Publicidade

Crítica | Medo Profundo 2: Abismo é terror pipoca passageiro

Por| 14 de Agosto de 2020 às 14h25

Link copiado!

Thrills & Spills
Thrills & Spills

Às vezes, causar a sensação de medo no público pode ser mais fácil do que construir alguma empatia para com os personagens. O problema, por isso, acaba sendo a criação de uma espécie de paradoxo. Isso porque, para um filme de gênero causar um sentimento mais verdadeiro, é quase que imprescindível construir alguma relação dos personagens com o espectador. Medo Profundo 2: Abismo, nesse sentido, parece manter, do início ao fim, seu potencial engasgado.

É uma sensação estranha: existe uma linha básica – mas eficiente – que conduz o filme. O roteiro de John Ridley (que já escreveu para, pelo menos, 20 séries) e Sarah Smith (também especialista em séries, com quase o mesmo número) utiliza clichês com alguma versatilidade. Tudo o que é visto parece ser requentado, mas, de alguma forma, preserva um sabor de novidade – mesmo que bem de longe. É como sentir o gosto do cheiro: não é real e ao mesmo tempo é. É sinestésico.

Continua após a publicidade

Atenção! Esta crítica contém spoilers sobre o filme!

Tensão constante

A entrega ao comum sem medo de ser mais do mesmo e, ao mesmo tempo, sem querer parecer mais do que é, dá a Black Water: Abyss (título original) espaço justamente para as investidas mais sensoriais. O diretor Andrew Traucki (codiretor no filme anterior, de 2007), então, entrega-se às tentativas de causar, esteticamente, as mesmas sensações que seus personagens estão sentindo. Para isso, inclusive, Traucki foge do lugar-comum que seriam os planos hiperfechados e claustrofóbicos e investe no ambiente e na ambientação.

Por essa perspectiva, mesmo quando Eric (Luke Mitchell) e Cash (Anthony J. Sharpe) resolvem se arriscar na busca por uma saída, não existem closes excessivos. Na verdade, há um distanciamento de ambos para a revelação do quanto aquele lugar é assustador e capaz de tirar-lhes a vida em pouco tempo. Fatalmente, o medo daquilo que não é visto age como um combustível interessante para o filme. E não somente: aquilo que parece ter tranquilidade também consegue ser assustador.

Continua após a publicidade

Essa desconstrução de obviedades acompanha praticamente tudo em Medo Profundo 2: Abismo. O que parece calmo e desabitado não é; o que parece certo e para sempre esconde traições; o caminho que ficou para trás não pode ser mais acessado – assim como o passado. Traucki, às vezes, parece, de alguma maneira, lutar contra as fraquezas do roteiro, conseguindo fomentar uma tensão até nas cenas que poderiam ser calmas.

Quando, por exemplo, seria somente um breve mergulho de alguns segundo até o próximo ponto de respiração, o diretor investe em cenas debaixo d’água (sem closes) que demonstram uma agonia exagerada, mas eficiente para contornar a falta do que dizer que o texto carrega. Tudo é conduzido de um jeito pesado que – talvez sem querer – coincide com o aparente peso da água turva.

Continua após a publicidade

A composição para a trilha sonora de Michael Lira (de Escape and Evasion), além disso, consegue dar mais gravidade a tudo e, de repente, fazer com que o sentimento de urgência e pânico tenha credibilidade – especialmente porque trabalha com a música como se esta fosse um personagem (o crocodilo no caso), assim como o trabalho clássico de John Williams para Tubarão (de Steven Spielberg, 1975).

Por sorte...

Claro que, no final das contas, Medo Profundo 2: Abismo só vai conseguir causar algum duradouro e bom incômodo se o espectador estiver entregue ao filme ou se existir algo nos personagens que cause uma ligação humana. Neste caso, as chances do filme caem bruscamente porque, infelizmente, pode ser mais fácil torcer para que a criatura territorialista e assassina devore todos do que para que as personalidades insossas, as justificativas toscas e alguns momentos constrangedores vençam.

Continua após a publicidade

E isso é culpa de um roteiro pobre, que investe em uma personagem grávida para causar empatia e, possivelmente só por isso, a sustenta até o fim. Cabe à direção tentar contornar os problemas e deixar que o filme seja minimamente interessante. O resultado, então, até pode enganar bem, mas, lá no fundo, não há nada que o faça permanecer como uma experiência interessante por mais do que os 98 minutos de pipoca – o que, por sorte, pode ser suficiente.

Como curiosidade: Existe outra iniciativa de franquia que foi traduzida com o mesmo título no Brasil, mas as criaturas da homônima são tubarões. Aqueles, que no original são batizados de 47 Meters Down e 47 Meters Down: Uncaged e por aqui são chamados de Medo Profundo e Medo Profundo – O Segundo Ataque, foram lançados, respectivamente, em 2017 e 2019 e ambos foram dirigidos por Johannes Roberts.

Continua após a publicidade

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Canaltech