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Crítica | Rosa e Momo mostra como somos iguais mesmo que sejamos diferentes

Por| 16 de Novembro de 2020 às 21h00

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Netflix
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Já eram seis anos desde a última atuação de Sophia Loren. Em 2014, havia sido para o média-metragem Voce umana, que é dirigido por Edoardo Ponti e, agora, ela retorna gigante, aos 86 anos de idade, interpretando uma mulher forte e independente. Rosa e Momo, aliás, é mais do que esse retorno de Loren, é um filme que tem muito a dizer nas entrelinhas; é uma história de amor, de resistência e sobretudo, de amizade.

Ponti, que é filho da atriz, demonstra ter sensibilidade suficiente para readaptar o romance de Romain Gary — que já havia recebido uma versão para cinema em 1977 (Madame Rosa — A Vida à Sua Frente, de Moshé Mizrahi). Acontece que Rosa e Momo parece construir uma relação muito mais simbólica do que a história que é vista durante pouco mais de uma hora e meia. Existe uma analogia ininterrupta entre infâncias e é isso que move a estrutura do filme.

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Atenção! Esta crítica contém spoilers sobre o filme!

Na pele e pela pele 

Não há nada de novo — ao menos à primeira vista — na história guiada por Ponti. Amizades entre crianças e idosos já foram trabalhadas e expostas em dezenas de filmes. Cinema Paradiso (de Giuseppe Tornatore, 1988) e o brasileiro Central do Brasil (de Walter Salles, 1998) são exemplos, talvez, bem conhecidos nesse sentido. Por outro lado, Rosa e Momo não trata exatamente de uma amizade entre idades diferentes, entre pessoas diferentes e nem mesmo sobre mundos diferentes.

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Momo (Ibrahima Gueye) e Madame Rosa (Loren) são quase que a mesma pessoa em corpos completamente distintos. Por essa perspectiva, pode ficar claro perceber como, a todo momento, existe uma exibição do contraste entre eles. E são muitos: Enquanto o rosto liso do menino é interrompido somente por algumas cicatrizes de um passado muito próximo, o dela é desenhado por rugas e cada uma delas, de repente, poderia contar uma história; se ela é mulher, idosa e branca, ele é um pequeno homem, uma criança negra – algo que é praticamente desenhado quando Ponti expõe as mãos deles sobrepostas.

Mesmo assim, o que constrói a ligação entre os protagonistas não é a dificuldade por serem opostos e nem a superação de diferenças, é a descoberta da igualdade e, com esta, o surgimento de uma empatia das mais fortes e bonitas. Ela é uma judia sobrevivente do Holocausto — marcada na pele — e ele é um mulçumano refugiado órfão — marcado pela pele. Além disso, Madame Rosa sabe bem o que é ter uma infância traumática, fato que é exposto pelo silêncio de alguns devaneios, por meio dos quais sua expressão é de um terror que Loren consegue sustentar como poucas atrizes conseguiriam.

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Até que ponto?

É, portanto, no saber bem que está a maior força de Rosa e Momo. O carinho que ela desenvolve por ele está explícito em seus pequenos gestos. Seja ao desviá-lo de uma criança sendo separada da mãe por agentes fardados — algo que ela deve ter suportado muitos anos antes —, seja por se abrir e, ao mesmo tempo, não adentrar nos detalhes dos horrores passados por ela junto aos nazistas, aquela senhora demonstra toda a empatia necessária para evitar que Momo não passe por eventos ainda mais traumáticos como os passados por ela.

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É a simplicidade tão honesta dessa amizade que, pouco a pouco, descortina as igualdades entre pessoas tão aparentemente diferentes. Com isso, cria-se o subtexto mais abrangente do filme: o de que nós podemos ser muito mais iguais aos nossos próximos do que pensamos. Por mais que, ilusoriamente, sejamos diferentes, nossos passados, em algum ponto, podem estar entrelaçados de um modo que, no final das contas, é o meio que nos transforma no que somos.

Podemos, claro, herdar muito dos nossos pais, mas, ao mesmo tempo, somos suficientemente abertos para que as experiências externas nos transformem. A questão é que, se podemos ser transformados, também podemos transformar. Resta, então, saber até que ponto queremos fazer a diferença no mundo.

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*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Canaltech.