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Será que plantar mais árvores pode mesmo resolver a crise climática global?

Por| 01 de Novembro de 2019 às 23h00

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Será que plantar mais árvores pode mesmo resolver a crise climática global?
Será que plantar mais árvores pode mesmo resolver a crise climática global?

Nesta semana, Elon Musk virou notícia mais uma vez por prometer doar US$ 1 milhão a uma campanha que visa plantar nada menos do que 20 milhões de árvores ao redor do mundo a partir de 1º de janeiro de 2020. O objetivo da campanha #TeamTrees, apoiada pela Arbor Day Foundation, é terminar esse plantio até dezembro de 2022 porque "a restauração florestal tem o maior potencial global de mitigação climática em comparação com todas as outras soluções naturais", conforme consta no site da campanha.

Mas será mesmo que plantar essa quantidade de árvores pode resolver a crise climática global? A resposta é mais complicada do que parece, e há estudos científicos dos dois lados do "ringue". A campanha se baseia em um estudo de 2017 publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), que sugere o reflorestamento como o melhor meio de impedir que a temperatura da Terra subisse mais de 2ºC.

Os pesquisadores deste estudo usam a lógica de que árvores absorvem dióxido de carbono (CO2) do ar para se desenvolver via fotossíntese, liberando oxigênio como resultado. Sendo assim, com mais árvores realizando este processo, em teoria maior quantidade de CO2 seria retirada do ar. No entanto, outros cientistas afirmam que, infelizmente, a concentração atual de CO2 na atmosfera tem níveis muito mais elevados do que a quantidade de árvores que seria possível plantar, mesmo considerando todos os continentes do planeta.

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Em julho, foi publicado na revista Science um estudo sugerindo que o plantio de árvores em 900 milhões de hectares poderia absorver dois terços do CO2 que foi despejado na atmosfera nos últimos 250 anos. No entanto, a comunidade científica fez duras críticas ao estudo, contestando tais cálculos — e seus argumentos foram tão relevantes que a própria Science acabou publicando seis cartas de críticas recebidas. Entre as críticas, constava o seguinte: "A alegação de que a restauração global de árvores é a nossa solução mais eficaz de mudança climática é simplesmente incorreta cientificamente e perigosamente enganosa".

O motivo para tal afirmação seria a constatação de que não existe espaço suficiente na Terra para plantar árvores o suficiente, por mais que isso pareça absurdo de se afirmar. Outro estudo, também de 2017, levantou que o número de árvores que seriam necessárias para manter o aquecimento global abaixo de 2ºC seria tão absurdamente grande que a maioria das terras que já não são florestas acabaria desaparecendo, então não haveria mais pastagens e tampouco solo disponível para o cultivo de alimentos. Ou seja: resolveria o aquecimento global, mas acabaria criando uma ameaça à produção de alimentos em todo o mundo.

E, além de tudo, quando se fala em "árvores" de maneira generalizada, deixa-se de lado o fato de que não é toda árvore que pode armazenar a mesma quantidade de CO2, pois essa capacidade varia muito de acordo com fatores como região e clima.

Plantio de mais árvores pode ajudar a reverter o desmatamento, de qualquer forma

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Sob outro ponto de vista, a campanha #TeamTrees pode ajudar a reverter o desmatamento florestal, ainda que possivelmente não cause o impacto desejado para frear as mudanças climáticas. De acordo com um estudo publicado na Nature em 2015, cerca de 15 milhões de árvores são cortadas por ano em todo o mundo, sendo que nosso planeta já perdeu pelo menos 46% de suas árvores desde o início da civilização humana.

E aquele estudo do PNAS, de 2017, levantou que a Indonésia, a China, a Rússia, a Índia e o Brasil são os cinco países com maior potencial de reflorestamento; contudo, em nosso país o desmatamento da Amazônia atinge níveis sem precedentes há tempos — em julho, a cobertura florestal da região já estava reduzida em 1.345 quilômetros quadrados. Inclusive, dados obtidos por satélites nacionais ligados ao INPE indicaram que a área desmatada em julho aumentou 39% em relação a 2018.

Um verdadeiro impasse

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É fato que os níveis de CO2 na atmosfera são os mais elevados já registrados pela humanidade. Também é fato que o CO2 é um dos gases de efeito estufa, o que promove o aquecimento gradual do planeta. Por um lado, árvores são capazes de "sugar" o CO2 do ar e liberam oxigênio no processo; por outro, a situação global está tão complexa que simplesmente não é possível plantar árvores o suficiente para que elas consigam reverter a situação atmosférica. E, sob um terceiro ponto de vista, investir em plantio de árvores é uma medida que pode ajudar a balancear o problema causado pelos desmatamentos florestais, o que é um outro problema ambiental global a ser resolvido.

Mas o maior consenso entre a comunidade científica acaba sendo uma solução bastante óbvia, ainda que, na prática, não seja algo simples de se conseguir: reduzir as emissões de carbono. De nada adianta plantar árvores em toda a extensão de terra livre ao redor do planeta se as emissões de CO2 continuarem no ritmo atual, ou pior, se aumentarem. O plantio de árvores não pode ser visto como a "cura" para o problema, e sim como parte da solução.

Fonte: Science Alert, Business Insider, The Conversation