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Uma startup quer garantir que você não receba mais comida fria nos deliveries

Por| 12 de Agosto de 2021 às 08h50

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Um velho ditado popular diz que "a necessidade é a mãe da invenção". E uma onda de entregas de pizzas frias na cidade de São Paulo e em Ilha Bela motivou a criação de um sistema de aquecimento que promete ao consumidor que ele não receberá mais comida fria no delivery. E, tão bom quanto isso: ele poderá pedir por refeições mesmo que a sua casa esteja distante do seu restaurante preferido.

A solução usa um sistema de aquecimento por indução eletromagnética e foi desenvolvida pelo inventor Delfim Neto que, inicialmente, usaria a tecnologia para funcionar em um futuro utensílio doméstico de aquecimento de comida. No entanto, ele observou as propriedades gastronômicas de uma comida fresca — como o queijo de uma pizza, por exemplo — não seriam as mesmas quando reaquecidas nessa plataforma.

Com isso, o modelo de negócios foi repensado e uma das sugestões foi usar esse sistema de aquecimento em uma mochila de entrega de refeições usadas por motoboys e tão comuns pelas cidades Brasil afora. Dessa forma, a comida manteria seu frescor e temperatura durante todo o trajeto entre o restaurante e a casa do cliente. Aprovada a ideia, começaram os testes.

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Neto, juntamente com Armando Pompeu, Alessandro Andrade e Marcelo Guimarães contrataram um engenheiro para montar o protótipo de uma mochila que pudesse embutir esse sistema de aquecimento, mas sem os riscos de pegar fogo ou danificar seus componentes. Com o exemplar construído, era hora de testar juntos aos restaurantes.

Para certificar as qualidades do sistema de aquecimento, Pompeu e Andrade o testaram nas mais diversas culinárias (carnes, massas, pizzas, sanduíches, sopas, risotos, etc). Eles compravam as refeições, alocavam na mochila dotada com a tecnologia e traziam para casa para experimentar. Quando se certificaram que a invenção funcionava bem, testaram-na junto a chefs de cozinha e donos de restaurantes, notoriamente mais críticos e rigorosos em relação à comida.


Para isso, eles pediam que fossem preparados dois pratos da mesma refeição, alocavam um deles em uma mochila normal e o outro na bag com o seu sistema de aquecimento. Na sequência, eles deixavam os pratos dentro desses compartimentos entre 25 e 35 minutos (tempo médio de um delivery até a casa do cliente) e depois retiravam para que os donos dos restaurantes experimentassem. Enquanto na mochila comum, a temperatura interna era de 30ºC, na adaptada essa temperatura estava em 80ºC, permitindo que as refeições mantivessem seu frescor.

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Mais uma vez, a solução de Neto e cia. ganhou a disputa. Nascia aí a Kenti, uma foodtech que não apenas quer usar essa tecnologia para deixar as refeições aquecidas — e saborosas — por muito mais tempo, como também permitirá que os restaurantes ampliem o seu raio de entrega para regiões mais distantes e aumentem sua clientela, já que o frescor dos pratos será mantido.

De protótipo a produto

Com o feedback positivo dos donos de restaurantes, os fundadores da Kenti contrataram uma empresa de engenharia de maior porte que transformou o protótipo em um produto final, pronto para ir ao mercado, seguindo as especificações de segurança. Hoje, a foodtech afirma que trabalhará com duas versões da mochila: um onde toda a eletrônica é interna e um segundo modelo em que parte desses componentes está dentro e a outra parte, fora.

Olhando de fora, a mochila da Kenti parece mais uma daquelas usadas comumente pelos entregadores. Mas ao abri-la, é possível ver a tecnologia envolvida. Há uma bateria, um circuito inversor que funciona em sincronia com a espira para fazer a indução eletromagnética e realizar o efeito físico de aquecimento, uma placa de circuito impresso, onde está o software que faz todo o gerenciamento de Internet das Coisas (IoT) e uma pequena placa que traz o recurso de GPS.

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Segundo Alessandro Andrade, todo esse aparato deixa a mochila cerca de 2 kg mais pesada, algo equivalente a uma garrafa de refrigerante dois litros, o que impactaria pouco no manuseio pelos entregadores.

"E como a nossa bag depende de bateria para funcionar, buscamos um modelo de dimensões menores, que permite ao entregador ou dono do restaurante recarregar a mochila em uma tomada padrão como se fosse um celular", explica o executivo. "Ela tem uma autonomia média de cinco horas e demora cerca de duas horas na tomada para retomar a carga total. Esse processo de recarga pode ser feito entre a hora do almoço e o jantar. Além disso, a bateria só começa a funcionar quando os sensores de movimento reconhecem que uma refeição será alocada dentro da mochila. Se não há atividade, ela permanece em stand by, sem gasto de energia". 


Na questão da segurança para os entregadores, Pompeu e Andrade explicam que há o mínimo de intervenção desse profissional, já que o processo de aquecimento é todo automático.

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"Do ponto de vista da operação, a única coisa que o entregador precisa fazer é abrir a tampa, colocar a comida lá dentro e fechar a tampa. Como ele sempre fez", disse Pompeu. "Ele precisa apenas ter cuidado na hora de retirar refeição de dentro da mochila porque, afinal de contas, ali dentro estará quente, principalmente na superfície. Logo, nós fornecemos também uma luva de silicone para que esse manuseio seja feito. Mas, de qualquer forma, o risco de fogo não existe, porque nosso sistema não é incandescente. Além disso, o software que controla as funções da mochila não deixa a placa passar de 220ºC, evitando a combustão dos materiais da embalagem".

Ampliação do raio de entrega = aumento da clientela

Pompeu e Andrade afirmam que manter as refeições aquecidas e seu frescor por mais tempo, mesmo nos pratos mais complexos, é apenas um dos diferenciais das mochilas da Kenti. Segundo os sócios, outro benefício que o seu produto traz para os restaurantes é permitir a ampliação do raio de entrega dos estabelecimentos, já que não haverá mais risco de os pratos chegarem frios ou com o sabor comprometido mesmo em bairros mais distantes.

"Hoje, o raio médio de entrega praticado pelos restaurantes varia entre 5 km e 7 km. Com a nossa solução, entendemos que seja possível, no mínimo, dobrar esse raio. Mas é possível expandir isso ainda mais. Nós já fizemos testes onde deixamos uma refeição dentro da mochila da Kenti por 1h30 e experimentamos o prato para ver como ele estava e o sabor permanecia como se ele tivesse sido preparado há dois minutos", afirma Pompeu.

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"No entanto, há um fator que deve ser considerado que é o custo da entrega para lugares muito distantes", pondera Andrade. "Se o restaurante entregar em uma localidade demasiadamente longe, o valor do delivery pode impactar demais no preço e a operação deixa de compensar. Mas a temperatura da refeição e o seu sabor são mantidos mesmo nessas longas viagens".

Ainda assim os executivos afirmam que ampliar o raio de entrega para regiões mais distantes a partir da mochila da Kenti faz com que os restaurantes minimizem riscos ao não precisar abrir filiais nesses locais, caso a parcela de clientes não seja tão alta. "A nossa solução pode resolver o dilema de muitos donos de restaurantes. Eles podem ampliar a sua clientela para essas regiões mais distantes, sem ter de fazer um CAPEX gigantesco ao abrir uma unidade nesses locais, o que pode não justificar os custos".

Modelo de negócios e expansão

Por questões de logística e eventuais manutenções do equipamento, a Kenti optou por um modelo de aluguel de suas mochilas para os restaurantes. Inicialmente, a cobrança será feita por diárias, evoluindo posteriormente para cobrança por entrega, dependendo do volume de delivery que o restaurante tem.

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"Existem restaurantes em que o ticket médio é muito alto e, normalmente, o volume de entregas gira em torno de 10, 12 por dia, o que é muito baixo. Nesses casos, podemos cobrar mais", explica Pompeu. "Agora o estabelecimento que tem um ticket médio menor faz muito mais entregas. Logo, a nossa bag se movimenta muito mais. Aí podemos cobrar uma taxa menor. Mas, de forma geral, a cobrança média por entrega deve girar em torno de R$ 3, R$ 3,50. Mas o nosso range é de R$ 2,50 a R$ 6".  

Inicialmente, os sócios da Kenti dizem que as cobranças pelas entregas serão feitas na "confiança". Segundo Andrade, as mochilas serão deixadas nos primeiros restaurantes e um valor de entrega será combinado entre o estabelecimento e a foodtech. Mas as futuras versões da bag, a serem lançadas em novembro, trarão um sensor de GPRS que permitirá a Kenti saber quantas entregas foram feitas e cobrar por elas, a partir dos dados enviados por esse sensor a um software proprietário da startup. Haverá ainda uma terceira edição da mochila que terá inteligência de rotas e outros dados de BI.

Ainda com os trabalhos em estágio inicial, Andrade e Pompeu afirma que a Kenti está finalizando o primeiro lote de mochilas com o sistema especial de aquecimento nos próximos dias, com as entregas para os primeiros restaurantes programadas para a segunda quinzena de agosto. Serão 100 bags que entrarão em um programa piloto com 16 restaurantes localizados na cidade de São Paulo, em um quadrilátero que compreende parte das zonas oeste e sul da capital paulista. Até o fim do ano, está prevista a montagem de mais 350 mochilas para expandir esse quadrilátero — as peças são compradas de fornecedores locais e da China e a produção (e manutenção) ocorrerá em São Paulo e em Santa Rita do Sapucaí, cidade localizada no sul de Minas Gerais e conhecida por ser um competente polo tecnológico.

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Mas os planos de expansão da Kenti são ambiciosos, sendo que, apenas nesse primeiro momento, seus sócios investiram R$ 2 milhões para estruturar a startup e financiar a produção das mochilas. Segundo Armando Pompeu, o Brasil tem um milhão de restaurantes, e cerca de 400 mil deles são classificados como classes A e B. E são nesses nichos que os negócios da foodtech devem crescer inicialmente.

"Estabelecimentos que prezam pela qualidade, onde o dono e o chef se preocupam com os ingredientes que compõem seus pratos e por quanto tempo eles conseguem manter o frescor: esses são o público potencial inicial da Kenti", destaca o executivo. "Em nosso business plan, nós projetamos 52 mil mochilas espalhadas pelo Brasil. Parece muito, mas, para além dos restaurantes, há potencial para expandirmos para aplicativos de delivery e também dark kitchens. Se atingirmos esses dois setores, poderemos triplicar ou até quadruplicar nossa produção e nossa clientela".