Vírus da varíola dos macacos sofreu mutações sem precedentes, aponta estudo
Por Fidel Forato • Editado por Luciana Zaramela |
Cientistas portugueses apontam que a atual cepa da varíola dos macacos (monkeypox) carrega aproximademente 50 novas mutações e esta taxa de evolução é maior que a esperada. A descoberta foi feita após o sequenciamento genômico de amostras da infecção identificadas na Europa e, posteriormente, comparadas com as de regiões endêmicas da doença na África.
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Publicado na revista científica Nature Medicine, o preprint — estudo que não passou por revisão de pares — foi desenvolvido por pesquisadores do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (Insa), em Portugal. Teoricamente, as novas mutações poderiam explicar a atual explosão de casos da varíola dos macacos, mas ainda faltam evidências sobre o impacto dessas mudanças no código genético e a sua influência na capacidade de infectar pessoas saudáveis.
O que as descobertas explicam?
Por enquanto, sabe-se que o vírus atual é descendente da cepa responsável por um outro surto, entre os anos de 2018 e 2019, na Nigéria. No entanto, cerca de 50 novas mutações foram identificadas na atual versão. Para os cientistas, a conexão entre as amostras apontam para uma origem comum dos novos casos da varíola dos macacos.
“Este estudo apoia a hipótese predominante sobre o surto atual: um único caso importado, amplificado por um ou mais eventos de superdisseminação", explica Hugh Adler, da Escola de Medicina Tropical de Liverpool, no Reino Unido, em comunicado. A leitura sobre os resultados confirma as análises dos autores portugueses.
Apesar da pesquisa apontar para um número inesperadamente alto de mutações no vírus, "as suas implicações para a gravidade ou transmissibilidade da doença não são claras", pontua o pesquisador, que não esteve envolvido no estudo. "Não foi identificada nenhuma mudança na gravidade da doença clínica em pacientes diagnosticados no surto atual", acrescenta.
"Se a comunidade global tivesse aplicado esses mesmos recursos científicos aos surtos anteriores da varíola dos macacos na África, já poderíamos ter uma base de conhecimento mais forte”, completa o cientista Adler sobre outros cenários possíveis. Isso porque a infecção é endêmica em alguns países africanos e, anualmente, causa dezenas de óbitos, mas não foi alvo de grandes estudos até agora.
Mutações foram negativas?
Anteriormente, um estudo publicado na plataforma aberta Virological reforça o número elevado de mutações, mas explica, de forma preliminar, que as mutações presentes na atual cepa da varíola dos macacos têm um impacto negativo na sua transmissibilidade. Esta pesquisa foi coordenada por Áine O'Toole e Andrew Rambaut, da Universidade de Edimburgo, no Reino Unido.
Segundo os autores, a taxa de mutação dos vírus da varíola tende a ser lenta, mas, no caso do atual surto da varíola dos macacos, ela foi especialmente ágil. Era esperado que se formassem de uma a duas mutações por ano, o que torna as 47 em apenas 5 anos "um número inesperadamente grande", pontuam os autores.
"Como o MPXV [vírus da varíola dos macacos] é considerado um vírus zoonótico com transmissão limitada de humano para humano, esse longo ramo pode ser uma evidência de adaptação aos humanos, permitindo a transmissão sustentada que agora se observa", comentam os pesquisadores. No entanto, a maioria das mutações pode ter efeitos negativos para a disseminação do agente infeccioso.
Para entender o porquê do vírus conseguir se espalhar entre humanos e alcançar regiões onde a doença não é endêmica, novos estudos serão necessários. Por enquanto, pesquisas ainda não apontam para um consenso sobre a questão.
Fonte: Nature Medicine e Science Media Centre