Fungo pacífico vira predador carnívoro quando está com fome
Por Fidel Forato • Editado por Luciana Zaramela | •

Na natureza, é fácil ficar surpreso com as estratégias de sobrevivência adotadas por alguns organismos, como o fungo Arthrobotrys oligospora. Na maioria das vezes, ele é pacífico e cresce em meio ao solo, só que jamais pode “sentir” fome. Se isso acontecer, vira um feroz predador e um assassino carnívoro de vermes, capaz de adotar estratégias inteligentes para capturar suas presas.
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O modo predador do fungo já era conhecido desde os anos 1980, mas o porquê desse comportamento era pouco compreendido. Pela primeira vez, cientistas da Academia Sinica, em Taiwan, e Universidade Duke, nos EUA, investigaram quais alterações provocam essa mudança brusca na personalidade.
Antes de entender tudo o que acontece com o fungo e o seu instinto assassino, confira imagens do ataque desse organismo a um verme Caenorhabditis elegans. A vítima é um tipo de nematóide, muito maior que seu algoz, capturada pelas hifas quase invisíveis do fungo, como é possível observar:
Fungo vira predador carnívoro
Publicado na revista científica PLOS Biology, o estudo revela o que provoca a mudança de atitude no fungo e quais genes são responsáveis por essas alterações. Segundo os autores, todo o problema começa quando o organismo está com fome.
"A privação nutricional desencadeia a mudança de um estilo de vida saprotrófico [que se alimenta de matéria orgânica em decomposição] para um estilo de vida predatório em fungos que capturam nematoides (NTF) e que vivem no solo”, afirmam os cientistas. Essa virada tende a acontecer quando é detectada a falta de nitrogênio no material orgânico do solo.
Mecanismos de caça ativados
Anteriormente, o mesmo grupo de pesquisadores já tinha descoberto que o fungo A. oligospora pode sentir os feromônios liberados por vermes. Se isso acontece quando se está com fome, uma série de mecanismos internos começam a ser ativados, como foi possível observar na nova investigação.
Em primeiro lugar, a replicação do DNA e a produção de ribossomos aumentam dentro das células, como se fosse uma preparação para a caçada. Em seguida, os genes envolvidos na construção de armadilhas — sim, os fungos usam armadilhas — começam a entrar em atividade.
Armadilha mortal
Em paralelo, “o A. oligospora libera sinais para atrair nemátodos para o seu micélio”, afirmam os autores. Basicamente, o predador está atraindo a vítima para o seu conjunto de hifas emaranhadas, o centro de sua armadilha mortal.
Entre as estratégias usadas, está a liberação de uma proteína conhecida como sintaxina, que é um tipo de cola natural capaz de prender o verme na armadilha. Em um dos experimentos, os cientistas bloquearam os genes que induzem a produção desse material pegajoso e descobriram que, sem a sintaxina, 70% dos nemátodos escapavam. Quando essa intervenção não acontece, os assassinos conseguem capturar quase 100% das presas.
Após o verme ser imobilizado, o fungo entra no corpo da vítima e a digere usando os seus filamentos (hifas), que absorvem os nutrientes por dentro, sem nenhuma mordida. Neste momento, os genes que codificam a protease começam a funcionar, liberando as proteínas que ajudam no processo digestivo.
"Os nematoides capturados são invadidos e digeridos pelo fungo, servindo assim como fonte de alimento”, completam os pesquisadores. Depois dessa refeição, eles podem novamente se tornar pacíficos até o próximo episódio de fome.
Fonte: PLOS Biology