6 curiosidades surpreendentes sobre neutrinos, as "partículas fantasmas"
Por Daniele Cavalcante |
Além de produzir calor e luz, o Sol também emite coisas menos perceptíveis, como os neutrinos — apelidados de “partícula fantasma” por se tratarem de partículas que quase não interagem com a matéria. Eles estão por toda a parte, aos milhares, e até mesmo aqui na Terra. Mas não podemos vê-los ou senti-los, embora estejam atravessando nossos corpos todos os dias.
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Contudo, os cientistas podem detectá-los e algumas coisas surpreendentes já foram descobertas sobre eles. Por exemplo, o fato de que todos os neutrinos do Sol são produzidos em seu núcleo, mais precisamente através das reações nucleares. Essas partículas fantasmas também existem em outras estrelas e percorrem o universo quase sem nenhuma interrupção, carregando consigo uma quantidade enorme de informações sobre o cosmos.
Há muitas outras curiosidades impressionantes sobre neutrinos, tais como:
1) Neutrinos carregam 1% da energia do Sol
Os fótons — a partícula que carrega a força eletromagnética — também são produzidos em estrelas como o Sol, mas há grandes diferenças entre eles e os neutrinos. Os fótons são responsáveis por nos fornecer, entre muitas outras coisas, a luz, mas primeiro eles ficam presos no interior da estrela. Em uma tarefa que pode levar mais de 100.000 anos, eles são continuamente emitidos e então absorvidos pelos átomos do Sol e, cada vez que isso acontece, eles perdem energia.
Já os neutrinos são disparados para fora da estrela quase instantaneamente assim que se formam. Isso ocorre porque eles quase não interagem com outras partículas, então podem atravessar quase todo tipo de matéria com muita facilidade. Assim, eles deixam o Sol em menos de três segundos após serem gerados, quase à velocidade da luz, e se espalham pelo cosmos, sem que quase nada seja capaz de mudar suas rotas.
Com isso, eles também são capazes de carregar muito da energia solar que os gerou. Lembra que os fótons perdem energia enquanto estão presos na estrela? Isso não ocorre com os neutrinos! Por isso, eles são bastante energéticos.
2) Existem muitos neutrinos na Terra
A cada segundo, cerca de 70 bilhões de neutrinos passam por cada centímetro quadrado de nosso planeta. Isso significa que essa quantidade de partículas fantasmas estão passando pela sua unha, sem serem detectados, neste exato momento. Quando você terminar de ler essa frase, o número já terá mais que triplicado.
Se você ainda não havia entendido o apelido de “partículas fantasmas”, talvez agora ele já esteja fazendo sentido. Você não sente nada, mas eles estão passando pelo seu corpo. A única maneira de detectá-los é através de instrumentos científicos muito sensíveis.
3) Vemos ⅓ da taxa de neutrinos produzidos no Sol
Podemos detectar uma boa quantidade de neutrinos porque eles produzem um tipo de radiação chamada radiação Cherenkov. No entanto, o fluxo total de neutrinos detectados é apenas cerca de 1/3 da quantidade que os astrônomos calculam que seja produzida no Sol.
Para detectar essas partículas, são usados grandes tanques projetados com materiais capazes de interagir eles. Esses tanques são cercados por tubos fotomultiplicadores sensíveis aos sinais secundários produzidos por uma interação do neutrino com essa matéria especial. O detector deve ser bem protegido para que o sinal seja maior que qualquer ruído externo, por isso geralmente eles ficam enterrados no subsolo.
Para detectar pelo menos 50% da taxa dos neutrinos produzidos pelo Sol, seria preciso um detector de chumbo com um ano-luz de espessura.
4) Os neutrinos chegam com espectros de energia discretos e específicos
Existem diferentes processos nucleares que podem acontecer no interior de uma estrela. Um deles é a cadeia próton-próton, e a maioria dos neutrinos é produzida nesse processo. Entretanto, outros processos também geram neutrinos, e deixam suas assinaturas específicas no espectro de energia dessas partículas. A vantagem disso é que, analisando essas assinaturas, os cientistas podem saber o que está ocorrendo no interior do Sol.
Um exemplo prático dessa capacidade foi a primeira detecção direta da presença do ciclo carbono-nitrogênio-oxigênio (ou CNO, um processo diferente da cadeia próton-próton, que também ocorre em estrelas como o Sol) na fusão nuclear de nossa estrela. Essa descoberta foi anunciada em novembro deste ano e só foi possível através da análise dos neutrinos.
Em outras palavras, ao detectar os neutrinos que passam pela Terra dia e noite (não faz muita diferença o horário quando o assunto é produção e emissão de neutrinos), os cientistas também podem saber a diferenças entre eles. É possível até mesmo produzir uma imagem do núcleo solar através de uma análise das assinaturas nas partículas fantasmas. Então, pesquisadores poderiam descobrir como é o interior de qualquer estrela — desde que consigam capturar os neutrinos que ela produz dentro de um detector.
5) Neutrinos determinam o tamanho do núcleo do Sol
Várias reações ocorrem dentro do Sol, com diferentes temperaturas e densidades. Como seria o núcleo solar? Qual o seu tamanho? Bem, é impossível enviar uma sonda que possa entrar lá e sobreviver para nos contar a história, mas é possível descobrir muita coisa medindo o fluxo de neutrinos em diversas energias.
Isso significa que, além de saber o tipo de reação que acontece no núcleo da estrela, os cientistas também podem inferir o tamanho e a temperatura do núcleo solar. Com base nesse tipo de estudo, pode-se dizer que as reações nucleares ocorrem apenas nos 20-25% mais internos do Sol. Neutrinos são realmente uma ótima ferramenta para estudar o nosso Sol!
6) Aviso de “apocalipse solar”
Além de nos dizer o que está acontecendo no Sol, os neutrinos podem nos revelar o que vai acontecer no futuro no exterior da nossa estrela. Imagine que o Sol pare repentinamente sua fusão nuclear. Isso significaria sua morte — e a do nosso planeta também. Mas a gravidade e a luz solar ainda permaneceriam inalteradas por centenas de milênios. Lembra que os fótons demoram muito para sair do núcleo solar? Isso significa, literalmente, o tempo que a luz leva para ser emitida do Sol.
Ou seja, no núcleo da estrela, hoje há fótons o suficiente para os próximos milhares de anos. No entanto, se a fusão nuclear parar de acontecer agora, o fluxo de neutrinos mudaria imediatamente. Os cientistas que trabalham em detectores de neutrinos saberiam o que aconteceu e descobririam que a atividade nuclear do Sol foi interrompida. Ficaríamos sabendo do apocalipse solar em apenas 8 minutos, mas ele aconteceria realmente apenas depois de alguns milênios.
Hoje, existem diversos detectores de neutrinos instalados em toda a superfície da Terra, e agora você já deve ter compreendido a importância de estudá-los profundamente. Esses detectores estão prontos para encontrar qualquer alteração na atividade nuclear do Sol, servindo como primeiro sistema de alerta da humanidade para nos avisar dessa mudança antes que ela venha através de luz ou qualquer outro indicador. Por isso, os neutrinos são, atualmente, a maior ferramenta para acessar os segredos mais internos do nosso Sol.
Fonte: Starts With a Bang