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Essa pode ser a explicação para o misterioso desaparecimento da Lua há 900 anos

Por| 01 de Janeiro de 2021 às 10h00

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David Besh
David Besh

Há 910 anos, um evento para lá de estranho ocorreu em nosso planeta, prejudicando colheitas e fazendo com que muitos enfrentassem a fome. Chuvas torrenciais também foram relatadas durante aquele ano e, como se isso já não fosse esquisito o suficiente, a Lua simplesmente desapareceu do céu durante uma noite do mês de maio.

Isso aconteceu no ano 1110 e sabemos disso através dos relatos de escribas da Inglaterra medieval. Mais precisamente, um escriba anônimo que deixou para a posteridade um manuscrito anglo-saxão conhecido como Peterborough Chronicle. Nele, aquele período é descrito como “um ano desastroso”, e até hoje o relato deixa cientistas intrigados com o que poderia ter acontecido em nosso planeta. Agora, talvez o mistério esteja finalmente chegando ao fim.

"Na quinta noite do mês de maio apareceu a Lua brilhando forte à noite, e depois aos poucos sua luz diminuiu", escreveu o escriba em um trecho tão fantástico que poderia ser confundido com uma história fictícia. "Assim que a noite chegou, [a Lua] foi tão completamente extinta, que nem luz, nem orbe, nem nada foi visto. E assim continuou quase até o dia, e então apareceu brilhando cheia e brilhante".

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Ele também relata como as estrelas pareciam brilhantes e cintilantes enquanto a lua desaparecia de vista, então podemos descartar a possibilidade de que tenha sido uma noite nublada. Também não há muitos indícios de que tenha sido um eclipse — se fosse esse o caso, o texto diria que houve algo semelhante à Lua de Sangue, ou pelo menos uma luz acobreada. Mas a descrição é de um vazio assustador no lugar da nossa Lua, durante toda a noite.

O que aconteceu em 1110?

Bem, talvez a chave para resolver o mistério seja observar o fenômeno como um todo. Era um ano já estranho o suficiente para chamar a atenção de qualquer pesquisador, então todas essas coisas poderiam estar relacionadas — as chuvas, a fome e o desaparecimento da Lua. De acordo com um estudo publicado em abril deste ano, na revista Scientific Reports, o evento poderia estar relacionado a vulcões.

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Hoje os cientistas sabem que a injeção de aerossóis vulcânicos é uma das grandes causas de mudanças climáticas de curta duração. A composição principal desse aerossol é o dióxido de enxofre, que pode ser convertido em gotas ácido sulfúrico, e ao entrar em contato com a água na atmosfera, essa concentração pode durar até meses após a erupção do vulcão.

Na antiguidade, cronistas relatavam os fenômenos óticos atmosféricos causados pelos aerossóis vulcânicos sem saber o que estava de fato acontecendo. Agora, os cientistas podem resgatar essas histórias e tentar comprovar que se tratava de um período de grandes erupções. Isso é feito através dos núcleos de gelo, também conhecido como testemunhos de gelo. Tratam-se de amostras, normalmente removidas de uma camada de gelo ou uma geleira de alguma montanha alta. As camadas mais internas da amostra são muito mais antigas que as externas, e geralmente preservam material de tempos atrás.

No estudo, os autores estudaram núcleos de gelo e apontam para a ocorrência de “várias erupções vulcânicas próximas”, que podem ter ocorrido na Europa ou na Ásia entre 1108 e 1110. Eles chamaram esses eventos vulcânicos de "aglomerado esquecido" de erupções, porque há pouquíssimos relatos documentados da época. A série de erupções teria liberado nuvens de cinzas que viajaram pelo mundo por anos, prejudicando as plantações e alterando o clima global. Além disso, os aerossóis vulcânicos são capazes de bloquear a visualização da Lua, mas ainda deixando estrelas visíveis — e pode ser justamente isso o que aconteceu naquela noite.

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Os pesquisadores analisaram núcleos de gelo da Groenlândia e da Antártica e encontrou vestígios de um aumento dos aerossóis de sulfato em ambas as amostras, do período entre 1108 e 1110. Outras evidências de atividade vulcânica foram encontradas em anéis de árvores — outro método de estudo, já que os anéis no interior dos troncos mudam de espessura de acordo com os padrões climáticos — que datam do mesmo período, revelando que 1109 foi um ano estranhamente frio e úmido na Europa Ocidental.

Monte Asama

A equipe também reuniu relatos da época, para buscar pistas de quais vulcões poderiam ter causado o evento. De acordo com um diário escrito por um estadista japonês entre 1062 e 1141, um vulcão chamado Monte Asama, no centro do Japão, entrou em erupção no final de agosto de 1108 e foi até o mês de outubro. Poderia ter sido esse o principal culpado pelo mistério da Lua desaparecida e pela fome?

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O estadista descreveu essa erupção como algo lançando fogo para o céu e tornando os campos próximos impróprios para cultivo, um relato que parece ter convencido a equipe de pesquisadores de que se este não foi o principal agente do ano catastrófico de 1110, ao menos contribuiu bastante para aquele cenário sombrio. “Houve um incêndio no topo do vulcão, uma espessa camada de cinzas no jardim do governador, por toda parte os campos e os arrozais estão impróprios para o cultivo. Nunca vimos isso no país. É uma coisa muito estranha e rara”.

Além disso, os pesquisadores encontraram uma "abundância de testemunhos referentes a clima adverso, interrupções de safra e fome nesses anos". Eles também explicam que "as evidências reunidas sugerem que as dificuldades de subsistência, que começaram em 1109, se agravaram na fome em várias regiões da Europa Ocidental". Ou seja, é bem provável que a erupção de 1108 tenha sido tão intensa que as mudanças climáticas se espalharam pelo hemisfério norte (até onde sabemos) durante dois anos consecutivos, ou mais. Não só isso, mas outras erupções na mesma época também podem ter aumentado o problema.

Ainda não é possível comprovar cientificamente que a hipótese apresentada nesse estudo seja verdadeira, pois se baseia em muitas evidências indiretas, e os próprios pesquisadores reconhecem isso. Mesmo assim, a pesquisa fornece a melhor explicação até o momento para o caso do desaparecimento da Lua em 1110. É um ótimo ponto de partida para estudar o “aglomerado esquecido” e resgatar esse momento trágico da história da humanidade.

Fonte: Science Alert