Anãs marrons podem orbitar gigantes vermelhas de brilho variável
Por Daniele Cavalcante • Editado por Claudio Yuge |
Embora as estrelas pareçam piscar no céu, nem todas têm brilho variável. O que vemos é apenas o efeito das turbulências na atmosfera que desviam ligeiramente a luz das estrelas antes que chegue aos nossos olhos. Mas algumas são de fato variáveis, ou seja, mudam de intensidade no brilho ao longo do tempo, de forma periódica ou não. Os astrônomos ainda não sabem explicar a variação de gigantes vermelhas de longos períodos, mas um novo estudo aponta para uma direção onde o mistério talvez seja resolvido.
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Há muitos tipos de estrelas variáveis, como as pulsares, eruptivas, rotacionais, binários eclipsantes, entre outros. Cada uma dessas categorias explica por si só quais mecanismos levam à variação no brilho. E há estrelas muito específicas dentro do grupo das pulsares — aquelas que apresentam variação de longo período. Elas são frias, gigantes ou supergigantes, e suas variações têm períodos de apenas alguns dias ou de até mais de mil dias. Entre elas, existem as gigantes vermelhas de pequena amplitude (OSARGs, da sigla em ingles).
Os astrônomos tentam há tempos encontrar uma explicação para as OSARGs, sem obter muito sucesso. Há algumas hipóteses, que incluem interações em sistemas binários, formação de poeira, rotação, ou oscilações não radiais, mas todas elas apresentaram problemas que não puderam ser solucionados. De acordo com uma nova análise, entretanto, essas misteriosas variações de brilho não são causadas por processos internos da estrela — como ocorre nas estrelas de períodos regulares como a Betelgeuse, por exemplo; ela tem vários ciclos de brilho regulares causados por ondas acústicas que nascem em seu próprio interior.
Gigantes vermelhas que apresentam oscilações de brilho em torno de seis magnitudes (o que é uma variação muito alta!) também são conhecidas como Variáveis de Longo Período, ou LPVs. O intervalo de brilho entre o máximo e o mínimo é chamado de "amplitude", enquanto o período é o intervalo entre dois máximos consecutivos. Por exemplo, algumas gigantes ou supergigantes têm períodos de cerca de cem dias, ou seja, esse é o tempo que elas levam para sair do brilho máximo, chegar ao mínimo e voltar para o pico.
Até aqui falamos de variações primárias, mas há variações secundários, que são as mais misteriosas. Elas podem ter mais de dois mil dias de duração e parecem estar relacionadas com outros fatores que não envolvam o interior da própria estrela variável. Os astrônomos detectaram variações de longos períodos secundários em uma boa quantidade de estrelas gigantes vermelhas, e o novo estudo reforça a ideia de que o fenômeno não é resultado de alguma oscilação interna das estrelas (que é o caso da Betelgeuse), mas sim por um rastro de poeira deixado por uma estrela companheira.
Para chegar a essa conclusão, a equipe liderada por Igor Soszyński, da Universidade de Varsóvia, na Polônia, vasculhou dados de pesquisa disponíveis para comparar observações ópticas (de luz visível) e de infravermelho médio de 16 mil gigantes vermelhas. Dentre elas, cerca de 700 estrelas apresentaram uma curva de luz infravermelha bem definida, ou seja, eles puderam ver um gráfico de como a luz dessas estrelas mudou ao longo do tempo. Ao comparar as curvas de luz óptica e infravermelha dessas 700 estrelas, eles encontraram uma surpresa: algumas tiveram uma segunda variação de brilho logo após a primeira.
O esperado em uma análise como essa é que os astrônomos encontrem algumas estrelas variáveis que apresentassem um grande “mergulho” no gráfico, indicando que o brilho delas diminuiu drasticamente — porque é isso o que as OSARGs fazem —, tanto na luz visível quanto no infravermelho. De fato, eles encontraram essas estrelas, mas também encontraram outras gigantes vermelhas — metade das 700 variáveis detectadas — com um segundo “mergulho” nos gráficos. Essa queda secundária é mais rasa que a primeira, e só aparece na luz infravermelha.
Para a equipe, essa é uma pista importante para entender o que causa a variação prolongada secundária. É que a luz infravermelha é frequentemente produzida pela poeira interestelar. Essa poeira absorve a luz de estrelas localizadas atrás dela (em relação a nós) e a reemite em comprimentos de onda mais longos. Por isso a variação secundária não pode ser vista nos dados de luz visível. Mas de onde vem essa poeira? Os astrônomos suspeitam ela seja espalhada por uma segunda estrela na órbita da gigante vermelha variável de longo período secundário.
Se este for o caso, essa classe peculiar de estrelas trata-se, na verdade, de um sistema binário em uma verdadeira dança orbital que resulta em uma longa trilha de poeira sendo arrastada ao longo da órbita. Conforme a estrela menor passa entre a gigante e a Terra, deslocando-se para o lado, nossos telescópios são capazes de ver a luz infravermelha atravessando a poeira que é arrastada pela gravidade do objeto menor, mas esta luz diminui quando a companheiro binária se mover para trás da gigante. Essa é a possível explicação para a variação secundária.
De acordo com a análise da equipe, as amplitudes das curvas de luz sugerem que a companheira é uma estrela de massa muito baixa ou uma anã marrom. Se isso for verdade para todas as variáveis secundárias detectadas, as anãs marrons podem ter começado suas vidas como exoplanetas menores, mas obtiveram material deixado para trás pelas estrelas gigantes vermelhas. Por isso os pesquisadores afirmam que essa descoberta pode permitir que estrelas gigantes de longo período secundário sejam usadas como rastreadores para estudar a população planetária da Via Láctea.
Fonte: Science Alert