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Crítica Evil Dead: A Ascensão | Novo filme cumpre tudo, menos o que mais importa

Por| Editado por Jones Oliveira | 20 de Abril de 2023 às 10h00

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Divulgação/Warner Bros.
Divulgação/Warner Bros.

A franquia Evil Dead tem um caminho complicado, que é refletido até mesmo na salada de nomes de seus lançamentos no Brasil. Entre Uma Noite Alucinante e A Morte do Demônio, temos também uma sucessão de idas e vindas, projetos que nascem e desaparecem, grandes promessas de retorno sacramentadas e, no caso do novo filme, tentativas de levar a marca por outro caminho, com um resultado igualmente confuso.

As intenções foram deixadas claras desde o início, assim como aconteceu no remake lançado há 10 anos — a ideia aqui é começar algo do zero, com as mesmas raízes do mal original, mas completamente novo.

Em A Morte do Demônio: A Ascensão, as florestas e cabanas isoladas do original são deixadas de lado logo de início em prol de um elemento igualmente decrépito, em um prédio decrépito em Los Angeles. A trama também deixa de lado as amizades em busca de diversão e a substitui por uma família meio quebrada.

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O centro da história é Ellie (Alyssa Sutherland), uma mãe de três filhos cuja história pessoal reflete, em partes, a de sua irmã e protagonista Beth (Lily Sullivan) — é uma similaridade que, inclusive, parece incomodar a mulher, pouca coisa mais velha, que tenta conciliar o cuidado com a família com pouco dinheiro e um trabalho como tatuadora. Uma hostilidade por vezes sutil que se transforma em um violento banho de sangue pela ação de um livro que acorda criaturas demoníacas antigas.

Terror físico e cotidiano

Após a leitura das palavras a partir de um disco de vinil, o mal ancestral acorda e começa a tomar conta da família um a um, enquanto todos tentam fugir de um prédio caindo ainda mais aos pedaços depois da ação de um terremoto. Uma sensação de clausura que conversa bem com os clássicos da série Evil Dead e também com seu remake, ainda que deixe de lado uma sensação de familiaridade que faz a maior das faltas no roteiro.

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A saga nunca foi um grande estudo de personagens, ainda que seu protagonista, Ash (Bruce Campbell), esteja no panteão de grandes figuras do horror dos anos 1980. É ele quem carrega todos os filmes da franquia e também o seriado que chegou ao fim em 2018, tendo ao seu lado figuras também icônicas, só que nem tanto. Foi assim também no remake da década passada, com a jornada de Mia (Jane Levy) sendo lembrada até hoje como um retorno bastante competente.

Você provavelmente não vai se lembrar dos personagens de A Morte do Demônio: A Ascensão por muito tempo, nem de seus nomes após o fim da projeção. Em um filme curto, todos têm amplo tempo de tela — com exceção dos vizinhos, que servem apenas como elemento de tensão em uma cena mostrada indiretamente —, mas não é como se o espectador se conectasse com nenhum deles. O motivo principal é a falta de uma atuação impactante dos três filhos de Ellie, principalmente, mas a crítica se estende a praticamente todo o elenco.

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Faltou direção de atores e, principalmente, profundidade em um ensejo no qual os irmãos estão vendo a própria mãe dominada por um demônio que não entendem e que um deles ajudou a liberar. Um a um, eles vão sendo feridos e, depois, entregues ao mal, sem que aqueles que vão ficando esbocem reações que vão além da confusão mental; não há um senso de urgência ou sobrevivência claro, enquanto os personagens parecem mais vítimas das consequências da possessão do que agentes envolvidos na própria sobrevivência.

Isso vale, principalmente, para a irmã de Ellie, cujos dramas pessoais tentam adicionar uma camada de personalidade ao filme sem muito sucesso. É, aliás, outro fator de estranheza já que, da turbulência da relação entre as duas, a figura de Beth surge como única salvação para os filhos., enquanto a própria história pessoal da protagonista aparece como geradora de conflito. Durante todo o tempo, porém, estaremos sempre reparando na falta de sensibilidade das atuações e sobre como o desespero que o filme tenta passar não é efetivamente refletido em nós.

Dá para dizer, sim, que A Morte do Demônio: A Ascensão é uma alegoria ao peso da maternidade, com um subtexto sobre como as histórias familiares podem se repetir ou até mesmo a maneira pela qual uma gravidez indesejada se impõe da maneira mais dramática possível sobre alguém (e não necessariamente estamos falando dos possuídos). Na prática, estaríamos preenchendo lacunas que o próprio filme deixa, intencionalmente ou não, enquanto nos exibe mais e mais cenas grotescas.

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Elas, sim, são o destaque da produção, como não poderia faltar em um longa da série Evil Dead. Ainda que caia em alguns clichês do cinema de terror baseado em demônios e espíritos, A Ascensão fará com que os espectadores nunca mais olhem do mesmo jeito para pistolas de tatuagem e raladores de queijo, da mesma forma que, no passado, a franquia fez com a motosserra. Ela também está no filme, quase como a arma mais poderosa de um vídeo game, a única capaz de acabar com o chefão final.

É uma reverência ao passado que está por toda a projeção, na forma de referências que aparecem em caixas de pizza, no sobrenome de atores secundários e até em uma gravação de áudio que será rapidamente reconhecida pelos fãs. O diretor Lee Cronin (O Bosque Maldito) arruma espaço até para algumas memórias bizarras, fruto do flerte da franquia Evil Dead com o terror pastelão; são lembranças boas, mas que também ampliam a estranheza de um roteiro que, desde o começo, se coloca do lado mais sério dessa saga.

Demônio sem rosto (nem personalidade)

Há um descompasso entre o que a produção parece querer passar e o que realmente está acontecendo na tela. Não fosse seu título, A Morte do Demônio: A Ascensão poderia muito bem se passar como um filme comum de possessão demoníaca, talvez até uma grande homenagem às obras originais, mas sem carregar o seu elemento principal de personalidade. É, talvez, o mais difícil de se fazer, mas o remake de 2013 comprovou ser perfeitamente possível.

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E aqui, não estamos falando de conectar o novo com o antigo ou fazer com que tudo seja parte de um único universo, mas sim, dos elementos igualmente fundamentais da franquia. Ao lado dos desmembramentos e da chuva de sangue, estão referências óbvias e algumas nem tanto, bem como uma referência óbvia a O Iluminado. Ela soa fora de lugar, ainda que aconteça em um dos picos de tensão do filme, simplesmente pela falta de conexão entre quem assiste e o que está acontecendo na tela.

O roteiro, inclusive, parece saber disso e, em uma tentativa de impactar, cria monstrengos e situações que vão contra a própria gênese de Evil Dead, um filme feito por Sam Raimi (Doutor Estranho no Multiverso da Loucura), Campbell e seus amigos em um ensejo de poucos recursos e muita ambição de fazer cinema. O caráter de produção maior de A Ascensão nos brinda com mais olhadas no Necronomicon, que sempre aparecia rapidamente nos produtos anteriores, mas também com exageros desnecessários em seu arco final.

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Em outra característica batida do cinema de horror, mal utilizada aqui, há um vaivém entre a cena inicial do longa e seu final, também não sustentada pelo roteiro — diante de tudo o que acontece no prédio, você provavelmente nem vai se lembrar de como o longa começou. Há um flerte interessante com uma teoria antiga dos fãs de Evil Dead sobre a casa do original e a forma como o mal pode ludibriar, enquanto o que se desenrola na realidade é uma tentativa fraca de entregar um gancho para sequência, no maior dos clichês apresentados por A Morte do Demônio: A Ascensão.

Vale a pena assistir A Morte do Demônio: A Ascensão?

É muito bom ter Evil Dead de volta, ainda que o novo filme represente o exemplar mais fraco da franquia. É uma história cheia de potencial e que, acima de tudo, poderia vir carregada de sentimento, com alegorias sobre alienação parental, o fardo de ser mãe cedo demais ou, simplesmente, a destruição completa de uma família diante de algo que não entendem. Todos seriam elementos que agregariam ao básico que se esperaria de um longa destes, deixados de lado em prol da violência por si.

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Ela é, sim, uma característica da franquia e aparece muito bem executada no longa de Cronin, que traz cenas interessantes de possessão e combates impactantes, ainda que com um exagero desnecessário na parte final. Dava, porém, para ir mais além e faltou o entendimento de que Evil Dead, ainda que nem de longe uma obra das mais elaboradas, é mais do que simplesmente sangue, desmembramento e demônios que enfiam o dedo na ferida, muitas vezes literalmente.

Evil Dead: A Ascensão está em cartaz nos cinemas de todo o Brasil; garanta seu ingresso na Ingresso.com.