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LGBTech: com que ferramentas a comunidade LGBTQIA+ pode contar no Brasil?

Por| 12 de Fevereiro de 2020 às 15h10

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Cada dia mais envolvente em nosso cotidiano, a tecnologia tem sido responsável por proporcionar soluções frente a determinados obstáculos, com o objetivo de facilitar ao máximo a vida do ser humano. Em determinados momentos, os recursos tecnológicos acabam sendo ainda mais específicos, levando olhar a uma realidade específica, buscando ajudar um publico que precise daquela intervenção. E esse é o caso dos apps e das ferramentas voltadas à comunidade LGBTQIA+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgênero, Queer, Intersexo, Assexuais e mais).

A boa notícia é que o número de recursos aumenta gradativamente. No entanto, a má notícia é que o público LGBTQIA+ continua precisando desses serviços, já que o preconceito e a violência não estão nem perto de deixar de existir. Com isso em mente, o Canaltech resolveu fazer um apanhado desses recursos LGBTech, ou seja, que são criados justamente pensando na comunidade em questão.

Dandarah

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É o caso do aplicativo Dandarah, por exemplo, cujo nome é uma homenagem à travesti Dandara dos Santos, que foi assassinada em 2017. A ideia do aplicativo é fazer com que membros da comunidade LGBTQIA+ se informem, denunciem, registrem violências, e também apontem locais seguros para a população. Outro diferencial é o botão de pânico que notifica cinco pessoas cadastradas em caso de situação de risco.

No último dia 18 de janeiro, em meio a uma entrevista, a Idealizadora do projeto e especialista em saúde digital Angélica Baptista, explicou que a premissa é gerar uma grande nuvem de dados que possa ser analisada por especialistas dos movimentos sociais, pois os dados sobre esse tipo de violência ainda são difusos e escassos no Brasil, e também contou que as políticas públicas relacionadas à saúde precisam ser baseadas em evidências, para que tenham força de convencimento combatendo justamente a invisibilidade dessas pessoas. Ela conta que o app ainda está em fase de desenvolvimento. "Nós selecionamos mais de 30 apps com esse intuito. A ideia é que possa ser usado em todo o país".

Em entrevista ao Canaltech, Raphael Souza, que faz parte da comunidade LGBTQIA+, ressalta a importância de um serviço voltado à segurança: "Infelizmente nosso pais é um dos que mais matam e agridem pessoas somente pela sua orientação sexual e identidade de gênero, e vale ressaltar também que a maioria dos casos de violência é cometida por conta de religião". Raphael conta que já encontrou violência até dentro da própria casa, passando por dois casos envolvendo seu irmão mais velho. "Mesmo sendo a vitima, fui expulso de casa quando abri um boletim de ocorrência contra ele", conta o rapaz. "Fora isso nunca sofri nada na rua".

O app Dandarah é vinculado com a Resistência Arco-Íris, projeto de pesquisa para mapeamento e elaboração de ferramentas digitais para registro e denúncia de violência contra pessoas LGBTQIA+, desenvolvido pela Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz (ENSP) em parceria com a ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) e a ABGLT (Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos).

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"O aplicativo Dandarah terá abrangência nacional e sua elaboração é fruto de uma rede de colaboração de lideranças LGBTQIA+ de todas as regiões do Brasil. Além do caráter participativo da pesquisa, que envolve diretamente o público-alvo desde sua concepção, os dispositivos permitirão mapeamento e coleta qualificada de dados sobre violência LGBTfóbica, orientando e acolhendo usuários/as/es e lançando luz sobre uma realidade que tem sido historicamente invisibilizada", consta a descrição do aplicativo na Google PlayStore.

Amanda Selfie, a "roboa" trans

Além da segurança, outro assunto muito delicado para a comunidade é a saúde. Em agosto do ano passado, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Federal da Bahia (UFBA) desenvolveram uma personagem chamada Amanda Selfie, uma "roboa" (como ela mesma diz) trans cujo objetivo é abordar a prevenção ao HIV para a comunidade LGBTQIA+. A ideia é uma pesquisa voltada à verificação do uso e eficácia da Profilaxia Pré-Exposição ao HIV (PrEP), medicação que já se encontra disponível no Sistema Único de Saúde (SUS), mas que atualmente é voltada apenas a maiores de idade.

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Durante esse projeto, os jovens participantes presenciam rodas de conversas com especialistas, além de testes frequentes de HIV, para então tomar o PrEP diariamente, durante o período de dois anos. Isso porque, segundo a Faculdade de Medicina da UFMG, o público-alvo da pesquisa não frequenta os serviços de saúde por não se sentir bem acolhido, algo que acaba justamente potencializando o risco de infecção. "É de extrema importância que a informação chegue para todos, pois as dúvidas são muitas", conta Raphael Souza.

Assim, o papel da Amanda Selfie frente a tudo isso é interagir com os jovens através das redes sociais e tirar dúvidas sobre sexo, prevenção contra as infecções sexualmente transmissíveis (IST), cultura LGBTQIA+, gênero e orientação sexual.

Campanha #ConviverTransforma - Respeita Meu Nome

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No último dia 29, para homenagear o Dia Nacional da Visibilidade Trans, o Google lançou a campanha #ConviverTransforma - Respeita Meu Nome, que consiste num vídeo com a participações de pessoas trans apresentando seus nomes enquanto um poema era entoado, no fundo. O mecanismo de busca já anunciou que haverá futuros conteúdos em que estas pessoas vão contar suas histórias e situações vividas por elas, ou abordarão questões ligadas ao tema.

Tendo em mente essa data comemorativa, a gigante da tecnologia resolveu implantar uma nova ferramenta: ao pesquisar no Google "passo a passo retificação de nome e gênero”, o usuário se depara com todo um conteúdo criado pela ONG Casa 1, que mostra o passo a passo para o processo já na página de resultados. Além disso, a Consultoria Transcendemos também preparou respostas às dúvidas comuns sobre a questão trans, como “o que é uma pessoa trans” ou “o que é cis/cisgênero”? Basta pesquisar por "Transcendemos explica".

O Canaltech conversou com Marieu Amaral, trans não-binário, para compreender a importância do nome para uma pessoa trans: "A importância do nome, pelo menos para mim, é uma cereja do bolo para a identidade. Não tem só a ver com o nome que se encaixa ao seu gênero, mas ser dono de si, das suas próprias decisões", declara.

Homo Driver

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O que para muitos pode ser algo simples, para outros pode representar sinônimo de medo. É o caso das viagens de carro via aplicativos, por exemplo, como Uber, 99, Cabify, etc. Ainda que esses aplicativos façam o possível para manter a segurança de seus usuários, o medo de se deparar com um motorista intolerante é uma realidade. Foi com isso em mente que o Homo Driver foi desenvolvido. Trata-se do primeiro app que conecta motoristas e passageiros LGBTQIA+ no Brasil.

"Inspirado e feito para o público LGBTQIA+, a Homo Driver nasceu para construir uma força de trabalho a uma comunidade que já utiliza os serviços, mas não de forma satisfatória nem personalizada. Proporcionar mais tranquilidade e empatia para os passageiros durante as corridas, além de contribuir para que cada pessoa LGBTQIA+ possa se sentir apoiada, incentivada e empoderada com a liberdade para ser ela mesma", consta a descrição no aplicativo, disponível na Play Store e também na App Store.

Por enquanto, o aplicativo de mobilidade está limitado apenas a motoristas e passageiros de Belo Horizonte. Um diferencial do app em questão é que, além das modalidades de carros que a gente já está acostumado (como o mais básico, o executivo, etc), ele também conta com a versão pet e a versão baby (nesse último caso, o carro conta com cadeirinha), para você que precisa viajar com criança pequena ou com o seu bichinho de estimação. "Com isso, queremos contribuir efetivamente para que a comunidade LGBTQIA+ seja cada vez mais respeitada, incluída e representada dentro e fora da nossa plataforma", afirma a descrição do app.

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Nohs Somos

O aplicativo Nohs Somos ainda está sendo desenvolvido por uma equipe da capital catarinense. Basicamente, a premissa é dar suporte às pessoas que sofrem ou já sofreram algum ataque homofóbico. Na prática, o app vai funcionar da seguinte maneira: os usuários que forem vítimas de violência ou que estiverem se sentindo ameaçados vão poder emitir um “chamado de emergência”. Sendo, assim, basicamente um botão de pânico. Outra ideia da ferramenta é disponibilizar um mapa para mostrar os lugares seguros da região de Florianópolis. A expectativa é que seja lançado ainda neste ano.

"Devido aos crescentes números da violência contra a comunidade LGBTQIA+, sentimos a necessidade de intervir nessa realidade. Partindo de um viés social e entendendo que o conceito intrínseco da Somos acontece através da mudança na educação, nosso projeto começa a tomar forma ainda na proteção deste grupo, com a criação de uma rede LGBTQIA+ amiga, usando a tecnologia como uma ferramenta de apoio mútuo entre usuários, e que, através do aplicativo Somos, promove segurança, assistência e prevenção", conta a equipe em seu site oficial. O projeto é colaborativo, ou seja, está sendo feita uma vaquinha para que o aplicativo possa ser lançado. Atualmente, a meta é de R$ 25 mil.

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TODXs

Outro aliado à causa LGBTQIA+ é o aplicativo TODXs, desenvolvido após um ocorrido em 2016: na cidade de Fortaleza, um casal homossexual foi convidado a se retirar de um bar da capital. O motivo era que o casal estava de mãos dadas e, por isso, incomodando o “ambiente de família” do local. O casal foi expulso do local por ser gay, e foi este o real motivo da expulsão. O app TODXS foi lançado em julho do ano seguinte, no mesmo período da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo.

Basicamente, a ideia do aplicativo em questão é um mapa apurado, que possa auxiliar até advogados em todo Brasil que trabalham com esses tipos de causas a estarem mais preparados, ou até a saberem quais são as cidades e jurisprudências mais abertas a resolver problemas como esse, além de conseguir mapear as denúncias em todo país, colaborar com políticas públicas e ainda tornar mais acessíveis leis para que a comunidade reconheça seus direitos e se sinta mais segura em reivindicá-los.

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“Nós LGBTQIA+ somos alvos diários de violência, seja ela verbal, psicológica ou física, e a existência desse tipo de software hoje, pra mim, é incrível, é uma maneira de se prevenir, mas encaro isso como uma medida paliativa; afinal, a intenção é que no futuro o prenconceito seja extinto. Se daqui a alguns anos ainda dependermos deste tipo de artifício, pode ser um péssimo indício de que não evoluímos, e sim estagnamos, ou pior, regredimos como seres humanos”, afirma Reginaldo Tomaz, membro da comunidade LGBTQIA+.

Fonte: Com informações de Tilt, G1