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Crítica Uma Família Feliz | Suspense revira o estômago apesar das pontas soltas

Por  • Editado por  Durval Ramos  | 

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Divulgação/Pandora Filmes
Divulgação/Pandora Filmes

Quem está acostumado a ler Raphael Montes já sabe que os seus livros sempre terminam com um final surpreendente e agridoce, seja pela crítica social ácida ou por aquele personagem querido se revelar um grande vilão. Em Uma Família Feliz, filme que estreia no dia 4 de abril, não é diferente. O texto espreme o espectador em uma tensão crescente até culminar num desfecho inesperado, porém pouco crível.  

Na trama, Eva (Grazi Massafera) é uma mulher bonita, alta, loira e de cabelos longos. Vive com seu marido Vicente (Reynaldo Gianecchini) e as duas filhas gêmeas dele — Ângela e Sara — em um apartamento localizado no Blue Paradise, um dos condomínios mais luxuosos do Rio de Janeiro. Quando ela engravida e dá à luz a Lucas, o caçula faz da sua vida um verdadeiro inferno, seja porque não para de chorar um minuto ou porque não aceita seu peito como alimento.

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Com cenas cotidianas e ordinárias, o filme convida o espectador a fazer parte daquela família, mas também mostra que há algo de podre no reino do Blue Paradise. Há uma certa tensão no ar, Eva está sobrecarregada, Vicente é um pai perfeito, mas que não enxerga os problemas da esposa e, para piorar, um dia o bebê e as gêmeas aparecem machucados.

Ninguém sabe o que aconteceu e, nessa altura do filme, a construção bem feita dos personagens leva o público acreditar que Eva está louca e pode ter espancado os filhos. A atuação de Grazi é impecável e faz toda diferença em cena. Ela oscila entre a falsa alegria de estar rodeada de ricos hipócritas e o desespero de não se lembrar do que fez.

Mas como, nas obras de Montes, nem tudo é o que parece, a trama dá uma virada interessante até entregar o verdadeiro culpado. Nesse ponto, é preciso elogiar também o jogo de câmeras. Usando ângulos fechados para reforçar as expressões faciais de Eva, as câmeras brincam com os personagens como se estivessem fazendo um julgamento de suas atitudes. 

Com um elenco enxuto, a história não fica rodando em si mesma e constrói uma tensão quadro a quadro para o ápice final. O desfecho, inclusive, é daqueles que ficam na cabeça do espectador por horas, quem sabe dias. O problema é que quando você pensa demais, acaba descobrindo que ele é pouco verossímil.

Sem dar spoilers para não estragar toda a experiência do filme, o que se pode dizer é que o culpado não teria como machucar as duas gêmeas da maneira que fez. Outras pontas soltas são o fato de uma delas ficar calada perante a injustiça que Eva sofre. Na vontade de surpreender o público, Montes deixou furos que incomodam demais.

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Um filme muito aquém ao livro

Além de escrever o argumento e o roteiro de Uma Família Feliz, Raphael transformou a história em livro e, claro, pôde esmiuçar melhor a trama e os personagens. O problema é que, se o público seguir a sua recomendação de ler o livro e depois assistir ao filme, provavelmente terá a impressão de que o longa é muito pobre perto da riqueza de detalhes da publicação.

Sem ingenuidades aqui, é óbvio que um filme de quase duas horas nunca conseguiria abraçar a complexidade de um livro, mesmo que o roteiro do longa tenha sido escrito antes. O problema é que faltam partes importantes da história como a briga de Eva e Isabela, a empregada negra que trabalha na casa, além da relação dela com a mãe e a briga com as gêmeas antes delas aparecerem machucadas. Tudo isso, ajuda a compor a pseudo-loucura da protagonista e fez muita falta em cena.

São esses detalhes que impedem o longa de ser perfeito, mas não tiram dele o mérito de ser bom. A direção do veterano José Eduardo Belmonte dá o tom da obra, embora às vezes exagere em certos momentos como se quisesse enfiar a tensão goela abaixo do público. Ainda assim, vale o ingresso do cinema e a discussão na mesa de bar.