Por que ocultar curtidas no X/Twitter não é uma ideia tão boa quanto parece
Por André Lourenti Magalhães • Editado por Douglas Ciriaco |
O X (antigo Twitter) decidiu deixar todas as curtidas como privadas na rede social. A mudança desfez uma configuração antiga da rede e pode mudar a forma em que as pessoas interagem por lá, o que tem alguns potenciais riscos. A equipe do X explica que a decisão de ocultar os likes de outras pessoas seria uma forma de "proteger a privacidade". Por outro lado, isso pode favorecer a presença de bots e amplificar discursos de ódio na rede social: o Canaltech conversou com especialistas para avaliar as possíveis consequências.
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O que muda nas curtidas?
Com a mudança, o X oculta a lista de curtidas de uma conta: antes, era possível abrir um perfil e ver todos os likes numa aba separada, mas agora a lista está disponível apenas para o proprietário da @. Além disso, não é possível ver a lista de pessoas que curtiram a publicação de uma conta de terceiros, ou seja, acabaram todas as formas de conferir quem deu like no que na rede social de Elon Musk.
Em resumo, somente o dono da conta consegue ver a lista de publicações que ele mesmo curtiu e a lista de pessoas que deram like em algum post daquela conta — o X ainda mostra de forma pública a quantidade de likes de cada publicação.
Potenciais riscos
Enquanto a mudança pode diminuir a atuação de stalkers na rede, existem duas outras possíveis consequências que mostram que a ideia não é tão boa quanto promete.
Avalanche de bots
O primeiro problema em potencial é o aumento do uso de bots para “inflar” o engajamento das publicações — agora, não é mais possível monitorar se as curtidas foram feitas de forma orgânica ou contaram com a ajuda de robôs para impulsionar os resultados. Números mais altos de interações podem ser um atrativo para anunciantes, mas também podem afetar negativamente criadores de conteúdos e proprietários de marcas na rede.
Para o publicitário e especialista em educação Antonio Gelfusa Junior, a medida pode interferir no impacto real da audiência de uma determinada conta.
“Os bots já são uma realidade no X e em outras redes sociais: existe um mercado comercial que vende curtidas, visualizações e comentários em todas as plataformas. De fato, eles 'sujam' e manipulam o engajamento. Nesse contexto, a performance cai porque a audiência não se manifesta sem o número de curtidas”, comenta.
Discurso de ódio
A medida também pode intensificar o discurso de ódio e outros comportamentos negativos na plataforma: sem a exposição a outras pessoas, perfis podem curtir publicações ofensivas e gerar engajamento nesse tipo de conteúdo. Vale lembrar que, antes da mudança, era possível acompanhar as curtidas de figuras públicas.
A pesquisadora Tatiana Azevedo, que monitora grupos extremistas em redes sociais, alerta para os possíveis problemas:
“Desde que Musk assumiu o Twitter (me recuso a chamar de X), a rede se tornou um lugar mais ofensivo e o discurso de ódio multiplicou", comenta. "O fim da visualização das curtidas leva a uma falta de pudor em curtir conteúdos extremos, inapropriados e discursos de ódio. Os usuários deixam agora de se preocupar com o escrutínio de suas curtidas, num momento em que a rede está mais permissiva do que nunca”, prossegue a especialista.
Além disso, é importante mencionar que as curtidas impactam diretamente nos conteúdos sugeridos no feed Para Você — a informação é confirmada pelo perfil de engenharia da plataforma. Assim, se uma pessoa curte vários posts sobre discurso de ódio, é esperado que a timeline mostre mais publicações sobre o tema.
“Sem dúvida as pessoas se sentirão mais confortáveis (para o bem ou para o mal) em se expressar através das curtidas. O ódio sempre foi um grande atrativo para o engajamento — imagine quando as pessoas puderem, sem nenhuma consequência, curtir postagens carregadas de ódio e de intolerância?”, pondera Azevedo.
“Considerando que o algoritmo nos faz ver mais daquilo que nós curtimos, havendo um aumento de curtidas em postagens de ódio, mais conteúdo de ódio será oferecido pelo algoritmo. Esse aumento de consumo pode sim ampliar comportamentos negativos dentro e fora da Internet”, completa.
Paralelamente à mudança nos likes, o X também alterou os termos e começou a liberar conteúdo adulto na plataforma.