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Colírio faz menino cego voltar a enxergar

Por  • Editado por Luciana Zaramela | 

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Nos Estados Unidos, pesquisadores da Universidade de Miami fizeram, pela primeira vez, algo impensável. Com o uso off-label — fora da bula — de um remédio para terapia genética transformado em colírio, os médicos permitiram que um menino de 14 anos voltasse a enxergar. O paciente convive desde o nascimento com epidermólise bolhosa.

Liderado pelo médico e pesquisador Alfonso Sabater, o tratamento experimental só foi liberado após o garoto Antonio Vento Carvajal não responder aos tratamentos convencionais para a sua condição de origem genética, que impedia a sua visão.

O curioso é que este foi o segundo experimento que Carvajal participou envolvendo o tratamento gênico Vyjuvek, da Krystal Biotech. Inicialmente, o menino participou dos testes clínicos para o uso da medicação no tratamento geral contra a epidermólise bolhosa e, mais recentemente, validou o impacto da fórmula nos olhos. O composto de uso geral é aprovado pela agência Food and Drug Administration (FDA), desde maio deste ano.

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Entenda o que é Epidermólise Bolhosa e a relação com a cegueira

Antes de seguir, vale entender o que é epidermólise bolhosa (EB) de origem genética. Diferente do que se possa imaginar, não é uma única doença, mas sim um grupo de doenças que têm, em comum, a formação de bolhas dolorosas na pele, após qualquer tipo de atrito, e que se manifesta desde o nascimento, como a EB simples (EBS) ou ainda a EB Kindler (EBK). Devido a essa sensibilidade, os pacientes são conhecidos por terem pele tão sensível quanto as asas de uma borboleta.

O surgimento das bolhas está relacionado com a ausência ou baixa produção com o colágeno do tipo 7 (COL7). Na pele "normal", a proteína age como uma espécie de cimento, que une as células da camada mais superficial da pele com a camada mais interna. Com a deficiência na produção do colágeno, a pele se torna muito mais sensível. Além de traumas, as bolhas podem se formar em decorrência do calor ou mesmo de forma espontânea. Em alguns pacientes, ocorrem lesões oculares, que podem tornar o indivíduo cego.

Segundo a associação Debra Brasil, são cerca de 500 mil pessoas com epidermólise bolhosa no mundo. No Brasil, é estimado que cerca de 1,6 mil indivíduos convivam com a condição, sendo que 1.027 brasileiros constam no registro nacional da entidade.

Terapia genética contra a doença rara

Desde maio deste ano, a agência FDA autorizou o uso de um novo tipo de terapia genética para o tratamento da condição, o remédio Vyjuvek. Este é um gel que deve ser aplicado periodicamente na pele por um profissional de saúde, com o objetivo de “curar” as bolhas dolorosas.

O medicamento usa o vírus da herpes simples (HSV-1) modificado em laboratório como vetor viral, ou seja, forma de transporte dos seus componentes. Quando entra em contato com o organismo, o vetor fornece cópias saudáveis do gene COL7A1, responsável por sintetizar o colágeno, para as células da região das feridas. Isso possibilita a melhora ou mesmo a cura das bolhas.

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Diferente de outras terapias gênicas, o que ocorre é a cura da lesão, sem curar a doença. Em outras palavras, a pessoa pode desenvolver novas bolhas no corpo e, por isso, o tratamento deve ser contínuo e periódico.

Como o menino voltou a enxergar com o colírio?

O menino Carvajal foi voluntário nos experimentos que garantiram a aprovação geral de uso da FDA, segundo a agência de notícias AFP. Apesar das melhoras com o uso tópico, o adolescente relatava perda de visão por causa das bolhas. Como alternativa de tratamento, ele chegou a passar por uma cirurgia que removeu o tecido cicatricial dos olhos, mas este voltou a crescer com o aparecimento de novas bolhas.

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Sem outras opções, a ideia do médico Sabater foi usar a terapia genética em forma de colírio. Esta nova versão da medicação foi desenvolvida em parceria com a farmacêutica Krystal Biotech.

Tendo o produto experimental pronto, o garoto passou por uma nova cirurgia que removeu o tecido cicatricial do olho direito em agosto do ano passado. Em seguida, iniciou o tratamento. Segundo o médico, o paciente recuperou a visão, mas regularmente precisa usar o colírio. Agora, a terapia deve ser repetida no olho esquerdo, onde se espera que seja igualmente eficaz.

Com o uso off-label bem-sucedido, a terapia genética para curar a cegueira associada com a epidermólise bolhosa deve ser testada em mais pacientes. No futuro, pode se tornar um protocolo padrão até mesmo para impedir a perda de visão.

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Vale destacar que, na ciência, a terapia genética já é usada no tratamento da Hemofilia B, talassemia beta, atrofia muscular espinhal (AME) e alguns tipos de câncer. No entanto, um dos grandes desafios é a questão dos custos, considerando que alguns medicamentos do tipo podem custar centenas de milhares ou mesmo milhões de dólares.

Fonte: Debra BrasilFDA e ABC News (AFP)