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Folie à Deux: o que significa o título do filme do Coringa?

Por| Editado por Luciana Zaramela | 09 de Junho de 2022 às 20h30

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Warner Bros
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Se você é ligado no Canaltech, já sabe que Joker: folie à deux, foi confirmado nesta semana. Afinal, o que significa o título do segundo filme do Coringa, interpretado por Joaquin Phoenix? Folie à Deux, é, na verdade, uma síndrome rara — uma condição mental também chamada de transtorno delirante induzido. Nela, problemas psicológicos, principalmente delírios psicóticos, são transferidos de uma pessoa outra, compartilhando das mesmas paranoias e manias de perseguição, por exemplo.

Apesar do nome (cujo significado literal traduzido do francês é "loucura a dois"), a condição pode abarcar mais de uma pessoa, sendo então chamada de folie à trois ou à quatre, e até famílias inteiras — folie à famille ou à plusieurs. Para ela ocorrer, as pessoas envolvidas precisam ser próximas, geralmente familiares, estar relativamente isoladas de outras pessoas e compartilhar, aceitar e apoiar os delírios um do outro.

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Definições e sintomas

Na literatura científica, também vemos a folie à deux ser chamada de insanidade compartilhada, insanidade contagiosa, loucura infecciosa, psicose de associação e dupla insanidade. A condição sempre parte de um sujeito primário, alguém com algum nível de psicose, para um ou mais sujeitos secundários — grande parte dos casos acontece partindo de mulheres, da mãe para o filho ou entre parceiros.

Entre os subtipos da doença, temos:

  • Folie imposée, quando as crenças delirantes de uma pessoa psicótica são impostas em outra;
  • Folie simultanée, quando o desenvolvimento de um delírio idêntico acontece com duas pessoas psicóticas muito próximas;
  • Folie communiquée, quando uma pessoa normal desenvolve uma crença delirante partindo de alguém psicótico após resistir por muito tempo, mantendo a crença pós a separação;
  • Folie induite, quando alguém já psicótico adiciona novos delírios a partir de alguém próximo que também seja psicótico.
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Entre os delírios mais comuns vistos na ocorrência da folie à deux há o delírio persecutório, onde as pessoas envolvidas creem estar sendo alvo de perseguição, tentativas de assassinato e afins, até mesmo vindo de parentes e vizinhos. O isolamento social é um fator de risco, bem como o contato prolongado com a pessoa psicótica primária — principalmente se a pessoa influenciada tem alguma predisposição a desenvolver sintomas psicóticos.

Mas quando é que a síndrome acontece? Como dissemos, ela é rara, e mesmo em tempos de grande isolamento social, como durante a pandemia de covid-19, não se falou de aumento nos casos. A questão é a relação entre o indutor e o induzido: além de serem muito próximos física e emocionalmente, os envolvidos também tem de ter pouco contato com a realidade e propensão à psicose ou esquizofrenia.

O motivo da condição ocorrer mais entre parceiros e mães e filhos, entre outros, é que a propensão a acreditar no delírio psicótico — que, nota-se, deve ser verossímil para os envolvidos — deriva de uma vontade forte de manter o status quo na família ou na comunidade, por exemplo, evitando a separação de entes queridos e a indisposição entre eles (embora relações de amor e ódio também sejam comuns nos pacientes).

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Como tratar?

Pacientes que apresentam folie à deux dificilmente procuram ajuda médica sozinhos — afinal, eles acreditam estar sendo vítimas de outro tipo de problema, como perseguição —, então, para início de conversa, o ideal é que familiares ou pessoas próximas as auxiliem a procurar ajuda. Geralmente, o tratamento é feito com remédios psiquiátricos e, principalmente, afastando as duas ou mais pessoas envolvidas do convívio próximo.

Em alguns casos relatados na medicina recente, como o de uma mãe e filho em Calicute, na Índia, em 2005, o tratamento com remédios e separação dos envolvidos rendeu resultados dentro de um mês, com remissão do filho e quase remissão da mãe nesse período — os dois acreditavam estar sendo perseguidos pelos vizinhos, que supostamente queriam matá-los.

Também vale ressaltar que situações de confinamento, apesar de serem fator de risco, não são necessárias para que a folie à deux ocorra: um caso brasileiro, relatado em 2015, fala de uma mulher de 51 anos que tentou suicídio e quase matou o próprio filho, acreditando em delírios psicóticos de sua mãe, que dizia ser médium e revelava maus presságios em relação ao neto e à filha.

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As duas não viviam em confinamento, mas tinham convivência próxima, com grande influência da mãe sobre a filha: o delírio induzido ocorreu apenas duas vezes, uma quando o filho nasceu, e outra 26 anos depois, quando a paciente tentou suicidar-se, ambas por influência da mãe. Com 10 dias de medicação e separação, os sintomas diminuíram consideravelmente, sumindo em 14 dias.

Recaindo dois meses depois, seis meses de tratamento se seguiram até a paciente ficar assintomática. O caso serve para mostrar que não é apenas o confinamento que leva à condição, e que a propensão à psicose é essencial para a folie à deux se instalar: a mãe da paciente também trazia revelações mediúnicas a outros familiares, mas apenas a filha desenvolveu o quadro psicótico.

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Não sabemos como será tratada a folie à deux no próximo filme do Coringa, já que há poucas informações sobre o longa, mas especula-se que o personagem vá compartilhar de sua psicose com outro: se a doença será tratada de acordo com as definições clínicas ou se é apenas uma brincadeira com o título, sabemos menos ainda. Resta aguardar — de preferência, não em confinamento.

Fonte: Com informações: Indian Journal of Psychiatry, Scielo, Psych Scene Hub