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Melatonina funciona mesmo para dormir?

Por| Editado por Luciana Zaramela | 30 de Dezembro de 2021 às 10h10

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Microgen/Envato Elements
Microgen/Envato Elements

Em busca de uma melhor qualidade de sono, muitas pessoas recorrem ao uso de suplementos com melatonina, conhecida popularmente como o "hormônio do sono". Isso porque, no organismo humano, a melatonina — produzida pela glândula pineal, na região central do cérebro — tem a função de regular o nosso relógio biológico (o ciclo circadiano), ajudando o corpo a dormir, e este mesmo comportamento é esperado por quem a consome estas cápsulas ou gotas.

Desde dezembro de 2021, farmácias foram liberadas para comercializar suplementos de melatonina, sem a necessidade de uma receita médica, no Brasil. A mudança ocorreu depois que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) passou a categorizar o produto como suplemento alimentar. Com isso, um número maior de brasileiros já pode fazer o uso, de forma simplificada.

Segundo a Anvisa, suplementos alimentares à base de melatonina não devem ser consumidos por gestantes, lactantes, crianças e pessoas envolvidas em atividades que requerem atenção constante.

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Para entender quais são os potenciais benefícios e riscos do uso da melatonina, o Canaltech conversou com o endocrinologista Thiago Fraga Napoli, médico assistente do Serviço de Endocrinologia do Hospital do Servidor Público Estadual (HSPE), em São Paulo.

Adiantamos que o uso do produto pode trazer melhoras para o usuário, mas apenas para aqueles que têm alguma deficiência do hormônio no organismo. Além disso, faltam evidências científicas que confirmem os supostos benefícios do produto para o emagrecimento.

Entenda o que é o "hormônio do sono"

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Vale explicar que a melatonina não é simplesmente um indutor de sono. “Trata-se de um hormônio fundamental para a fisiologia humana, que regula nossa ‘agenda’ metabólica”, explica o endocrinologista Napoli.

Liberado à noite, o hormônio é parte do ritmo circadiano. Nesse processo, ele induz as modificações necessárias para o repouso — como o sono e o jejum. Além disso, atua na redução da pressão, da atividade cardiovascular, da frequência cardíaca e da temperatura corpórea.

“O uso incorreto, de dose incorreta, em que a presença desse hormônio ocorra de forma inadequada, em horário não compatível com a fisiologia normal, pode gerar distúrbios desde alterações de glicose até sonolência”, afirma o médico.

Por exemplo, o uso inadequado pode induzir o sono pela manhã, o que é considerado uma “aberração metabólica”, já que tira do eixo e, literalmente, bagunça o ciclo circadiano.

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Uso de melatonina funciona mesmo?

De acordo com o médico, “a melatonina tem sua indicação, por ora, nos distúrbios de insônia”. Este uso pode trazer inúmeros benefícios para quem não consegue dormir direito, já que “melhora a disposição e a readequação da ordem de funcionamento de nosso corpo, que tem um ciclo de despertar no período de luz e dormir no período noturno”, lembra Napoli.

No entanto, o benefício só pode ser obtido caso a melatonina seja usada no horário correto e para as pessoas, de fato, com o distúrbio do sono e com falta do hormônio no organismo. “Portanto, é importante passar pela adequada avaliação e orientação médica”, defende o médico.

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Em nota, a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) também aponta para a importância do suplemento com o acompanhamento médico. “O uso de melatonina deve ter indicação e acompanhamento médico”, afirma o texto.

Para quem é recomendado?

Como explicamos, a suplementação da melatonina pode trazer benefícios. No entanto, o uso é indicado “apenas naquelas que têm um prejuízo pela alteração do sono, como nos distúrbios próprios do sono e Jet-Lag”, conta o endocrinologista do HSPE. O uso pode ajudar contra a insônia, por exemplo.

“Outras doenças, como enxaquecas, depressão e alguns tipos de câncer também têm estudos em curso. No entanto, por si própria, não há benefício aparente no uso sem uma alteração prévia existente”, alerta Napoli.

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Além disso, “em pacientes com síndrome metabólica também há indícios de melhora em alguns parâmetros, como pressão e colesterol. Contudo, os estudos ainda são limitados em seu tamanho e não validam o uso dessa medicação com tais finalidades”, detalha.

“Por ora, seria mais como um possível ganho colateral para quem tem de fazer uso por questões de sono”, resume o médico sobre o principal uso do hormônio que é o auxílio de quem convive com alterações no sono.

E o tratamento contra obesidade?

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Nas redes sociais, são comuns recomendações caseiras do uso de melatonina para o emagrecimento e no controle de obesidade. No entanto, essa indicação cai no mesmo problema dos outros possíveis usos: faltam dados concretos desses benefícios. Nesse ponto, a ciência ainda estuda os potenciais ganhos da suplementação.

"A melatonina, por si só, não tem comprovação como medicação antiobesidade, apesar de em alguns trabalhos haver algumas melhoras metabólicas possíveis. Assim, outras medicações seriam mais bem indicadas, pois têm melhor resultado esperado”, conta Napoli.

Para pacientes que buscam dormir melhor e também perder peso — como os que são acometidos por síndrome ansiosa, obesidade e apneia do sono —, é “uma abordagem simplista do uso de um indutor de sono". Além disso, "por conta própria, como no caso de um suplemento de compra não regulamentada, não trará benefício com certeza”, reforça.

Precauções da suplementação

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É importante destacar que a maioria dos distúrbios do sono é leve, de origem comportamental e não necessita de medicação, explica o médico. Nesse sentido, “antes de as pessoas buscarem pelo próximo elixir milagroso, seria ideal que passassem por um médico que possa tentar compreender seu real estado e ajudá-lo de forma mais específica”, orienta Napoli.

Isso porque o problema pode ter uma resolução mais simples do que a imaginada ou mais fácil do que usar, de forma contínua, a melatonina. "O mercado de suplementos vende muitas falsas esperanças e poucas soluções. Muitas pessoas procuram um caminho mais fácil para seus problemas, mas, por não procurarem ajuda qualificada, acabam escolhendo um caminho curto e ineficaz em vez de uma prática mais eficaz, ainda que dê mais trabalho”, comenta.

De acordo com o médico, a transformação esperada — no caso, dormir melhor — pode ser encontrada em uma mudança de estilo de vida, como a adoção de novos hábitos. "A indústria dos milagres ganha muito dinheiro, e os pacientes perdem muito tempo. Não que a melatonina seja um engano, mas sua melhor aplicação não é para todos, como se fosse um suplemento, um ‘melhorador’ do corpo”, completa o endocrinologista.

Fonte: Com informações: SBEMABN