Bactérias comedoras de plástico podem resolver um problema que afeta a saúde
Por Fidel Forato • Editado por Luciana Zaramela |
O plástico pode ser um problema para a saúde humana e de diversas espécies, principalmente quando entra em decomposição. Sem o descarte correto, o material tende a se degradar no meio ambiente, como nos oceanos, e libera fragmentos submilimétricos, os chamados microplásticos, neste processo. Eventualmente, é consumido por plânctons e disseminado por toda a cadeia alimentar. Este é um problema aparentemente sem solução, mas, agora, pesquisadores investigam um tipo de bactéria que pode, literalmente, comer todo este resíduo plástico.
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Publicado na revista Science, o estudo sobre as bactérias que se alimentam de plástico foi desenvolvido por cientistas do Instituto de Tecnologia de Kyoto, no Japão, liderados pelo microbiologista Kohei Oda. "A nova espécie, Ideonella sakaiensis, decompõe o plástico usando duas enzimas para hidrolisar o PET [o tereftalato de etileno, como o poli] e um intermediário de reação primária", explicam os autores.
Bactéria seria a solução para a reciclagem do plástico?
Recentemente descobertas, essas bactérias poderiam encarar o plástico como sua única fonte de energia e alimento. No processo, os resíduos do petróleo são decompostos por suas enzimas e a atividade beneficia tanto as bactérias quanto os humanos. No entanto, o estudo inicial é de 2016 e, desde então, não foi possível transformar a descoberta em um sistema eficiente de reciclagem de plástico.
Em outras palavras, a indústria ainda está a anos de um uso comercial generalizado para esta bactéria. Outra questão é que a enzima PETase, aparentemente, só é capaz de decompor o plástico PET, mas existem seis outros tipos que não podem ser degrado por esta bactéria. Apesar dos entraves, pesquisas continuaram.
Produtora de plástico sustentável?
No final de 2021, os pesquisadores do Instituto de Ciência e Tecnologia de Nara (Naist) anunciaram mais um descoberta interessante sobre esta bactéria: a Ideonella sakaiensis pode degradar plásticos à base de petróleo, mas também produzir plásticos biodegradáveis de forma sustentável. Para ser mais preciso, os cientistas identificaram que a bactéria converte o PET um plástico biodegradável, ou seja, é uma espécie de reciclagem natural.
Com estas novas evidências científicas, é esperado que uma nova onda de estudos sobre as possibilidades de reciclagem do plástico comecem e, eventualmente, desenvolva-se um sistema economicamente viável para tratar este material. O estudo foi publicado na revista Scientific Reports.
Mais estudos para digerir o plástico
Além dos estudos japoneses, cientistas da Universidade de Portsmouth, na Inglaterra, aperfeiçoaram a enzima PETase — as digestoras de plásticos — e criam um coquetel para acelerar a digestão dos resíduos do petróleo. Na fórmula, somaram uma outra enzima do tipo, a MHETase. Segundo a equipe, a técnica permite uma digestão até seis vezes mais rápida que o plástico normal.
Em um caminho diferente, pesquisadores da Universidade de Edimburgo, na Escócia, estudam as aplicações da bactéria Escherichia coli na transformação do plástico. Esta bactéria é naturalmente encontrada no trato gastrointestinal das pessoas e de outros animais.
Na pesquisa, os escoceses usaram a bactéria para converter plástico em vanilina, ou seja, o principal componente do extrato de baunilha. Novamente, o invento está distante do uso comercial, mas são novas propostas para encarar o descarte inadequado de plástico.
Impacto na saúde humana?
Do outro lado, as evidências de que os microplásticos chegam ao corpo humano não param de aumentar e ainda não se sabe exatamente quais complicações podem acarretar para o organismo. Por exemplo, pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP) identificaram minúsculas partículas de plástico no pulmão humano.
Nas amostras analisadas pelo grupo de brasileiros, os polímeros mais frequentemente encontrados foram o polietileno — conhecido como plástico comum, como o das sacolinhas — e o polipropileno — usado em embalagens, sacolas, brinquedos e eletrônicos. Estes vestígios só foram encontrados após análise de tecidos pulmonares, obtidas através de uma autópsia.
Além dos oceanos, "os microplásticos estão presentes no ar e podem ser inalados por humanos, mas ainda não se sabe se eles têm efeitos deletérios no sistema respiratório", apontaram os autores do estudo, publicado na revista científica Journal of Hazardous Materials.
Microplásticos na placenta
Aparentemente, os pulmões não são a única região afetada pelos microplásticos. Pesquisadores da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia (NTNU) e da Universidade de Oulu, na Finlândia, identificaram o material na placenta e em recém-nascidos, a partir de uma revisão de estudos científicos sobre o tema. Esta pesquisa foi publicada na revista Environmental Health Perspectives.
Fonte: Journal of Hazardous Materials, Scientific Reports, Science, Environmental Health Perspectives e LiveScience