Posso usar a marca do concorrente nos links patrocinados dos sites de busca?
Por Izabelly Karoline Romão |
*Coautoria de Bruna de Paiva Araujo
Nos últimos anos, a internet ganhou uma relevante proporção na disseminação de informações do mundo, conectando pessoas e gerando oportunidades comerciais. Ela começou a ser vista como uma ferramenta indispensável de publicidade e de marketing para pequenas, médias e grandes empresas.
A principal ferramenta de marketing digital de que as empresas podem se beneficiar hoje são os “links patrocinados”. Este método de fazer publicidade pode ser considerado um leilão em que quem paga mais tem mais destaque nos sites de busca como Google, Bing, Yahoo!, entre outros.
As empresas podem comprar nos sites de busca qualquer palavra ou marca que sejam do seu interesse. Essa palavra-chave servirá para criar o anúncio, ou link patrocinado.
A partir das pesquisas dos consumidores, os sites de busca geram dois tipos de retornos: os resultados orgânicos e uma lista de ofertas com links patrocinados, que são um tipo de publicidade paga.
As principais características dos links patrocinados são:
- A palavra anúncio antes da URL do site;
- o anunciante só paga quando um usuário clica no anúncio, um modelo de negócio conhecido como CPC (custo por clique);
- o anunciante pode decidir quanto quer investir por dia;
- O anúncio pode ser alterado a qualquer momento, assim como o valor investido.
O link patrocinado é considerado uma forma de marketing passivo e não invasivo, já que o consumidor é atingido apenas no momento em que ele busca um determinado produto ou serviço. Vejamos um exemplo:
Essa inovadora ferramenta de compra de palavras-chaves gera tráfego aos sites de forma qualificada e eficiente, o que fortalece a marca de forma mensurável, já que você sabe quantos consumidores clicaram no seu anúncio.
Todavia, existe uma discussão sobre a compra da marca de terceiros devidamente registrada, como palavra-chave, se tal conduta afeta princípios e diretrizes marcárias previstos na lei 9.279/96.
Isto porque o artigo 129 da lei aponta que aos detendores da propriedade da marca adquirida por meio de registro válido expedido pelo órgão responsável, como o Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), é assegurado o uso exclusivo em todo o território nacional. A legislação também prevê o uso da marca em papéis, impressos, propaganda e documentos relativos à atividade do titular.
Assim, quando uma empresa usa indevidamente como palavra-chave a marca de terceiro que é titular de direito, com o intuito de obter o privilégio, ou seja, para se destacar na posição dos sites de buscas e, consequentemente, desviar clientela, viola normas de ordem do Código de Defesa do Consumidor e Propriedade Intelectual, uma vez que este ato induz o consumidor a erro.
Quanto à ofensa do Código de Defesa do Consumidor, que tem como um dos princípios coibir abusos praticados no mercado de consumo, concorrência desleal e utilização indevida da marca e nome comercial caracterizam a ilegalidade quando o produto ou serviço buscado por meio da palavra-chave não é o esperado pelo consumidor, ou seja, publicidade enganosa. A prática é totalmente vedada, conforme art. 37, §1°.
O fato de usar ou imitar expressão ou sinal de propaganda de terceiros com o intuito de criar confusão entre os produtos ou estabelecimentos e, consequentemente, obter vantagem com o prestígio superior da marca concorrente é caracterizado como crime de concorrência desleal, previsto na Lei 9.279/96.
Assim, o titular da marca devidamente registrada que identificar que algum concorrente tem se utilizado de palavras-chaves e entender que houver prejuízos causados em decorrência do ato reputado como ilícito poderá socorrer-se ao judiciário para requerer o ressarcimento das perdas e danos causados à marca.
São recorrentes os casos de judicialização por conta de utilização indevida da palavra-chave. Na maioria dos casos, quando o direito é efetivamente comprovado, é restabelecida a proteção da marca e determinada a vedação da concorrência desleal e a condenação em danos morais.
Vejamos como se posicionou o Tribunal de Justiça de São Paulo em um processo judicial que tratava sobre o tema em debate:
PROPRIEDADE INDUSTRIAL. MARCA. VEICULAÇÃO PUBLICITÁRIA. LINK PATROCINADO DO GOOGLE. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DA MARCA DA AUTORA. REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. A ré, ao cadastrar seu anúncio junto ao Google, em link patrocinado, citou como palavra-chave de busca a marca "Max Fama", registrada em nome da autora. Assim, por ocasião de buscas feitas por usuários, que citavam a palavra "Max FAm", constava-se o registro da autora, titular da marca, e, em destaque, como um dos primeiros apontamentos, a publicidade da ré, que buscava atrair, portanto, clientela antes direcionada exclusivamente à autora. Ao pretender que sua empresa estivesse atrelada ao signo da autora no momento da veiculação de anúncio, a ré, além do uso indevido da marca da autora, cometeu desvio de clientela, o que não pode ser admitido, ainda que tenha vigência o princípio da livre concorrência. Acrescenta a doutrina referida que para caracterizar a concorrência desleal é preciso que haja a quebra da competitividade pela busca desleal da clientela alheia. Ambas as partes atuam no mesmo segmento mercadológico e, seguramente, o uso indevido da marca pela ré induziu clientes a erro. Danos morais. Não se cuida de admitir a indenização punitiva, mas, em face da realidade que se apresenta, deve-se admitir que o dano efetivamente ocorreu pelo ato de concorrência desleal. Os atos ofendem direitos intangíveis da empresa, como a clientela, independentemente da prova de qualquer diminuição patrimonial da vítima. Outra solução assegura o que a doutrina moderna denomina ilícito lucrativo. Recurso não provido. (TJ-SP 10941511020158260100 SP 1094151-10.2015.8.26.0100, Relator: Carlos Alberto Garbi, Data de Julgamento: 27/11/2017, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 27/11/2017)
É válido ressaltar que, antes de recorrer ao judiciário, a fim de impedir que o terceiro continue a praticar a ilegalidade e buscar ressarcimento dos danos ocasionados, é importante que seja analisado o caso concreto e as provas que serão juntadas ao pedido, principalmente quanto à titularidade da marca e a comprovação da utilização indevida da palavra-chave alegada, sob pena de ter seu pedido julgado improcedente por falta de comprovação mínima.
Por isso, é importante ter o registro da marca junto ao INPI para comprovar a titularidade, bem como monitorar constantemente o uso das palavras-chaves, com o objetivo de comprovar a utilização enganosa.
*O texto tem a coautoria de Bruna de Paiva Araujo, atual head of legal e DPO na startup Volanty, ex- head of legal da startup Peixe Urbano/Groupon.