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Vaza vídeo de 45 minutos de treinamento antissindical interno da Amazon

Por| 26 de Setembro de 2018 às 16h47

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Vaza vídeo de 45 minutos de treinamento antissindical interno da Amazon
Vaza vídeo de 45 minutos de treinamento antissindical interno da Amazon
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A Amazon é a segunda empresa que mais possui empregados nos EUA, perdendo apenas para o Walmart. Entretanto, esses quase 542 mil funcionários estão encontrando dificuldades para formar um sindicato. E o pior: parece que tem dedo de Jeff Bezos aí.

Segundo o que noticiou o Gizmodo norte-americano, com rumores que os trabalhadores da Whole Foods — cadeia de supermercados comprada em 2017 pela Amazon por US$ 13,7 bilhões — estavam se organizando, um vídeo de treinamento com 45 minutos de explicações sobre como desestimular a organização sindical dos funcionários foi enviado pela Amazon aos líderes de equipe da cadeia de supermercados. Os vídeos foram obtidos pelo Gizmodo e fornecem informações valiosas sobre os valores e táticas da empresa de Jeff Bezos.

Os vídeos possuem seis diferentes seções, onde o narrador declara que as técnicas ensinadas visam "fornecer as ferramentas necessárias para o sucesso quando se trata de organização de trabalho". Ainda há a frase "nós não somos anti-sindicais, mas também não somos neutros", que mais tarde é complementada com mais detalhes sobre essa não-neutralidade (ênfase exposta pelo Gizmodo):

"Nós não acreditamos que os sindicatos sejam o melhor para os interesses dos nossos clientes, acionistas ou, o mais importante, para nossos associados. Nosso modelo de negócios baseia-se em velocidade, inovação e obsessão do cliente — coisas que geralmente não estão associadas aos sindicatos. Quando perdemos de vista essas áreas de foco críticas, colocamos em risco a segurança do trabalho de todos: a sua, a minha e a dos associados", diz o material.

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O vídeo de treinamento antissindical foi publicado em um momento de crise para a empresa de Jeff Bezos, acusado de utilizar técnicas para inibir a organização sindical de seus funcionários após anos de relatórios sobre salários abaixo da média estadunidense e condições de trabalho precárias.

O vídeo não foi publicado pelo Gizmodo para proteger a fonte.

O conteúdo do vídeo

Durante os 45 minutos do vídeo, a Amazon informa que prefere optar por uma estrutura de "gerenciamento direto" na qual os funcionários apresentam suas queixas aos seus superiores imediatos, cabendo a eles a resolução dos conflitos. Na prática, essa técnica faz com que a voz dos trabalhadores seja mais facilmente calada, se assim desejar a administração de Bezos. Em julho, a Amazon desligou cerca de 1.800 funcionários de um centro de distribuição espanhol durante uma onda de protestos em centrais da empresa localizadas em países europeus. A medida foi encarada como retaliação: "A mensagem é clara — enquanto a gigante online fica rica, está economizando dinheiro na saúde de seus trabalhadores", disse Stefanie Nutzenberger, porta-voz de um sindicato alemão.

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Nesta mesma época, houve escândalos afirmando que os padrões de produção da Amazon eram tão exigentes com seus funcionários que eles eram obrigados a não fazerem intervalos no tempo de trabalho nem mesmo para ir ao banheiro, urinando em garrafas para conseguir atingir as metas. Isso tudo foi posterior ao Congresso Internacional de Sindicatos de 2014 eleger Jeff Bezos como o pior chefe do mundo, com mais de 20 mil votos do público na Internet.

"A Amazon prega que eles têm essa política de portas abertas e, quando você tenta passar por essa porta aberta, em vez de ser autorizado a entrar, você é colocado pra fora", disse um ex-funcionário de um centro da empresa em Indiana, estado do nordeste dos EUA. Um outro ex-trabalhador do mesmo centro também dividiu as dificuldades com a equipe do Gizmodo afirmando que quem se levanta para expressar direitos trabalhistas violados nessa gestão de "gerenciamento direto" é retaliado nas atividades de produção cotidiana, sendo deles exigido mais trabalho. Essa segunda fonte informa que foi demitida de seu cargo após enviar uma reclamação diretamente ao endereço de e-mail jeff@amazon.com, questionando os baixos salários pagos.

Direitos trabalhistas

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Assim como no Brasil, as principais legislações estadunidenses que conferem dignidade aos trabalhadores datam das décadas de 1930 e 1940. E o vídeo vazado da Amazon elabora sobre alguns antecedentes sobre a Lei Nacional de Relações Trabalhistas, de 1935, que garantiu à classe o direito de se organizar e tomar ações coletivas em conjunto com os sindicatos. Entretanto, a partir da quarta seção, entitulada "Sinais de Alerta", o conteúdo antissindicalista do material enviado pela Amazon aos seus líderes de equipe fica mais evidente.

Veja, abaixo, alguns trechos problemáticos que denotam a cultura antidemocrática da empresa de Jeff Bezos, indicados como exemplos de comportamentos "que podem indicar desmembramento de associado, vulnerabilidade à organização ou atividade de mobilização antecipada":

  • Uso de palavras como "salário mínimo" e "steward" [palavra de origem inglesa geralmente usada pelos sindicatos para se referir aos Administradores de Recursos nas empresas];
  • Distribuições de petições e folhetos;
  • Associados levantando preocupações em nome de seus colegas de trabalho;
  • Associados vestindo camisetas, bonés ou casacos de sindicatos;
  • Trabalhadores que não tinham relações de amizade anteriormente passando a andar juntos;
  • Trabalhadores que demonstram um interesse incomum em políticas, benefícios, listas de funcionários ou outras informações da empresa; e
  • Maior negatividade no local de trabalho.

O vídeo de treinamento ainda orienta os líderes de equipe a escutar dez funcionários aleatoriamente para verificar se suas observações constituem ou não os "sinais de alerta", como atividade didática para garantir o bom entendimento das políticas da empresa ensinadas no material.

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Nas seções seguintes, a Amazon ensina aos gerentes a fazer ameaças veladas aos funcionários interessados em se unirem aos sindicatos, afirmando que esta associação seria extremamente perigosa e colocaria o emprego deles em risco por prejudicar a inovação, diminuindo, consequentemente, as vendas — e poderia acabar acarretando em fechamento de postos de trabalho e demissões em massa.

A ideia do vídeo é explicar aos gestores que ameaçar empregados diretamente é um passo fora da linha do aceitável, mas fazer essas mesmas ameaças em tom informal, como se fossem opiniões pessoais sendo divididas amigavelmente, é totalmente legal. "As opiniões podem ser amenas, como 'prefiro trabalhar com associados diretamente' ou mais impactantes, como 'os sindicatos estão mentindo, são ratos trapaceiros!'", afirmando que os gestores estão amaparados pela legislação, caso se expressem dessa forma.

E durante todos os 45 minutos de vídeo, segundo informa o Gizmodo, os gestores de equipe são encorajados a demonstrar suas opiniões contrárias à sindicalização para seus funcionários, além de determinar que qualquer atitude suspeita de organização sindical deve ser imediatamente reportada aos Recursos Humanos e Gerência Geral.

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Posicionamentos oficiais

Após receber o material, o Gizmodo entrou em contato com a rede Whole Foods e com a Amazon, assim como com os sindicatos que estão sendo reprimidos. Um dos atuais sindicalistas que tentam aproximação com os trabalhadores da Whole Foods declarou: "A verdade é que [a empresa] tem medo do trabalho sindicalizado e esses treinamentos se comunicam com esse medo. Eu acho que os trechos [do vídeo vazado] em particular que ensinam às lideranças como sutilmente manipular conversas com os membros de suas equipes são realmente nojentas. É uma representação das piores partes da cultura da WFM".

Após três horas com a publicação do Gizmodo relatando os detalhes do vídeo, a Amazon, que estava se recusando a responder aos contatos da equipe de redação, emitiu uma declaração acusando o site de notícias de escolher trechos especialmente comprometedores do material para causar impacto contra a empresa, alegando que a visão da Amazon versa sobre como criar oportunidades de carreira para seus funcionários. O site, em uma atualização da notícia, publicou o conteúdo da mensagem recebida na íntegra, que pode ser lida abaixo, em tradução livre:

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"Estamos perplexos quanto ao motivo pelo qual o Gizmodo discorda de uma empresa que deseja envolver melhor seus funcionários, treinar centenas de gerentes para manter um diálogo aberto e direto com os associados e criar canais para impulsionar a inovação em nome do cliente em um atendimento e ambiente inclusivo. O redator nitidamente selecionou as frases do vídeo para cumprir seu objetivo editorial e não se alinha com nossa visão de como criar oportunidades de carreira para os funcionários.

Nos EUA, o salário médio por hora para um associado em tempo integral em nossos centros de atendimento, incluindo bônus em dinheiro, ações e incentivos, é superior a US$ 15 por hora, sem contar horas extras. Isso é um acréscimo ao nosso pacote completo de benefícios, que inclui plano de sáude, plano odontológico e oftalmológico, previdência, licença parental generosa e treinamento de habilidades para trabalhos sob demanda por meio de nosso programa Career Choice, que tem mais de 16 mil participantes. Encorajamos qualquer um a ver pessoalmente, fazendo uma visita em um de nossos centros de atendimento — saiba mais em http:// amazonfctours.com".

Se fosse só a Amazon...

Infelizmente, as práticas de repressão à organização sindical não são uma exclusividade da Amazon. Target, Lowe e até mesmo o Walmart têm enfrentado críticas acerca das políticas antissindicalistas adotadas.

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Fonte: Gizmodo