6 erros e acertos de Star Wars: A Ascensão Skywalker
Por Rafael Rodrigues da Silva |
A Ascensão Skywalker é um filme controverso: enquanto muita gente acha que ele foi uma enorme decepção e uma das entradas mais fracas de todo a franquia, há também uma parte dos fãs de simplesmente adorou o filme e achou o melhor final que poderíamos esperar para toda a Saga Skywalker.
Mas, independente de qual lado desta discussão você está, como qualquer outro filme da franquia o episódio IX de Star Wars não é o pior filme já lançado na história do cinema (ou até mesmo no ano de 2019), mas também não é uma obra-prima sem defeitos. Por isso, vamos elencar aqui alguns dos momentos onde o último filme da saga errou e acertou, e qual a importância disso para o filme e a franquia como um todo.
Erro: a falta de um planejamento geral
Um dos erros mais aparentes para qualquer pessoa que assista A Ascensão Skywalker é o fato de o filme ter tornado a última trilogia da saga algo quase que sem nexo. O Despertar da Força começou a indicar um caminho a seguir, Os Últimos Jedi surpreendeu ao tomar algumas decisões bem diferentes dos caminhos da franquia, e A Ascensão Skywalker se esforça para desfazer as decisões do anterior e forçar a narrativa de volta para o caminho do primeiro filme. Assim, ainda que cada filme contido em si tenha um andamento lógico bem definido, ao enxergá-los como uma trilogia ele se parece menos com uma única história contada em três capítulos e mais com a versão cinematográfica daquele meme do John Travolta que não sabe o que está acontecendo.
E, neste caso, a grande culpa disso é de Kathleen Kennedy, atual presidente da Lucasfilms. Isso porque ela parece não ter aprendido o básico de quando você faz uma série de filmes que será dividido entre diversas equipes de direção e roteiros diferentes: a necessidade de se criar um esqueleto da história completa, que será usado como base por todos os times. Kennedy deveria fazer no universo de Star Wars a mesma coisa que Kevin Feige faz nos filmes da Marvel - definir uma direção específica para onde a história deve andar, ao mesmo tempo que dá total liberdade para os diferentes diretores e roteiristas contratados decidirem como farão para ir do ponto A até o ponto B desta narrativa base - mas ao invés disso ela simplesmente “liberou geral” para quem foi chamado a trabalhar com a saga.
Isso é confirmado por Rian Johnson, diretor de Os Últimos Jedie. Em diversas entrevistas, ele afirma que até perguntou se havia algum tipo de planejamento geral para onde esperavam levar a história ao fim da trilogia, mas que em nenhum momento recebeu qualquer tipo de instrução de Kennedy sobre o que poderia ou não fazer no filme, que deu a ele total liberdade para fazer o que quisesse com a história.
E, independente da sua opinião sobre o filme de Johnson (eu pessoalmente adoro, mas você tem toda a liberdade do mundo para odiá-lo se quiser), a partir do momento que você precisa que o terceiro filme de uma franquia “corrija” o anterior porque ele “fugiu” de um suposto caminho que não foi definido antes da produção dele, qualquer problema criado pelo longa já não é responsabilidade do diretor ou da equipe de roteiristas, mas sim da pessoa cujo trabalho é justamente evitar que este tipo de coisa precise acontecer. A Marvel já provou que, quando se há um plano em mente, é possível fazer mais de 40 filmes sem perder o foco narrativo do geral, e isso só destaca a incompetência que é perder esse foco quando falamos de apenas três.
Erro: o parentesco de Rey
De todas as decisões que tornaram Os Últimos Jedi o filme mais polêmico de toda a saga Star Wars, existe uma que mesmo entre muitos daqueles que não gostaram do filme foi vista como um ponto positivo: o fato da Rey ser uma “zé ninguém”, ou seja, não ter parentesco com nenhum famoso Jedi do passado como quase todos imaginavam. A mensagem que essa decisão passava era algo muito poderoso: a de que você não precisa pertencer a um grupinho especial para ser um herói, e que qualquer pessoa, independente de sua origem, tem o potencial para fazer a diferença no mundo.
Ao desfazer essa revelação e inventar que Rey é, na verdade, a neta de Palpatine, essa mensagem de que qualquer um tem o potencial para mudar o mundo é modificada para uma mensagem muito mais “aristocrática”: de que você só possui valor se pertencer a alguma família específica. E, ainda que o filme se esforce para passar um outro tipo de mensagem positiva - a de que pouco importa o que a sua família fez no passado, o que conta são suas ações individuais do presente - essa ainda é uma mensagem menos poderosa do que a de que qualquer pessoa tem o potencial para fazer a diferença no mundo. Além disso, essa decisão também acaba com muitas possibilidades para futuras histórias, já que meio que obriga que qualquer novo grande herói inventado tenha que ter alguma relação direta com algum Jedi do passado para ser aceito, impedindo assim que esses personagens possam se emancipar e obrigando-os sempre a viverem na sombra daqueles que iniciaram a linhagem.
Erro: a retirada de informações que tornariam o filme melhor
Como sabemos, um filme pode ser arrumado ou destruído na mesa de edição. Isso porque é lá que serão definidas quais das cenas gravadas estarão no longa e a ordem na qual elas serão mostradas. Ou seja, a parte mais importante de qualquer produção cinematográfica. E, no caso de A Ascensão Skywalker, muitas informações que foram deixadas de fora ajudariam a melhorar diversas cenas que ficaram no corte final.
Um desses casos é na cena final de Lando, onde ele convida Jannah (personagem interpretada por Naomie Ackie) para saírem pela galáxia e procurar o verdadeiro pai dela. Após o lançamento do filme, o diretor J.J. Abrams confirmou que no roteiro original há a menção ao fato de Lando ter uma filha que foi raptada pelo Império ainda criança, e que tudo indicava que Jannah (que, assim como Finn, é uma ex-stormtrooper que deserdou das fileiras da Primeira Ordem) seria essa filha perdida dele. Mas, como essa informação ficou fora do filme, a cena final de Lando e Jannah, que deveria ser como uma espécie de reencontro entre pai e filha, acabou parecendo que era apenas um velho tarado passando uma cantada nojenta em uma mulher muito mais nova do que ele.
Outro caso é o da cena final do filme, quando Rey revela que não mais está utilizando os sabres de luz que herdou de Luke e Leia, mas um sabre próprio, que tem a “lâmina” na cor amarela. Antes, um adendo sobre como funciona os sabres de luz dos Jedi: normalmente um Jedi não herda ou compra um sabre de luz de alguém, mas fabrica a sua própria arma assim que termina o seu treinamento e se torna um Padawan - que seria meio que o “estagiário” da Ordem, alguém que já possui conhecimento suficiente do uso da Força para sair em missões, mas que ainda precisa estar sempre sob a supervisão de um Cavaleiro ou Mestre Jedi. Assim, como a parte final de seu treinamento, um Jedi precisa entrar nas cavernas de cristais que ficam no subterrâneo do Templo Jedi e encontrar o cristal Kiber que será usado para criar seu próprio sabre de luz.
Esses cristais não são simples minérios, mas possuem uma forte conexão com a Força e são quase que entidades “vivas”, possuindo uma conexão particular com cada membro da Ordem. Assim, um Jedi não deve apenas entrar na caverna e escolher qualquer cristal, mas prestar atenção em sua conexão com a Força e “ouvir” o chamado do material, que ressoa exatamente com a sua personalidade. Por isso, cada sabre de luz possui uma cor diferente, e essa cor costuma refletir a personalidade do cavaleiro que o empunha. Já um Sith sempre usará um sabre de luz vermelho, pois esta será a única cor emitida por qualquer cristal Kiber que tenha sido corrompido pelo Lado Negro.
Com isso bem explicado, há uma informação crucial que foi deixada de fora do filme mas que pode ser encontrado nos arquivos oficiais da Disney sobre os Jedi: o fato de que não apenas os sabres de luz da cor amarela são os mais raros que existem, como existem estudos da Ordem que revelam que essa cor pode ser adquirida ao se “purificar” um cristal Kiber que foi corrompido pelo Lado Negro.
Incluir essa informação no filme teria tornado a revelação da cor do sabre de luz de Rey no fim do longa muito mais significativa, pois indicaria que não somente ela é um tipo de Jedi raro, como também a de que muito provavelmente ela criou o seu próprio sabre a partir dos restos daquele usado por Kylo Ren. Isso criaria um momento emocional que mostra que o relacionamento dos dois foi algo tão importante para ela que fará parte para sempre de sua vida. E o sabre amarelo não apenas é uma arma que a identifica como Jedi, mas também uma lembrança de Kylo que ela carregará para sempre. Mas, sem essa explicação, não há nenhum peso emocional na cena, e tudo o que fica é a curiosidade de vermos uma cor de sabre de luz que nunca foi mostrada em qualquer outro filme da saga.
Acerto: a redenção de Kylo Ren
Desde que, em O Despertar da Força nos foi revelado que Kylo Ren é na verdade Ben Solo - o filho de Han Solo e de Leia Organa - já era esperado que o vilão estava ali fazendo o papel de “o novo Darth Vader” (algo que foi “sutilmente” mostrado pelo próprio filme quando nos apresenta Kylo como um super fã do avô vilão e que tem até mesmo o capacete com os restos do crânio de Vader na cabeceira da cama - deixando claro que Kylo não é um emo, mas um gótico moderno) e, por isso mesmo, passaria por algum tipo de arco de redenção ao longo dos três filmes.
Mas mesmo que todo este arco do vilão tenha sido extremamente previsível do primeiro ao último filme, o enorme talento de Adam Driver ajudou a tornar Kylo em um personagem muito mais carismático do que o criado pelo roteiro, e o papel que ele teve na emancipação de Rey como uma Jedi, além da morte dele nos braços da garota, é um dos momentos mais emocionantes do filme - ainda que o beijo entre os dois tenha ficado algo muito estranho e fora de tom, e talvez Driver e Daisy Ridley tenham entrado ali para a história do cinema como o primeiro casal de protagonistas jovens e extremamente atraentes que se envolvem durante três filmes inteiros e não conseguem desenvolver o mínimo de química sexual entre eles.
Acerto: a relação entre Rey e Kylo
Assim como o arco de redenção de Kylo já era algo esperado desde o primeiro filme, também já dava pra imaginar que ele e Rey teriam algum tipo de relacionamento para gerar um peso emocional no fato de serem inimigos. Porque, se Kylo é o “Darth Vader” da nova geração, Rey sem dúvida nenhuma fazia o papel de Luke, tanto que a jornada dela no primeiro filme é exatamente igual ao do herói de Uma Nova Esperança: alguém que mora em um planeta deserto, encontra um dróide que a ajuda a fugir de lá, e então descobre que possui um talento inato para manipular a energia cósmica conhecida como Força e fazer coisas que só podem ser consideradas como mágica pelas pessoas normais.
Mas, mesmo que a existência de algum tipo de relacionamento entre eles já fosse algo esperado, o que vimos ao longo dos três filmes foi uma relação muito mais complexa do que qualquer um esperava. Apesar de serem inimigos, Kylo e Rey nunca deixaram de se respeitar mutuamente, e o vilão foi extremamente importante na própria formação da garota como Jedi, ajudando-a a deixar de lados as dúvidas sobre o passado de sua família e a aceitar que são as ações dela que a definem como pessoa, e não o sobrenome daqueles que a geraram.
Mesmo que tenha tentando desfazer muitas das coisas do filme anterior, A Ascensão Skywalker mantém sabiamente a relação de respeito mútuo entre a Jedi e o Sith, e nos entrega não apenas um arco de redenção emocionante, mas também a relação mais profunda entre dois personagens do universo de Star Wars.
Acerto: as cenas de ação
Você pode falar o que quiser de como A Ascensão Skywalker tem diversos problemas de roteiro. Mas há um quesito em que o filme não possui nenhum defeito: suas cenas de ação. Não só os efeitos especiais estão perfeitos, como temos nele algumas das melhores sequências de todos os nove filmes da saga.
Rey dando um backflip e derrubando uma TIE Fighter no sabre de luz? SIMPLESMENTE ANIMAL! Finn liderando um ataque montado em Orbaks para derrubar um cruzador imperial? É PRA ISSO QUE EU PAGUEI O INGRESSO! Rey usando a conexão com a Força que tem com Kylo para passar a ele um sabre de luz na butuca? ATÉ ESCORREU UMA LÁGRIMA AQUI!
Na minha crítica sobre o filme eu deixo bem claro que, no geral, achei Ascensão Skylwaler cheio de defeitos e muito decepcionante. Mas se você não está preocupado com coisas como “implicações narrativas” e “desenvolvimento de cenário” e está ali só para ver lutas de espada laser, uso de poderzinho, batalhas entre naves espaciais e tiroteios com armas que fazem "PEW! PEW!", esse é, provavelmente, o melhor filme de toda a franquia.