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eBooks e eReaders "salvaram" a indústria literária nesta pandemia?

Por| 12 de Outubro de 2020 às 16h00

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Que a tecnologia vem mudando a maneira como fazemos várias coisas em nossa vida, já sabemos. Que a pandemia proporcionada pelo coronavírus apresentou um impacto muito grande em diferentes áreas, como a indústria, infelizmente também já sabemos. Mas e quanto à literária, que já se encontrava passando por uma situação delicada? Com essa questão em mente, o Canaltech conversou com profissionais da área para entender a dimensão desse impacto.

Sobre as mudanças na indústria, o especialista em tecnologia e inovação, Arthur Igreja, professor da FGV-RJ, levanta o olhar para o seguinte: "O coronavírus impactou, em um primeiro momento, a indústria em geral pela incapacidade dos trabalhadores irem até seus locais de trabalho. Muitas tiveram que fechar, seja por determinações federais, regionais, etc. E na sequência, mesmo estabelecendo protocolos de segurança, as indústrias estão sendo impactadas brutalmente pelo lado da demanda, já que a economia está muito comprometida e ninguém sabe onde está o fundo do poço".

O professor analisa que, na questão literária é ainda mais grave, pois o baque foi grande quando os shoppings estavam rigorosamente fechados, bem como as livrarias, com grandes redes anunciando o fechamento de unidades. Além disso, ele ressalta que as pessoas estão economizando muito, e o brasileiro médio não tem o hábito da leitura. Somando tudo isso, o setor literário tem uma situação das mais preocupantes.

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O impacto do coronavírus

Na opinião do diretor de marketing do Grupo Editorial Summus, Paulo Wassermann, os eBooks não salvaram a indústria editorial nesse período de pandemia, mas ajudaram a amenizar o problema, assim como o comércio eletrônico. “O fato é que as vendas de eBooks e de impressos por comércio eletrônico tiveram um aumento, mas não o suficiente, nem de perto, para compensar o estrago na queda do faturamento com o fechamento das lojas físicas. No nosso caso, em abril e maio, tivemos uma queda de 40% no faturamento total, comparando com o mesmo período de 2019”.

O diretor ainda acrescenta que a venda por comércio eletrônico que representava cerca de 15% do faturamento, passou a representar 60%. Sendo que essa venda por comércio eletrônico teve crescimento de 50% em comparação ao mesmo período de 2019. “Já com relação aos eBooks, tivemos um aumento de vendas considerável no mês de abril, cerca de 80% comparado com os meses anteriores. A conclusão é que parte da venda física se deslocou para a venda virtual. Mas ainda longe de compensar o que foi perdido com a crise”.

Por sua vez, de acordo com Janine Rodrigues, fundadora da Editora Piraporiando, a área literária vem mudando e novas possibilidades surgiram. “Claro que no cenário atual todos os mercados estão, de alguma maneira, passando por desafios mas também temos o fato de novas oportunidades estarem surgindo. Ebooks interativos, por exemplo, oferecem uma experiência para além da leitura”, aponta.

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Questionada se durante a pandemia as pessoas aderiram mais ao digital, a fundadora da editora afirma que estar acessível não significa ser acessado, e que leitura é questão de hábito, também. "Por causa das escolas, talvez o aumento tenha ocorrido para aqueles que têm agora como única alternativa bibliotecas digitais. Mas o livro físico ainda tem seu valor. Tem muita gente, adultos e crianças, que ama o impresso e outros que amam o digital".

Para entender como as editoras estão fazendo, se estão apostando unicamente nos eBooks ou ainda vale a pena investir nos livros físicos, questionamos Janine, que aponta que a Piraporiando tem investido com a mesma dedicação em físicos e digitais. "Sabemos que estes conteúdos vão alcançar públicos diferentes. Não quero convencer quem gosta do impresso a ler só digital nem o contrário. E pensamos muito na qualidade e em nossos objetivos. Até para não agir só no desespero ou emoção".

Janine acredita que, antes da pandemia, a indústria literária já estava passando por mudanças, compreendendo que o leitor e o autor estão cada vez mais independentes quanto a poder de decisão. Ela ressalta que as editoras já estavam se adaptando a isto.

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Sob o ponto de vista de Rafael Lunes, sócio fundador da plataforma de eBooks Skeelo, o que houve foi uma migração forçada para um consumo digital de literatura pela dificuldade de acesso aos livros físicos através do varejo tradicional, fechado neste período. "Por este aspecto, o coronavírus acelerou a adoção de formatos digitais, facilmente acessíveis dentro da segurança do lar, o que avaliamos ser positivo pois amplia as possibilidades de oferta de leitura de qualidade e derruba certos paradigmas em relação à baixa propensão de leitura dos brasileiros".

Livros de papel x eBooks

Então o impacto do coronavírus na indústria literária é certo, mas isso quer dizer que os eBooks estão aí para substituir os livros físicos? Estamos falando da queda de um e da ascensão do outro, necessariamente? A opinião dos especialistas é unânime: não. Não necessariamente.

Para Janine, cada um tem um papel e importância. Não concorrem, se complementam. "O livro físico traz a experiência tátil, do experimento concreto. Para crianças, por exemplo, é importante para, dentre outras coisas, o desenvolvimento cognitivo. O livro digital tem a questão da acessibilidade, da facilidade de distribuição e interatividade. Depende de quem é o leitor, onde ele está, do que ele precisa. Somos diversos e, ainda bem, nem tudo precisa ser ou A ou B", argumenta.

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Rafael acrescenta que, em mercados mais desenvolvidos em termos de livros digitais, o que se observou foi um crescimento como um todo do mercado editorial, em que pese o aumento da participação relativa do formato digital sobre o total, sem uma queda significativa do livro físico. "Nosso entendimento é que o ebook tem um potencial de promover um incremento em termos absolutos do mercado editorial pelo fato do acesso a ele ser facilitado (principalmente quando estão disponíveis em 100% dos smartphones e tablets) e não depender da capilaridade do varejo físico que sabidamente atende de forma escassa as áreas fora dos centros urbanos do Brasil", aponta o fundador da plataforma.

Quanto à recepção das pessoas em relação aos eBooks, Rafael afirma que, se considerarmos que estamos atingindo camadas da população que tinham pouquíssimo acesso a livros, onde não havia um apego prévio demasiado ao livro de papel, a recepção está sendo excelente. "O fato é que já se lê muito na tela de um smartphone e tablet, portanto a leitura de um livro por estes meios não foi algo tão “antinatural” como ouvíamos que seria. Existe um mercado até então inexplorado de potenciais leitores, muito mais preocupados com a qualidade do conteúdo do que o suporte utilizado para esta leitura".

Rafael acrescenta que, antes da pandemia, a indústria dos eBooks já estava em ascensão. "O eBook está ascensão desde o seu surgimento, porém em um ritmo que embora se entendesse satisfatório (em relação ao próprio mercado brasileiro), acreditamos que ainda está abaixo do potencial efetivo. Modelos mais democráticos de distribuição de bons eBooks, através de canais extremamente capilares e abrangentes estão provando que estamos certos".

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Para Arthur Igreja, em relação a livros físicos e eBooks, um não anula o outro. "Ao longo do tempo aprendemos que cada setor funciona bem para um determinado contexto. Então, quando surgiram os e-books todo mundo falou que seria o fim dos livros. E, em 2017, começamos a ver um crescimento e uma reconquista do mercado por parte dos livros físicos. Isso é muito normal, pois a adoção da tecnologia não é binária. Com isso, as pessoas começaram a entender que e-book é bom pelo custo, pois é possível carregar muitos livros em um tablet, dá para ler à noite em razão da luminosidade, mas a experiência sensorial e tátil obviamente só o livro tem. Por isso, acredito que ambos são complementares", analisa o professor da FGV-RJ.

Já questionado em relação à importância de uma indústria que é essencialmente física (como a literária) se adaptar à tecnologia e abraçar a inovação, Arthur dispara: "Enquadrando inovação como um jeito de fazer as coisas de forma diferente e melhores, os livros têm que ser mais interativos, caminhando para ter uma experiência aumentada, como por exemplo, seguindo o que temos no mundo online, onde um conteúdo é linkado com outro. Hoje, temos inúmeros exemplos de publicações recheadas de QR Code para encaminhar o leitor para vídeos e conteúdos complementares, que criam relacionamento e uma jornada que vai além do livro. A riqueza gráfica, a forma como o livro é feito, ou seja, inovação tem tudo a ver com esse mercado".

Livros na quarentena

Segundo Janine Rodrigues, há muita importância em incentivar a leitura nesse período de quarentena/isolamento social. "A leitura tem o poder de nos levar para outros lugares, de desenvolver nossa análise crítica e estimula a criatividade", aponta a profissional.

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Rafael Lunes concorda com esse ponto de vista. Para ele, o apelo de poder acessar um excelente título através do smartphone dentro da conveniência e segurança da sua própria casa, fez com que até os leitores mais fiéis ao livro de papel, reconsiderassem a experimentação de uma nova experiência de leitura. "Com a diminuição drástica dos deslocamentos e de atividades externas, sobra mais tempo em casa que pode muito bem proporcionar o desenvolvimento de hábitos saudáveis, como a leitura, que contribui para a manutenção da saúde mental", afirma.

"Além de fonte de cultura e conhecimento, os livros digitais são excelentes opções de entretenimento, relaxamento mental e controle do stress em um período bastante conturbado e preocupante. Enfim, uma ótima válvula de escape", o fundador da Skeelo ainda conclui.