Fóssil brasileiro indica que pterossauros provavelmente tinham penas coloridas
Por Augusto Dala Costa • Editado por Luciana Zaramela |
Parece que as penas são elementos mais antigos do que se imaginava na biologia — antes de aves ou mesmo de dinossauros apresentarem essa característica. A descoberta é graças a um fóssil brasileiro muito bem preservado: um Tupandactylus imperator, preservado em um bloco de calcário da Formação Crato, na Bacia do Araripe, nordeste do Brasil. Um novo estudo, feito por cientistas irlandeses, foi publicado na revista Nature na última quarta-feira (20).
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O fóssil por si só tem uma longa história, contrabandeado por décadas até cair nas mãos dos pesquisadores. Mas esse não é o único elemento curioso sobre ele, já que apresenta tecido macio preservado e estruturas de filamentos que podem ser penas — ou, pelo menos, algum tipo de plumagem semelhante à dos dinossauros — e traços de melanossoma, indicando várias cores diferentes.
O guarda-roupa dos pterossauros
Em diversos fósseis da ordem dos pteurossauros, surgida há cerca de 220 milhões de anos, podemos encontrar picnofibras, estruturas semelhantes a cabelo que podem ser ancestrais das primeiras penas na biologia.
Em 2018, pesquisadores chineses encontraram algumas picnofibras diferenciadas nos fósseis de dois pterossauros juvenis: algumas eram simples e tubulares, mas outras tinham filamentos ramificados. Ao invés de parecer fios individuais, a penugem dos animais jurássicos era mais parecida com penas primitivas. O filamento se ramificava de forma diferente das aves, mais semelhante à ramificação de alguns dinossauros — que, vale lembrar, dividem ancestrais com os pterossauros, mas são de uma ordem diferente.
O espécime encontrado no Brasil, diferente dos parentes chineses, é um adulto do início do Cretáceo que viveu alguns milhões de anos depois dos juvenis asiáticos. É a segunda vez que as penas com filamentos surgem, e, dessa vez, com novidades. O crânio parcial do Tupandactylus mostra as estruturas semelhantes a penas perto da crista do animal, e dois tipos de penugem: um com monofilamentos, como em cabelos, e "penas" que se ramificam.
Maria McNamara, coautora do estudo e paleobióloga da University College Cork, comenta que as "penas" mostram ramificações sucessivas por todo o corpo tubular, menos na base, que provavelmente ficava abaixo da pele. Ela e a equipe também escanearam o tecido macio preservado do pterossauro, encontrando organelas chamadas melanossomas, que armazenam e produzem melanina — e mais, as encontraram aos montes no tecido e na penugem, em tamanhos e formatos diferentes, indicando variedade de cores.
Controvérsias paleontológicas
Embora não seja possível determinar as cores apresentados pelo Tupandactylus, já que há aspectos químicos não detectáveis envolvidos na produção de coloração, é claro aos pesquisadores que eles variavam a cor das penas ou penugem da mesma maneira que os pássaros fazem nos dias atuais. Enquanto os pássaros utilizam as penas para voar, os pterossauros tinham outras funções para elas, como isolamento térmico, camuflagem e sinalização social, útil para identificar parceiros viáveis, por exemplo.
Como a descoberta é recente e há poucos exemplos semelhantes na literatura acadêmica — os parentes chineses do pterossauro —, há controvérsias sobre as "penas" da ordem voadora, e alguns cientistas preferem chamar as picnofibras de estruturas filamentadas, ou qualquer termo que evite envolver penas.
A descoberta de um pterossauro em uma região diferente, de um período diferente e de uma espécie diferente vem reforçar a hipótese de que as penas pudessem ter sido comuns nos parentes voadores dos dinos. MacNamara reforça que seria muito improvável essas características terem aparecido por acaso em fósseis tão diferentes. Comprovando a hipótese, seria estabelecido que as penas surgiram há 250 milhões de anos, em vez de 180 milhões de anos atrás, com os terópodes do Cretáceo.
Além de confirmar as teorias sobre as penas, também resta descobrir por que as cores dessas estruturas variam. Estudar os padrões das penas e fazer modelos delas vai ajudar a entender questões como essa, segundo os pesquisadores, que também dizem ser necessários estudar mais fósseis.
O fóssil teve uma longa jornada até chegar no Museu de Ciências da Terra do Rio de Janeiro em fevereiro deste ano: ele foi contrabandeado para fora do Brasil décadas atrás e parou nas mãos de um colecionador, que o cedeu ao Royal Belgian Institute of Natural Sciences, que fez um esforço junto à Embaixada Brasileira em Bruxelas, junto do paleontólogo Edio-Ernst Kischlat, para devolver o espécime, com um acordo de repatriação assinado em outubro de 2021.
Fonte: Nature