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Critica | Fuja é a nova obra-prima do suspense de Aneesh Chaganty

Por| Editado por Jones Oliveira | 08 de Abril de 2021 às 21h00

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Após alguns curtas pouco conhecidos por aqui, o diretor e roteirista Aneesh Chaganty chegou metendo o pé na porta com o suspense Buscando…, no qual provou sua incrível habilidade de criar suspenses que atingem nossos nervos ao nível do terror. Não é diferente em Fuja, também escrito e dirigido por Chaganty. O filme é tão aterrorizante que o suspense parece fazer brotar uma aura sobrenatural completamente sem justificativa: o terror existe, mas é realista. Em algum lugar do mundo, uma história como essa pode acontecer e, se não de forma idêntica, certamente encontra reflexos bastante eufêmicos em muitos espectadores.

Fuja atinge o mesmo nível de terror que grandes títulos como Pânico, Louca Obsessão, O Homem Invisível, Violência Gratuita e Boa Noite, Mamãe!, por exemplo. O que todos esses títulos e Fuja têm em comum é justamente essa capacidade de aumentar nossos níveis de adrenalina sem precisar recorrer a elementos sobrenaturais. O desconhecido, o que é tabu ou o obscuro são ótimos elementos para fazer terror, porque mexem com o desconhecido, ativando muito mais facilmente o nosso medo.

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Quando o terror surge de algo real ou próximo, o terror nos atinge de outra forma. Não é mais o desconhecido, mas sim algo que conhecemos muito bem: amigos, fãs, o ex, supostos frequentadores de uma certa região muito exclusiva, seus filhos ou sua própria mãe, para usar os exemplos citados acima. Acredito que o impacto de morrer pelas mãos de alguém que deveria nos amar e/ou respeitar é bem maior para o nosso cotidiano do que a ideia mais aleatória de que, se um dia eu encontrar um livro de pele humana em um porão, é melhor não ler o que está escrito.

Obra-prima do suspense

Não a toa, a trama de Fuja nos lembra ainda mais o clássico exemplar do suspense/terror, o livro "Misery: Louca Obsessão", de Stephen King. Assim como no livro (que rendeu a citada adaptação com Kathy Bates), Fuja também traz o terror de uma pessoa cuja capacidade de locomoção é deliberadamente afetada por outra a fim de manter aquela pessoa em clausura.

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Há inúmeras outras referências que sutilmente expõem a reverência do cineasta àqueles que lhe ensinaram a técnica ou lhe inspiraram o tema, mas Fuja vai bem além disso. O que Aneesh Chaganty faz é demonstrar sua criatividade ao cultivar um suspense que não é interrompido até o desfecho final, algo dominado somente pelos grandes mestres do gênero. Fuja começa nos apresentando Diane Sherman (Sarah Paulson) pela sua versão da história e não demora muito para que ela se torne a vilã, o que já é incrível.

Dentre as inúmeras opções que o roteiro poderia adotar, a que mais se destaca, por oposição, é a ideia de que o suspense poderia ser criado em cima da descoberta de que a mãe é a vilã, mas isso seria um recurso fácil. Chloe (Kiera Allen) é muito esperta e começa a entender tudo bastante rápido, o que força a mãe a tomar atitudes bastante drásticas. A manipulação exige preparo e, logo, a personagem começa a se tornar muito mais impulsiva.

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A tóxica relação de mãe e filha logo se torna uma complexa luta de duas mulheres muito fortes, capazes e inteligentes. A construção dos clichês existe, mas com o intuito de brincar com nossas expectativas. Quando Chloe recorre ao carteiro, as obviedades vêm à mente o tempo todo e existem nas nossas mentes só o tempo suficiente para que sejam contrariadas pelo filme. Poderiam ter feito de conta que Diane não tinha visto Chloe. Poderiam ter feito o carteiro ceder a todos os impressionantes argumentos de Diane. Ele não sucumbe nem diante de uma ameaça de acusação de assédio. O carteiro treme na base, a gente sente. Mas ele resiste. Com isso, o roteiro força a personagem Diane a revelar seus limites: até onde ele iria para manter Chloe presa?

Além da história

O roteiro, sem dúvida, é impecável e é um parque de diversões para quem quer criar conexões com Buscando… e encontrar referências escondidas. Mas sem as atuações, Fuja não seria o que foi. Kiera Allen, que usa cadeira de rodas na vida real, confere realismo à personagem que espanta noções capacitistas. A atriz é incrível ao visitar os extremos da sua personagem, passando por momentos de intenso choque ou medo capazes de extravasar a tela e atingir o expectador.

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Do outro lado, uma Sarah Paulson que vai de uma mãe terna e compreensiva a uma psicopata disposta a usar todas as suas habilidades para manter Chloe presa e/ou submissa. Mais experiente, Paulson conta com alguns fãs que já a viram em obras como Rached, Vidro e American Horror Story, o que garantiu à atriz uma respeitável experiência em sets com histórias bizarras.

Ao não criar um filme sobre uma cadeirante, rejeitando supostos estereótipos, Fuja permite que Kiera Allen atue de fato, não sendo definida por sua deficiência. Assim, Fuja fornece uma experiência realmente marcante com as atuações: Allen e Paulson provam ser rivais dignas uma da outra, o que acontece no nível da ficção e do trabalho artístico, claro. A nível psicológico, a disputa é muito injusta, o que ajuda a tornar tudo ainda mais tenso.

Fuja está no catálogo da Netflix.

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*Esta crítica não reflete, necessariamente, a opinião do Canaltech.