pode conter spoilers sobre o filme!

Um hamster conformado

Acontece que a direção de John Lee Hancock (de Estrada Sem Lei — filme de 2019) não parece empolgada com um retorno (ou quase isso) do cinema às investigações. Talvez, por contar com Denzel Washington — que esteve em quase todos quando não era Morgan Freeman —, o filme consiga se manter em uma espécie de piloto automático sem muitos problemas evidentes. A história vai se encadeando com naturalidade e a presença do ator dá postura e moral aos acontecimentos.

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Isso, na verdade, pode ter um lado nada bom, porque O Pequenos Vestígios, mesmo que, aos poucos, ganhe corpo, infle e alimente a curiosidade do espectador, nunca chega a um ápice. Essa relação pode ser sentida no todo do filme, com seu final anticlimático, e em vários momentos internos, como ao iniciar um diálogo entre o policial Deacon (Washington) e o detetive Baxter (Rami Malek) e não o finalizar na esperança de que o espectador complete a lacuna ou, de repente, coloque-se pensativo.

Poderia funcionar, mas não dá certo porque Hancock, na prática, não está disposto como no citado Estrada Sem Lei. Os diálogos funcionam como ilustração do roteiro, em planos e contraplanos que mais parecem ter sidos filmados sem um planejamento de decupagem capaz de evidenciar detalhes e promover uma experiência mais intensa ou imersiva. Nesse sentido, The Little Things (título original) distancia-se das melhores obras dos anos 1990 e surge como um derivado empobrecido e tardio daquela época.

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Sem energia para ter personalidade, sem originalidade textual e dependendo das atuações dos protagonistas — e de Jared Leto como Albert Sparma —, o filme não chega a lugar algum. Talvez seja essa a ideia: rodar, rodar, rodar e permanecer um hamster conformado invés de criar substância e quebrar a própria jaula. Os flashbacks, que, da maneira que são construídos, poderiam indicar um valor substancial nessa transformação, deságuam em surpresa nenhuma, sendo inofensivos dentro do contexto.

Venceu...

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Ainda, por mais que existam boas referências, como a intersecção entre o antigo e o novo de Seven: Os Sete Crimes Capitais (e outros), elas (as referências) agem no sentido de piorar o conjunto para quem sentir a sensação de já ter visto algo semelhante — só que melhor (muito melhor). Ao mesmo tempo, Os Pequenos Vestígios utilizam as vítimas como fantasmas sem valor emocional — com exceção, talvez, daquela que é exposta no último flashback. Aliás, nesse ponto, Deacon quase esboça algo parecido com as situações vividas por Stênio (Daniel de Oliveira) em Morto Não Fala (de Dennison Ramalho, 2018).

No final das contas, Hancock, que começou desanimado e terminou derrotado por si mesmo, entra na roda de Deacon e Baxter e finaliza o filme como se não se importasse em provocar o que quer que seja. Sem forma e sem conteúdo, Os Pequenos Vestígios acaba também sem impacto, como se as duas horas antes das últimas cenas fossem vazias — e estas (as últimas cenas) fossem a cobertura sem gosto do bolo vencido e oco.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Canaltech