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O que sabemos (e o que ainda não sabemos) sobre estrelas gigantes

Por| Editado por Patricia Gnipper | 16 de Maio de 2021 às 10h00

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Karen Teramura
Karen Teramura

Existem vários tipos de estrelas no universo, muitas não muito diferente do nosso Sol. Mas algumas são muito — muito — grandes, mas nem todas são densas. As gigantes vermelhas são relativamente leves, difusas e muito brilhantes, mas as gigantes azuis são muito mais quentes e massivas. Além disso, elas explodem. Pode parecer um destino trágico, mas temos sorte que isso aconteça, pois é assim que elementos da tabela periódica são espalhados pelo universo.

Os astrônomos sabem um bocado de coisas sobre as estrelas gigantes, mas ainda há muito para ser descoberto. Como sempre acontece na ciência, cada pergunta respondida traz novas questões e mistérios empolgantes, aguardando quem possa decifrá-los. Mas afinal, por que existem estrelas gigantes? Elas já “nascem” assim? E como “morrem”?

Para falar sobre essas dúvidas, o Canaltech conversou com Elvis Cantelli, mestre em Astronomia e doutorando pelo IAG-USP. Ele nos contou algumas das coisas que já se sabe sobre essas grandalhonas e o que ainda é um desafio para a ciência.

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Muito maiores que o Sol

Como o próprio nome sugere, essas estrelas são de proporções realmente gigantescas. A classe de estrelas gigantes mais comum é a de gigantes vermelhas, e o motivo é bem simples: elas são a fase final da evolução de qualquer estrela de baixa massa e de massa intermediária. Elas variam bastante de tamanho e podem ter entre dezenas a centenas de vezes o raio do Sol. Alguns casos excepcionais têm números que podem assombrar qualquer um — a hipergigante VY Canis Majoris, por exemplo, tem 2.100 vezes o tamanho do Sol em diâmetro!

Essas gigantes vermelhas já são velhas, estão em um estágio evolutivo mais avançado que as azuis. Elas ficam enormes nessa fase porque quando extinguem o combustível disponível no núcleo, começam a entrar no processo em que a queima de hidrogênio passa para uma casca externa. Com isso, o núcleo vai contraindo e as cascas externas se expandindo, como uma maneira de conservação do equilíbrio hidrostático. Como consequência, elas ficam mais frias e, por isso, ficam mais avermelhadas.

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Pois é, ao contrário do que poderíamos imaginar, o vermelho indica que a estrela é mais fria, e o azul aparece quando a estrela é muito mais quente. As gigantes azuis são objetos relativamente escassos, extremamente luminosos, pesados (com massa a partir de 8 vezes a do Sol), e com temperaturas que podem chegar a 20 mil K ou mais. Como são muito massivas, o tempo de vida delas é bem mais curto e geralmente encerram seu ciclo em uma explosão de supernova.

A principal diferença entre as duas é a fase evolutiva. Enquanto as vermelhas estão no final de suas vidas, as gigantes azuis ainda são jovens e estão na sequência principal, ou seja, queimando hidrogênio em seus núcleos. Mas toda a massa e calor dessas estrelas cria ambientes muito extremos, e elas encerram o ciclo bem mais rápido que as anãs. É justamente por essa rapidez com que encerram suas vidas que não vemos muitas delas por aí. Não que sejam raras, mas estão disponíveis em menor quantidade em relação às vermelhas.

Por outro lado, as gigantes vermelhas são muito mais comuns e bem compreendidas pelos astrônomos. Ainda bem, porque pode demorar bastante para que uma delas se forme. Por exemplo, o nosso Sol — que é uma anã amarela e um dia entrará na fase de gigante vermelha — já tem 4,5 bilhões de anos e ainda restam aproximadamente 5 bilhões de anos pela frente antes de se inchar e ficar grande o suficiente para engolir Mercúrio, Vênus, e talvez a Terra.

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Há outros tipos mais difíceis de se encontrar, como as gigantes brancas, que nada mais são do que um estágio evoluído das gigantes azuis. Ou seja, não são mais da sequência principal, pois a fusão do hidrogênio em seus núcleos cessou, e elas agora estão usando hélio como combustível.

O que não sabemos sobre estrelas gigantes

Com os instrumentos de última geração, como o CHEOPS, Hipparcos e Gaia (todos da ESA, a Agencia Espacial Europeia), o entendimento sobre elas evoluiu bastante. Por exemplo, até cerca de três anos atrás, não se sabia se planetas podem se formar na órbita de estrelas massivas, mas graças ao CHEOPS, sabemos que sim: o WASP-189 b foi descoberto em 2020 ao redor de uma gigante azul e é um dos mundos mais quentes e extremos já encontrados.

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Ainda assim, há muitas complicações no estudo dessas estrelas, o que é um grande problema, porque, para compreender os mecanismos da evolução estelar, é preciso saber o máximo possível sobre as mais massivas. Isso é fundamental para entender como funciona o universo, afinal, as estrelas são os “caldeirões” cósmicos, onde se fabrica grande parte dos elementos naturais da tabela periódica.

1. Distância das estrelas gigantes

Os astrônomos têm ótimos meios para calcular as distâncias de objetos no universo. O principal método para medir a distância entre a Terra e estrelas da Via Láctea é o paralaxe, que usa medidas trigonométricas. O conceito é simples: as estrelas próximas de nós parecem se mover mais em relação às estrelas de fundo mais distantes, que têm um movimento muito menor.

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Mas às vezes a tarefa pode não ser tão simples. Se as estrelas estiverem muito distantes, a paralaxe (o ângulo formado pelo movimento aparente) pode ser muito pequena para uma medição precisa. Cantelli nos explicou que “quando a gente vai para distâncias maiores, por exemplo cerca de milhares de anos-luz, a gente começa a encontrar só as gigantes. Quanto mais distante, menos estrelas anãs, e sobra as gigantes vermelhas e azuis. E quanto mais longe, menor a paralaxe, a estrela “dança” muito menos e o brilho fica mais fraco. Então temos mais dificuldade de dizer onde ela está exatamente”.

A menor paralaxe mensurável a partir do solo é cerca de 0,01 segundos de arco, então há um limite bem evidente de distância que podemos calcular com essa técnica. Por outro lado, as estrelas gigantes muito próximas, tem o problema o oposto. “É difícil até mesmo para o Gaia detectar porque elas formam um borrão luminoso no detector que atrapalha tudo”.

Essas dificuldades se tornam um grande problema para os que estudam as estrelas, porque é através da distância que os cientistas podem medir a luminosidade total emitida, a massa dos objetos que a orbitam, o tamanhos físico, entre outras características. Foi para resolver esse problema, entre outros, que a ESA enviou as missões Hipparcos e Gaia, planejadas para mapear a Via Láctea a partir da órbita terrestre.

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A Hipparcos obteve muito sucesso em medir as distâncias para um total de 100 mil estrelas, incluindo algumas bem mais distante do que poderíamos medir a partir do método paralaxe em solo. A Gaia, por sua vez, está gerando mapas da Via Láctea.

2. Temperatura das estrelas gigantes

Estrelas gigantes são um alvo comum dos astrônomos porque, dentro delas, literalmente, há detalhes importantes para serem revelados. Mas sempre houve dificuldade em estimar suas temperaturas, não só pelo problema da distância, mas também devido às suas atmosferas complexas e turbulentas.

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Sem medir temperatura com precisão, não há como dizer quando elas vão explodir em supernovas — e todos queremos saber quando finalmente poderemos testemunhar uma supernova. Recentemente, um estudo sugeriu que os astrônomos podem procurar linhas espectrais de ferro nas gigantes vermelhas como um bom indicador de temperatura delas. A certeza sobre a eficácia da técnica vai depender de futuros testes.

3. Velocidade radial

Outra dificuldade é quando se tenta determinar a velocidade radial, ou seja, velocidade de afastamento. A velocidade radial de uma estrela (ou de outro objeto celeste luminoso) é praticamente a única detectável em grandes distâncias e pode ser medida através do exame espectroscópio, isto é, da análise dos comprimentos de onda observados em seu espectro. Quanto maior for a resolução do espectro, maior será a precisão na medida da velocidade radial.

Mas no caso das gigantes azuis, a técnica pode ser mais difícil, tanto que “as velocidades radiais de estrelas gigantes azuis determinadas pelo Gaia são muito poucas", disse Cantelli. “Quanto mais frias, mais linhas espectrais você enxerga, e quanto mais quentes, ou seja, mais massivas na sequência principal [que é o caso das azuis, como vimos antes], as linhas vão sumindo e as que sobram não são muito boas para determinar velocidade radial”.

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4. Supergigantes e hipergigantes vermelhas

Existem estrelas hipergigantes que ultrapassam o diâmetro que vemos nas gigantes “comuns”, e ainda não está muito claro o porquê. Cantelli nos contou que “elas geralmente estão em um estágio transitório. As gigantes azuis passam por muitos processos, alguns que a gente não entende direito, inclusive processo de perda de massa, e muitas delas ficam “ping-pongueando” entre o ramo das gigantes e o da sequência principal azul. Então, a gente não entende muito bem como essas estrelas supermassivas se comportam”.

Entretanto, há algumas pistas. Cantelli disse que esse “ping-pong” transitório “tem muito a ver com a metalicidade delas. Quanto mais ricas em elementos, quanto maior a variedade química, mais elas ficam opacas e tendem a absorver mais luz. Então, o vento estelar tende a agir mais na matéria da estrela, então ela perde mais massa. A perda de massa também influencia muito no jeito que ela vai evoluir, então elas transitam muito entre o ramo da gigantes e o ramo superior da sequência principal”. “As hipergigantes vermelhas podem ser o estágio evoluído das por gigantes azuis”.

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Cantelli também nos lembrou que só pelo fato de serem gigantes ou hipergigantes vermelhas, já significa serem um estágio evoluído. No caso das hipergigantes, resta saber qual tipo de estrela evoluiu para se tornar o que elas são.

5. Como as estrelas gigantes se formam?

Eis uma pergunta que à primeira vista parece simples de responder, mas na verdade é motivo de debate na comunidade científica. Claro, já está bem compreendido que as vermelhas se formam após o ciclo de fusão nuclear de uma estrela de baixa massa ou de massa intermediária, mas as azuis têm uma história mais complicada. “O exato processo de formação não é muito bem compreendido, ainda tem algum debate”, disse Cantelli.

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Estrelas se formam em grandes nuvens de poeira e gás, conhecidas como regiões de formação estelar. Essas nuvens, em alguns pontos mais concentrados, iniciam um processo em que acabam colapsando em suas próprias gravidades. Isso nos leva novamente ã questão da metalicidade, segundo Cantelli. “Com maior riqueza de elementos químicos [nas nuvens], eles [os elementos] conseguem resfriar as coisas mais rapidamente, dissipando o calor para fora em forma de radiação, impedindo que coisas grandes se formem”.

Então, teoricamente, basta remover a metalicidade das nuvens para formar estrelas gigantes azuis. Só que essa situação é difícil de se encontrar no universo de hoje, porque as supernovas que já explodiram ao longo dos últimos 13 bilhões de anos costumam espalhar metais fundidos dentro de outras estrelas grandonas. Esses metais estão presentes em toda a parte, incluindo as regiões de formação estelar — ainda bem, pois é por isso que temos os metais aqui, em nosso planeta.

Por outro lado, no universo primordial, havia metalicidade muito baixa, “então era muito mais fácil formar estrelas gigantes, bem mais fácil”, explica Cantelli. “Você tinha matéria colapsando e não tinha uma pressão de radiação (que basicamente é temperatura expulsando para fora). Os elétrons dos átomos não iam interagir com aquela reação tão fortemente, só tinha basicamente hidrogênio e hélio. Então você tem muito menos estados possíveis de energia interagindo com essa radiação que vem das partes mais quentes e as coisas colapsam para dentro de uma maneira mais fácil”.

Hoje em dia com metalicidade mais alta, “é um pouquinho difícil a gente conseguir dizer como que vai se formar uma estrela massiva, de certa forma a gente assume que é um processo de ‘pura sorte’, porque a gente sabe exatamente quais são as perfeitas condições exatas”. Por sorte, Cantelli quer dizer que se trata de um acaso, uma condição muito específica, meio que acidental, talvez uma perturbação na nuvem, “para conseguir ativar algum processo que calhe de formar estrelas de alta massa”.

Segundo Cantelli, “tem muitas simulações que mostram como isso acontece, mas não é exatamente compreendido como elas se formam. Não tem um processo totalmente estabelecido de como é que se forma gigantes [azuis] em comparação ao processo que formam as estrelas de baixa massa”.

Hipóteses não faltam, contudo. Alguns cientistas suspeitam que estrelas massivas nascem quando objetos menores colidem. A maioria das estrelas grandes vive em aglomerados, e quanto mais estrelas um aglomerado tiver, mais massivas elas serão. Mas por quê? É pouco provável que as estrelas gigantes estejam colidindo entre si, mas muitas delas têm perto de si outras bem menores, de pouca massa. Pode ser que elas sirvam de alimento para as gigantes crescerem.

Essa hipótese levanta outras questões, como o fato de nem todas as estrelas gigantes pertencerem a aglomerados. Cantelli nos disse, entretanto, que essas gigantes azuis errantes muito provavelmente se formaram em aglomerados e foram expulsas por um “chute” gravitacional. “Elas podem ser ejetadas pelas próprias perturbação dinâmicas. Se em sistemas de três corpos já é não dá para medir o que vai acontecer, imagina um sistema de 100 corpos, sistema de 1000 corpos, é impossível saber o que vai acontecer”.

6. Quão massiva pode ser uma estrela gigante?

Essa é uma pergunta que começou a ser melhor respondida pela astronomia moderna. No início do século XX, alguns astrônomos disseram ter descoberto estrelas com 2.500 massas solares. No entanto, os astrônomos hoje sabem que as estrelas ultramassivas medidas naquela época são, na verdade, aglomerados com muitas estrelas menores bem pertinho umas das outras. Ou seja, os cientistas estavam medindo a massa total dos aglomerados porque não havia instrumentos sensíveis o suficiente.

Ainda assim, determinar o peso das estrelas muito massivas é difícil. Calcula-se através de grandes aglomerados que, estatisticamente, não existe nenhuma estrela com uma massa maior que 150 a 200 massas solares. Os astrônomos conseguiram medir a massa de algumas delas através da observação direta das órbitas de estrelas binárias, o que é o método mais confiável por enquanto.

Além da observação direta, os astrônomos também tentam encontrar algum limite físico teórico além do qual nenhuma estrela pode atingir antes de explodir em uma supernova. Essa questão permanece em aberto, mas se esse limite existir, a próxima pergunta será “por quê?”

Estrelas maiores que o Sol

Agora que já vimos o quão as estrelas gigantes são misteriosas para a ciência, vamos conhecer algumas das maiores já descobertas. Em comparação com os planetas do nosso “bairro cósmico”, o Sistema Solar, o Sol é enorme e contém 99,8% da massa total do nosso sistema. Ele tem aproximadamente 1,4 milhão de km de diâmetro, equivalente a quase 110 vezes o tamanho do nosso planeta — caberia de um milhão de “Terras” dentro do Sol. Apesar disso, ele é uma estrela pequena, uma anã amarela.

Claro, não subestimamos o nosso Sol. A cada segundo, ele funde aproximadamente 600 milhões de toneladas de hidrogênio para hélio, o que resulta em toneladas de matéria em energia. Mas em comparação com as gigantes e supergigantes, ele não está nem perto de ser uma das mais “parrudas” do universo. Ao menos não por enquanto — quando ele chegar ao fim de seu ciclo de fusão nuclear, se tornará uma gigante vermelha!

Obviamente é impossível dizer quais são as maiores estrelas do universo, pois não podemos conhecer todas elas. Mas daquelas que podemos distinguir isoladamente, há algumas peso-pesado que parecem insuperáveis. Eis algumas delas.

1. VY Canis Majoris

Essa é uma hipergigante vermelha tão brilhante quanto 300 mil sóis, e com 2.100 vezes maior que o Sol em diâmetro. Ela é tão grande que caberia quase três bilhões de planetas iguais à Terra. Como vimos nesta matéria, a VY Cma está nos estágios mais evoluídos e não deve durar muito mais tempo. Aliás, sua massa é depositada em uma galáxia próxima a ela.

Essa estrela já foi muito mais brilhante no céu noturno, há cerca de 200 anos, mas desde então é muito difícil observá-la. no início deste ano, pesquisadores usaram o Telescópio Espacial Hubble para ver como um objeto desses poderia sumir do mapa celeste, e descobriram enormes nuvens de poeira denunciando os estágios finais da estrela. Pode ser que ela exploda, ou que simplesmente colapse direto em um buraco negro.

2. WOH G64

É outra hipergigante vermelha e possui um raio correspondente a mais de 1.500 vezes o do Sol. Anteriormente, a medição era de 2 mil vezes o raio do Sol, o que mostra como é difícil fazer essas medições com precisão. Além disso, ela não chega a ter 10 milhões de anos mas está curiosamente perto do fim de sua vida.

3. V354 Cephei

Essa estrela está classificada na categoria de supergigante, também possui um aspecto avermelhado, e localiza-se na Via Láctea a cerca de 9.000 anos-luz de distância da Terra. Seu diâmetro é 1.520 vezes maior que o do Sol.

4. NML Cygni

Outra hipergigante vermelha, uma das maiores conhecidas com cerca de 1.650 raios solares. É também uma das supergigantes mais luminosas e fica a cerca de 5.300 anos-luz da Terra.

5. UY Scuti

Essa supergigante vermelha variável pulsante está a 5.100 anos-luz da Terra e já foi considerada a possível maior estrela conhecida, com raio entre 1.708 e 192 raios solares. Entretanto, estimativas mais recentes, baseadas em uma determinação direta da distância, dão um raio menor de 755 vezes o raio do Sol.

6. R136a1

Essa estrela não é tão grande quanto as mencionadas acima — tem apenas 30 vezes o raio do Sol. Entretanto, esta gigante azul é a estrela mais densa já observada, com massa 265 vezes maior que a do Sol. Com essa relação tamanho e massa, conclui-se que ela tem volume 27 mil vezes maior que o do Sol.