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Filhos da ciência: como a tecnologia evoluiu a indústria da reprodução humana

Por| Editado por Luciana Zaramela | 04 de Março de 2021 às 18h00

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Jonathan Borba/Unsplash
Jonathan Borba/Unsplash

A tecnologia e a ciência caminham lado a lado, sob a premissa de proporcionar cada vez mais soluções para situações do cotidiano. E um assunto que abraça essas duas áreas é a reprodução humana. São diversos os motivos que levam alguém a recorrer à tecnologia em busca de gerar uma vida, e a equipe do Canaltech conversou com especialistas para entender cada detalhe desse nicho.

Fertilização in Vitro

No que diz respeito a técnicas de reprodução assistida, a fertilização in vitro é uma das mais famosas. De acordo com Dr. Alfonso Massaguer, ginecologista e obstetra, especialista em Reprodução Assistida e diretor da Clínica Mãe e da Clínica Engravida, essa técnica consiste em juntar o óvulo e o espermatozoide e formar o embrião em laboratório. "Podemos analisar ou não esse embrião e colocar dentro do útero. Obter espermatozoides é possível por masturbação, e após, realiza-se a coleta em um potinho. Se o homem não tiver espermatozoide no ejaculado, pode ser coletado por estimulação com hormônio ou por punção do testículo, ou até por cirurgia no testículo diretamente para os casos dos homens que não ejaculam, os azoospérmicos", explica o especialista.

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Segundo o ginecologista, para retirar o óvulo é um pouco mais complicado. Em geral, prescreve-se hormônio para a mulher, estimulando que ela produza mais de um óvulo, estimulando aqueles óvulos que morreriam naquele mês. Os hormônios são dados por dez dias, controlando por ultrassom, e depois com a paciente sedada os ovários são aspirados e retiram-se os óvulos. "É um procedimento simples, que tem segurança alta, mas sempre tem risco. Pode ter complicações como sangramentos, dor abdominal, os ovários podem ficar muito grandes, mas em geral é tranquilo e com risco pequeno", revela.

Na visão de Dr. Geraldo Caldeira, ginecologista e obstetra membro da FEBRASGO (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia) e da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana (SBRH) e médico do Serviço de Reprodução Humana do Hospital e Maternidade Santa Joana, o procedimento é seguro: "Hoje em dia o risco é muito pequeno, mas mesmo assim, às vezes pode ter um sangramento do ovário, um quadro infeccioso. É muito raro, mas pode acontecer. A fertilização in vitro tem 60% de sucesso", observa.

Questionados sobre os cuidados principais quando se faz uma fertilização in vitro, os especialistas apontam: evitar gêmeos. Isso porque, na visão dos profissionais da área, o ideal é que a mulher engravide de um bebê de cada vez, considerando que quando se tem gêmeos, trigêmeos, quadrigêmeos, as complicações são maiores. Outros cuidados envolvem não estimular muito o ovário para que a mulher não fique com a barriga cheia de água ou com muito desconforto abdominal, até evitando um quadro chamado hiperestímulo ovariano, que pode até gerar trombose, ter risco de morte, ainda que seja extremamente raro.

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Inseminação artificial

Enquanto isso, a outra técnica de reprodução assistida mais famosa, a inseminação artificial, consiste em coletar o sêmen e prepará-lo, concentrando e pegando os espermatozoides mais espertos e ágeis, e então colocando o sêmen dentro do útero da mulher no momento da ovulação. Em geral, o procedimento é feito com a estimulação da ovulação, para ter o momento exato e para ter pelo menos um ou dois óvulos a disposição desses espermatozoides, sempre tentando evitar trigêmeos e quadrigêmeos, mas com uma taxa de sucesso maior.

"É bem diferente da fertilização in vitro, pois estamos buscando uma fertilização dentro do corpo, ou seja, um processo quase que natural de fertilização, em que colocamos o espermatozoide preparado no momento da ovulação. E a fertilização in vitro, ocorre em laboratório. Removemos o óvulo e o espermatozoide e fazemos a fertilização em laboratório, formando o embrião. Depois, colocamos o embrião pronto dentro do útero", explica Dr. Massaguer.

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Na inseminação, o sêmen é colocado no útero e precisa passar pelas trompas e encontrar o óvulo, com a fertilização acontecendo dentro do corpo da mulher. Os especialistas alertam sobre o risco de gêmeos, e também tem o risco de uma gravidez fora do útero, ou seja, o risco desse embrião se formar na trompa e ficar se desenvolvendo lá, o que chamam de gravidez ectópica. "Isso é um risco aumentado na inseminação. Os outros riscos são muito pequenos, pois a manipulação é menor. É um procedimento com grau de segurança muito alto", acrescenta.

Dr. Caldeira completa que o comum é colocar a paciente em posição ginecológica, passar uma sonda bem fina dentro do útero e introduzir os espermatozóides no fundo do útero, próximo da trompa. "A inseminação não tem risco nenhum. É tranquila. 30% de sucesso por ciclo, ou seja, por mês", estima.

Outras técnicas de reprodução assistida

No entanto, a reprodução assistida não se resume apenas à inseminação artificial e à fertilização in vitro. Nas palavras de Dr. Massaguer, como a reprodução tem muito laboratório, engloba muito a tecnologia, a exemplo das cirurgias para retirar espermatozoides de homens que não ejaculam e da injeção intracitoplasmática. Segundo o ginecologista, um assunto muito desenvolvido ultimamente tem sido a análise do embrião.

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"Atualmente temos respostas relacionadas aos cromossomos desse embrião, bem como a qualquer gene desse embrião. Antes do embrião ser colocado no útero, você consegue saber se ele não tem alteração cromossômica, pode saber se tem ou não alguma doença. Ainda fazemos a biópsia do embrião, tirando um pedacinho dele, mas com o avanço da tecnologia, cada vez mais conseguimos fazer essa análise por meio de cultura, ou seja, analisando o meio onde ele está, o liquido ao redor do embrião, se tem alguma doença ou alguma alteração cromossômica", aponta o especialista.

Questionado sobre os principais desafios que a tecnologia de reprodução enfrenta, Dr. Massaguer menciona que a tecnologia faz com que esses tratamentos sejam mais caros e excluam pessoas que necessitariam, fora que ainda não é um tratamento 100%. "Muitas vezes não dá certo e ninguém tem muito claro o porquê. Claro que, quase sempre, a resposta está na qualidade e na idade do óvulo e este talvez seja o principal desafio na reprodução humana: melhorar a qualidade do óvulo. Essa qualidade é nossa principal dificuldade e traz quase sempre a resposta nas falhas dos tratamentos. Percebemos isso quando utilizamos óvulos doados em casos que têm histórico de dificuldade de tratamento", conta o ginecologista.

No ponto de vista do Dr. Caldeira, o principal desafio que a reprodução humana enfrenta hoje é a implantação do embrião. "Chamamos de falha de implantação. Às vezes conseguimos embrião de boa qualidade, a cavidade uterina está boa, e a gente transfere o embrião e ele não implanta", declara.  O ginecologista ressalta que as crianças que nascem de qualquer técnica de reprodução assistida não tem diferença nenhuma em comparação com uma criança concebida naturalmente, e que não existe aumento de doenças ou síndromes por ter sido feita a fertilização in vitro.

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O que vem por aí? 

No ponto de vista dos especialistas, essa tecnologia se desenvolveu de maneira relativamente rápida em relação ao primeiro bebê de proveta, que tem 42 anos. O grande salto foi o lançamento da injeção intracitoplasmática, também conhecida como  ICSI, que é quando se injeta um espermatozoide dentro de cada óvulo. Isso revolucionou o tratamento dos homens que possuíam pouco sêmen.

Dr. Caldeira explica que as evoluções proporcionadas pela tecnologia permitiram aumentar a porcentagem de chance de gravidez e evitar riscos de síndromes genéticas. A invenção de uma câmera chamada embryoscope, que fica dentro da incubadora filmando o desenvolvimento do embrião, também foi um acréscimo para esse nicho, considerando que o embrião não precisa mais sair da incubadora para ir ao microscópio para a embriologista avaliar e voltar, o que por sua vez aumentou as chances de gravidez.

As últimas tecnologias dessa área envolvem análise do embrião por meio da cultura, visando o líquido ao redor do embrião sem tirar pedaço. Os especialistas ainda ressaltam evoluções na análise do endométrio, o tecido que reveste o útero.

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A estimativa de Dr. Massaguer para o futuro da reprodução assistida envolve uma evolução do embrião cada vez mais fácil e completa, e análise com cada vez mais dados para saber se o embrião tem ou não alteração, além da posibilidade de tratar esse embrião.

"É mais fácil tratar as células do corpo quando estão em laboratório e são poucas do que quando já estão formadas e são bilhões e bilhões delas. Conseguiremos tratar aquele gene alterado ainda em laboratório para ele não ter câncer, não ter diabetes, não ter uma série de doenças que ele teria no futuro. Atualmente fazemos uma seleção, pegamos os que não têm os genes alterados e utilizamos. Mas no futuro acho que conseguiremos tratar os que possuem gene alterado e não apenas não utilizarmos", estima o profissional.

O ginecologista ainda imagina que a evolução desses procedimentos e tratamentos que são tão custosos psicologica e financeiramente serão mais fáceis, com direito a aplicações em casa, mesmo. "Mais segurança ao ter filho, mais praticidade, melhora de vida das pessoas, diminuição das doenças e minimização das dores de casais com infertilidade", o especialista estima.