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Crítica | Megatubarão – Meg: o ilusionista fascista

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Warner Bros
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Em 1975, Steven Spielberg lançava aquele que é considerado pela maioria dos historiadores do cinema como o primeiro blockbuster de Hollywood. Essa classificação é tão verdadeira que Tubarão não só ganhou sequências – péssimas – como provocou a criação de um subgênero: os filmes de tubarão. Enquanto em 1969, seis anos antes do lançamento do clássico, outro filme fez um pequeno rebuliço no mundo do cinema: Sharks! (no original), de Samuel Fuller – que utilizou tubarões de verdade durante as filmagens e, devido a um erro, um dublê foi morto –, após 1975 os reis dos mares ganharam notoriedade, ainda mais com a representação musical icônica criada por John Williams.

Antes de seguir adiante, cuidado. Esta crítica pode conter spoilers!

Meg e o seu show de mágica

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Dentro desse contexto e à primeira vista, Megatubarão surge com uma qualidade estética de muita eficiência. Logo em seus primeiros minutos, o 3D é bem utilizado ao procurar imergir o público dentro da água. Na sequência, as tomadas revelam as locações que cercam o laboratório superbem equipado e, todas elas (sem exceção mesmo), trazem gags (um assunto visual que surgiu como piada no cinema e que pode revelar algo específico dentro de um filme) que remetem a barbatanas de tubarões. O detalhe é que essas gags são imensas; são formações rochosas, montanhas, estruturas de aço. E todas saindo de dentro do oceano – adiantando a grandeza do animal que recebeu o carinhoso apelido de Meg no título original.

A premissa do filme é simples. Aliás, não poderia ser complexa porque esse neto do filme de Spielberg não tem vergonha de se assumir como o é: um filme B que difere dos primeiros filmes dessa categoria “apenas” pelo orçamento – que girou em torno dos 150 milhões de dólares. Para alcançar esse feito, Megatubarão conseguiu focar sua atenção no que realmente importa em meio ao seu roteiro tão previsível: no bicho. O diretor, inclusive, parece ter estudado o filme de 1970, pois não revela a sua estrela apressadamente. O megalodonte – que se pensava extinto há mais de dois milhões de anos – ataca e desaparece como em um show de mágica, sem ser visto por mais que tenha 20... 30 metros de comprimento.

Procurando Nemo com brutalidade

E, quando aparece pela primeira vez, não é uma aparição qualquer: reconstruindo uma cena clássica da animação Procurando Nemo (cena presente em cartaz oficial), o Meg surge atrás da pequena Meiying (Shuya Sophia Cai) assim como o Bruce surge para Marlin e Dori. A comparação é inevitável e certeira: o tamanho de um peixe-palhaço em relação ao grande tubarão-branco é, de fato, proporcional à relação entre uma criança e um megalodonte.

Mas é a partir da descoberta – brutal pela cena que se segue – que o filme abre alas para a sua predisposição a Sharknado. Sem construir personagens interessantes, a verdade é que a torcida passa a ser do monstro e toda a ameaça sofrida por aqueles que caçam a criatura transforma-se em um apelo para que sejam devorados, enfraquecendo o todo. Não é difícil, por exemplo, torcer para que Suyin (Bingbing Li), dentro de uma gaiola, termine de ser engolida para se ver uma sequência que poderia remeter a Pinóquio – sendo Suyin o Gepeto da vez e o herói, Jonas (Jason Statham), funcionando como uma espécie de boneco de madeira inexpressivo que quer ser humano.

É ainda um pouco assustador saber que a história assistida é baseada em um livro (escrito por Steve Alten) e que, entre os três roteiristas, está Dean Georgaris, que fez um excelente trabalho (também em parceria) para o filme Sob o Domínio do Mal (2004), dirigido por Jonathan Demme (de O Silêncio dos Inocentes e Filadélfia). Mas é só voltar um pouquinho no tempo (um ano) e encontrar seu nome no roteiro de Lara Croft: Tomb Raider – A Origem da Vida, escrito sozinho por ele.

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Saindo das profundezas like a facista

A verdade é que Megatubarão é um filme pretensioso financeiramente e no soft power chinês e completamente despretensioso em sua narrativa. Mesmo sendo mais um que existe devido à ambição da China por uma colonização cultural (como tantos recentes – como o bizarro Rota de Fuga 2), ele diverte através das situações cômicas que diminuem qualquer terror. Não basta ser residente de um subsolo do assoalho mais profundo de um oceano, tem que passar por uma densa nuvem climática a mais de 10 quilômetros de profundidade, ter alterada toda a pressão atmosférica condensada em si a milhões de anos e ir até uma praia exterminar figurantes que passam um feriado tranquilo.

Por outro lado, essa ascensão das profundezas para a superfície de um ser tão agigantado, um monstro que ressurge para destruir à força tudo o que se move e ilumina pode remeter drasticamente à ascensão atual do fascismo ao redor do mundo. Mas talvez seja melhor parar por aqui, porque Megatubarão está aí para entreter com alguma eficiência os amantes do subgênero e, mesmo que queira se inserir em uma realidade, está bem longe – profundamente longe – de ter alguma relevância nesse sentido.