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Ultrapassar a velocidade da luz é possível — e isso tem implicações incríveis

Por  • Editado por  Patricia Gnipper  | 

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grafis media/Pexels
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Em 1905, Albert Einstein postulou que a luz viaja sempre na mesma velocidade no vácuo, e desde então aprendemos muito sobre isso e foi comprovado que essa velocidade não pode ser ultrapassada por nenhuma matéria, mesmo que uma partícula se aproxime muito desse limite. Mas há uma maneira de viajar mais rápido que a luz e, ao compreender isso, saberemos qual a relação desse fenômeno com uma radiação de luz azulada e com os neutrinos, conhecidos como “partículas fantasmas”.

Ao mesmo tempo em que a luz é a recordista em velocidade no universo, ela também está restrita a sempre viajar nessa velocidade no vácuo. Por outro lado, as partículas com massa podem ganhar velocidades impressionantes se colocarmos muita energia nelas. Na verdade, fazemos isso aqui na Terra, no Grande Colisor de Hádrons, onde os prótons podem viajar a incríveis 299.792.455 metros por segundo, ou 99,999999% da velocidade da luz.

Mas o limite está aí. Não importa quanta energia adicional seja aplicada nessas partículas, o único resultado será adicionar mais uma série de números “9” à direita dos 99,999999%, ou seja, sempre estaremos abaixo da velocidade da luz no vácuo. Mas há um pequeno detalhe que talvez você já tenha percebido à medida que reforçamos a palavra “vácuo”. É que, se a luz estiver viajando em um meio, como um prisma, ou a água, por exemplo, ela perderá um pouquinho de velocidade porque mesmo as ondas eletromagnéticas (que formam a luz) precisam seguir algumas regras da física.

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Se a luz viajar por um meio, seus campos elétricos e magnéticos sentem os efeitos da matéria por onde passam, e isso acontece com muita frequência em nosso planeta. Por exemplo, é graças a esses efeitos que podemos apreciar um arco-íris no céu, que nada mais é que a luz passando por gotículas de água. Podemos reproduzir Isso com um prisma. Quando a luz passa por ele, as ondas de cada cor que compõe a luz perdem imediatamente um pouco da velocidade. É por isso que quando vemos a luz sair de um meio para outro, ela se dobra.

Por sua vez, as partículas de alta energia que viajam no vácuo terão comportamento diferente — elas não experimentam uma mudança imediata no momento ou na energia. Isso ocorre porque as forças elétricas e magnéticas que vierem a agir nessa partícula para mudar seu momento, são insignificantes em comparação com a quantidade desse momento que a partícula já possui. Com isso, qualquer mudança de trajetória ou mesmo de velocidade só vai ocorrer de maneira gradual. Apenas colisões diretas com outras partículas podem alterar essa trajetória no vácuo.

Nesse ponto, já temos o suficiente para um quebra-cabeças interessante. As partículas de alta energia no vácuo dificilmente perderão velocidade e momento a menos que haja colisão com outra partícula. Enquanto isso, a luz perde velocidade se estiver viajando por um meio. Isso significa que se tivermos em mãos partículas que se movem mais devagar do que a luz no vácuo, porém mais rápido que a luz no meio em que estiverem, estamos testemunhando uma quebra de velocidade da luz.

Parece trapaça desacelerar a luz para alcançá-la? Talvez, mas não se trata de apenas um jogo de palavras, é uma — e única — maneira real e física pela qual as partículas podem exceder a velocidade da luz quando estão em um meio. Isso por si só pode não ser uma informação muito relevante, mas aqui está o cumprimento da promessa feita no início da matéria: quando as partículas são aceleradas para ultrapassar a velocidade da luz no meio, é emitido um tipo especial de radiação de cor azul, chamada radiação Tcherenkov.

Essa luminosidade azul pode ser muito familiar para quem está familiarizado com reatores nucleares. É que essa radiação de fato aparece nesses locais, mais precisamente nos tanques de água ao redor desses reatores. Nesse meio, ou seja, na água, partículas são emitidas em uma velocidade que ultrapassa a da luz (quando a luz passa pela água, claro). O nome dessa radiação é em homenagem ao cientista soviético Pavel Tcherenkov, vencedor do Prêmio Nobel de Física de 1958, que descobriu e caracterizou o efeito.

Mas por que essa radiação é produzida? Bom, se nossa partícula carregada estiver muito rápida, passando através de um meio como a água, ela tem uma chance de colidir com uma das partículas que fazem parte desse meio. Essas partículas, por sua vez, são compostos de cargas positivas (núcleos atômicos) e negativas (elétrons), mas a maior parte do conjunto de um átomo é espaço vazio. Então, as chances de uma colisão são pequenas. O que acontece então? Nossa partícula maratonista faz com que os elétrons existentes no meio se polarizem em resposta a essa passagem em alta velocidade.

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Quando a partícula carregada vai embora, esses elétrons voltam ao seu estado fundamental, mas essas transições causam uma emissão de luz azul — na verdade, a maior parte está no espectro ultravioleta, mas este é invisível ao olho humano — em forma de cone, cuja geometria depende da velocidade com que nossa partícula passou e da velocidade da luz naquele meio específico.

E o que isso tem a ver com neutrinos? É que este é o exato processo pelo qual funcionam os detectores dessas partículas fantasmas. Os neutrinos quase nunca interagem com a matéria, o que significa que eles atravessam quase qualquer coisa em alta velocidade, inclusive nossos corpos, o tempo todo. Mas há algumas raras ocasiões em que o fazem, e quando isso ocorre eles transmitem sua energia a uma outra partícula, que viaja então em alta velocidade.

Se essa partícula “chutada” pelo neutrino conseguir ultrapassar a velocidade da luz no meio — que em detectores de neutrinos é um líquido muito puro dentro de um tanque —, será emitida a radiação Tcherenkov, e com ela os cientistas podem determinar muitas propriedades o neutrino que interagiu com a partícula no tanque. Tudo graças a este método (um tanto desleal, porém de grande importância para a física das partículas) de ultrapassar a velocidade da luz.

Fonte: Starts With a Bang