Antidepressivos descartados nos rios afetam reprodução de peixes
Por Fidel Forato • Editado por Luciana Zaramela |

Quando não há tratamento adequado da água residual, tudo o que é despejado nos esgotos termina nos rios, afetando o modo de vida e até o processo de reprodução dos peixes. O problema é que, além da “sujeira” típica, a vida aquática é afetada pelos resíduos farmacológicos, ou seja, os remédios excretados pelas fezes e urina das pessoas, como o antidepressivo fluoxetina (Prozac).
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A contaminação das águas por poluição farmacêutica já é uma realidade em diferentes partes do globo, mas a ciência compreende pouco quais são os efeitos desses compostos nos ecossistemas dos peixes.
Pensando nisso, pesquisadores da Universidade Monash (Austrália) e da Universidade de Tuscia (Itália) analisaram especificamente os efeitos do antidepressivo fluoxetina em peixes criados em cativeiro, ao longo de 15 gerações. No total, o estudo durou cinco anos de exposição contínua.
Peixes criados em águas com antidepressivos
Publicado na revista Journal of Animal Ecology, o estudo internacional se concentrou nos efeitos de diferentes concentrações de fluoxetina (baixa, média e alta) ao longo da vida de peixes da espécie Poecilia reticulata. Popularmente, a espécie é conhecida como guppy ou lebiste.
A escolha da fluoxetina foi baseada no fato deste ser “antidepressivo amplamente prescrito”, segundo os autores da pesquisa. Além disso, o poluente já foi “detectado em ambientes aquáticos em todo o mundo”. Entretanto, a pesquisa poderá futuramente ser refeita com outros remédios.
No estudo, as atenções estiveram focadas nos machos, já que são mais sensíveis que as fêmeas em relação às mudanças ambientais, particularmente em características ligadas ao comportamento, condição corporal e reprodução.
Efeito dos medicamentos na reprodução
“Mesmo em baixas concentrações, a fluoxetina alterou a condição corporal dos peixes e aumentou o tamanho do gonopódio [órgão copulatório dos machos], ao mesmo tempo em que reduziu a velocidade do esperma, um fator essencial para o sucesso reprodutivo”, explica Upama Aich, pesquisadora da Universidade Mosh e autora do estudo, em nota.
Aqui, vale pontuar que, em humanos, a fluoxetina produz “resultados semelhantes” em relação aos espermatozoides, segundo a equipe de pesquisadores.
“A exposição à fluoxetina também reduziu significativamente a plasticidade comportamental, levando a uma menor capacidade dos indivíduos de ajustar suas próprias atividades e comportamentos de risco em diferentes contextos”, acrescenta Giovanni Polverino, pesquisador da Universidade de Tuscia e outro autor do estudo.
Diante dos achados, aumentam as evidências de que a exposição prolongada a poluentes farmacêuticos, como antidepressivos, está impactando o comportamento, o histórico de vida e as características reprodutivas dos peixes, com efeitos desconhecidos para o futuro. Por isso, mais pesquisas são necessárias, além da criação de possíveis soluções.
No Rio de Janeiro, pesquisadores da Fiocruz descobriram que, muito possivelmente, por caminhos semelhantes na rede de esgoto, a cocaína está afetando os tubarões cariocas. Os animais testaram positivo para a droga, mas a equipe ainda não sabe qual os efeitos da exposição prolongada no comportamento e na reprodução.