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Fungo pode ser a principal causa de morte em pacientes com HIV

Por| Editado por Luciana Zaramela | 02 de Junho de 2021 às 17h50

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Através do uso de remédios continuados e de acompanhamento médico, um paciente que convive com o HIV pode ter uma vida normal, se tornar indetectável para infecção e, consequentemente, não transmitir mais o vírus da AIDS. Nesses casos, a doença é controlada, mas essa não é a realidade de todos os brasileiros que convivem com o agente infeccioso. Em um estudo feito na cidade de Manaus, uma série de autópsias apontaram que uma infecção fúngica — e controlável — é uma das principais causas de morte em pessoas com HIV.

A relação entre casos de histoplasmose — infecção causada pelo fungo Histoplasma capsulatum — e o óbito de pacientes com HIV na região de Manaus foi descoberta por um time de pesquisadores do Instituto de Saúde Global de Barcelona (ISGlobal), da Fundação de Medicina Tropical Doutor Heitor Vieira Dourado e da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), a partir de uma série de autópsias feitas entre 2014 e 2015.

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No levantamento, "a causa imediata da morte [histoplasmose] e não a doença de base [HIV] foi considerada como a principal causa do diagnóstico de morte", defendem os autores do estudo, publicado na revista científica PLOS Neglected Tropical Diseases. Para entender, a morte não foi causada pelo HIV, mas sim por uma infecção oportunista, no caso a histoplasmose. Caso houvesse tratamento adequado para a doença fúngica, o óbito poderia ser, potencialmente, ser evitado.

Entendendo o fungo Histoplasma capsulatum

Conhecida popularmente como doença das cavernas, a histoplasmose é uma infecção pulmonar causada pela inalação de esporos de um fungo, o histoplasma, em algumas regiões do globo, como as Américas e a África. Para a maioria das pessoas saudáveis, a doença pode se comportar de forma a assintomática e, quando se manifesta, é através de sintomas quase sempre leves. O maior risco é quando ocorre exposição a uma grande quantidade de esporos e pode ser confundida com um caso de tuberculose.

No entanto, a situação tende a mudar em pacientes imunossuprimidos, como portadores do HIV. Nesses casos, a infecção fúngica pode se disseminar para outras parte do organismo, além do pulmão, e levar ao óbito, caso não seja tratada. "Nesses pacientes, a histoplasmose disseminada progride rapidamente e é sempre fatal se não tratada. Infelizmente, apesar do aumento da terapia anti-retroviral, a histoplasmose disseminada ainda é uma importante causa de mortalidade em pessoas HIV-positivas que vivem em áreas endêmicas", destacam os autores do artigo. Em casos graves da doença, pulmões, baço, fígado e medula óssea são os órgãos mais afetados.

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"Na América Latina, estimativas recentes sugerem que a incidência e mortalidade da histoplasmose em pacientes HIV-positivos pode ser ainda maior do que a da tuberculose. No entanto, a real taxa da histoplasmose e sua mortalidade associada em muitas regiões endêmicas, incluindo o Brasil, é pouco conhecida", alerta o grupo. "No Brasil, a histoplasmose é altamente endêmica nas regiões Norte, particularmente na Amazônia, bem como nas áreas Centro-Oeste e Sudeste", detalha.

Como foi a pesquisa em pacientes com HIV? 

No estudo sobre a doença fúngica, foram incluídos pacientes que foram ao óbito enquanto eram tratados na Fundação de Medicina Tropical Doutor Heitor Vieira Dourado, em Manaus, durante os meses de março de 2014 a fevereiro de 2015. Além disso, cada relato de caso precisava, obrigatoriamente, apresentar: uma autópsia completa feita em um intervalo de pós-morte de até 48h; e consentimento dos familiares para a inscrição na pesquisa.

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No total, foram considerados 61 casos. Durante o processo de autópsia completa, os pesquisadores verificaram a presença (ou não) da doença fúngica e a sua extensão no organismo de cada paciente, ou seja, quais órgãos foram afetados pela histoplasmose. Além disso, foram realizados testes para verificar a infecção por HIV.

Relação do fungo com o HIV

Segundo a conclusão do estudo, 37 dos 61 (61%) pacientes testaram positivo para HIV. E 14 dos 21 pacientes com infecção por histoplasma (67%) também carregavam o vírus da AIDS em seu organismo, incluindo todos os oito pacientes com histoplasmose disseminada (estágio mais grave da doença). No total, a doença fúngica foi a principal causa de morte em 16% (6/37) dos pacientes com HIV e, em paralelo, contribuiu significativamente para a morte de 22% (8/37) de outros pacientes com HIV.

Embora o número de autópsias tenha sido relativamente baixo, os pesquisadores consideram que a prevalência geral e mortalidade — 34% e 13%, respectivamente — de histoplasmose encontradas no estudo foram "notavelmente altas". "Entre os pacientes HIV positivos, a prevalência e a mortalidade foram ainda maiores (38% e 22%, respectivamente)", afirmam os autores.

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"O baixo índice de suspeita clínica e a gravidade da doença disseminada justificam a necessidade de implementação de métodos de rastreio de rotina sensíveis [ao fungo]. Além disso, a profilaxia antifúngica deve ser encorajada em pacientes em quadros graves da infecção por HIV que vivem em áreas hiperendêmicas de histoplasmose", orientam os pesquisadores sobre políticas de saúde pública que devem ser implementadas na região. "Finalmente, o aumento da terapia anti-retroviral é necessário, pois a histoplasmose fatal ocorre entre pacientes com HIV com doença avançada que não recebem cuidados médicos adequados", completam.

Para acessar o artigo completo sobre os casos de histoplasmose e o HIV, publicado na revista científica PLOS Neglected Tropical Diseases, clique aqui.