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Fim de namoro pelo WhatsApp gera dano moral?

Por| 07 de Fevereiro de 2022 às 10h00

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Alex Green/Pexels
Alex Green/Pexels

*Escrito em coautoria com Roberta Paiva

Não há dúvida de que o WhatsApp mudou a forma pela qual nos comunicamos. Evidente que o aplicativo facilita a conversação, aproxima amigos e parentes e permite o compartilhamento de passagens do cotidiano entre pessoas que se encontram a milhares de quilômetros de distância.

Por outro lado, o uso do app em ocorrências marcadas pela impessoalidade e frieza geradas por determinadas mensagens, sobretudo as de texto, em situações que envolvam ruptura de relacionamentos (relações amorosas, trabalhistas ou comerciais, por exemplo) ou até mesmo o comunicado de uma grave ocorrência, como um sério acidente ou a morte de um ente querido tem potencial para provocar dano moral.

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Afinal de contas, há ocorrências por si só conflitantes, desgastantes, com alto teor emocional, sempre demandando bom senso, respeito, cordialidade e empatia. E é justamente nesse aspecto que os tribunais têm se debruçado quando o assunto é examinar pedidos de indenização em razão da forma do aviso de ruptura das relações ou mesmo de situações trágicas.

O Poder Judiciário é unânime: meros desgostos da vida cotidiana não geram o dever de indenizar por dano moral.

Situações envolvendo mensagens via aplicativo com a finalidade de colocar fim a algo podem trazer em si falta de humanidade, constrangimento, humilhação, impessoalidade, desrespeito, ofensa e desprezo ao próximo. O contexto será examinado pelo Judiciário a fim de saber se, de fato, o dano moral restou caracterizado.

Isso já nos faz adiantar que não parece ser o aplicativo em si o maior vilão nessas situações, mas o contexto e a forma de manifestação daquele que optou por comunicar algo tão sério por mensagem e que pode trazer em si, muitas vezes, frieza e desconsideração, fazendo com que nasça o dano moral, conforme o caso.

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É importante termos atenção para o que socialmente se espera como comunicação adequada e respeitosa tendo em vista o cotidiano altamente tecnológico, no qual muitos de nós passamos considerável parte do dia, interagindo por meio de aplicativos de conversas e das redes sociais, fechando negócios, iniciando relacionamentos amorosos e encontrando vagas de emprego, com trâmites importantes no meio virtual.

Notícia de falecimento por WhatsApp

Em novembro de 2021, o Tribunal de Justiça de São Paulo (Apelação Cível nº 1026187-61.2019.8.26.0196) confirmou a condenação de um médico ao pagamento de indenização por danos morais ao marido e filho de paciente falecida após o procedimento de cirurgia bariátrica. Resumo do voto:

“Indenização por danos materiais e morais. Falecimento de paciente que se submeteu à cirurgia bariátrica. Comunicação do óbito por meio de aplicativo WhatsApp. Conduta inadequada. Desprezo pelo aspecto humanitário. Ausência de sensibilidade do médico. Falha na forma de comunicação caracterizada, ocasionando enorme angústia, profundo desgosto, além de aflição psicológica ampliada. Danos morais configurados. Verba reparatória fixada em R$ 5.000,00 compatível com as peculiaridades da demanda. Apelos desprovidos”. (Grifamos)
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Ainda que o médico tenha alegado e comprovado que o esposo da paciente havia optado pelo aplicativo para as trocas de mensagens sobre o estado da paciente, os julgadores entenderam que isso não autorizava que a notícia da morte fosse comunicada pelo aplicativo, por se tratar de assunto extremamente delicado que mereceria tratamento com o máximo de cuidado e zelo pelo médico.

Foi entendido, com isso, que a atitude do médico de lançar mão de mensagem escrita para informar algo tão triste e angustiante serviu para intensificar o desgosto dos familiares, fazendo nascer o dever de indenizar.

Nesse caso, o instrumento usado para a transmissão da notícia da morte pesou e fez com que o médico fosse condenado, independentemente do quão educado e de quais palavras foram empregadas na mensagem de texto. O mero envio da mensagem, sem que pudesse ser estabelecido um diálogo síncrono foi entendido como algo frio e desprezível, situação em que só o olho no olho seria capaz de indicar a forma e o momento ideais da notícia.

Demissão por WhatsApp

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Outro assunto que foi bastante debatido na pandemia, tendo sido veiculado em muitos canais de informação, inclusive aqui no Canaltech (matérias 1 e 2) foi a possibilidade de comunicação de demissão de funcionário pelo WhatsApp, o que tem sido validado pelo Judiciário, afastando-se, inclusive, o dano moral.

Segundo os julgadores, o uso do aplicativo de mensagem, por si só, não causa humilhação e ofensa à dignidade do trabalhador, desde que a comunicação do desligamento do empregado se dê com cordialidade e respeito, com todo o cuidado e atenção que o momento merece.

As medidas de isolamento na pandemia do novo coronavírus confirmaram que a forma eletrônica de se comunicar a demissão do funcionário é possível, respaldada em mecanismos internos das empresas (políticas e procedimentos), com transparência e cordialidade com o funcionário.

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Nessa hipótese, diferente da primeira que trata do extremo consistente na perda da vida humana, conta muito a forma com que é feita a comunicação de desligamento, sendo aspecto fortemente considerado no exame da eventual responsabilidade civil do empregador.

Término de namoro por WhatsApp

Por fim, trazemos a reflexão existente no título: o término de relacionamento amoroso por mensagem de WhatsApp pode ser situação apta a gerar dano moral?

Conforme vimos, exceto no caso que trata da comunicação de falecimento, o tom da mensagem é o guia para fazer nascer ou não a obrigação de indenizar, inclusive em outras situações do cotidiano.

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Ainda assim, o comunicado de ruptura do relacionamento amoroso sem o contato presencial, por si só, não é capaz de ofender a dignidade da pessoa humana, gerando o dano moral, em que pese possa, talvez, demonstrar falta de maturidade ou de educação por parte de quem opta por esse caminho.

Sem contar que as relações humanas são complexas, podendo haver situações em que o olho no olho não seja mais possível e até mesmo seguro, sendo o aplicativo uma ferramenta que pode se mostrar efetiva.

Há quem defenda que muitos relacionamentos começam no ambiente virtual, não havendo qualquer problema ou desrespeito no anúncio do fim através de mensagem, existindo na internet, inclusive, várias dicas de textos para essa finalidade.

É importante lembrar que, tirando o foco da ferramenta usada para o anúncio do fim, o Judiciário tem o entendimento de que o término do relacionamento amoroso não configura dano moral, não havendo o dever de contrair matrimônio após o namoro ou mesmo de permanecer casado, situações que se encontram na esfera da liberdade das pessoas.

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Da mesma maneira, já houve o entendimento de que mensagens privadas com ofensas entre ex-casal não são capazes de ensejar indenização. Por outro lado, situações similares, mesmo no contexto privado, tiveram decisões judiciais reconhecendo o dano moral diante da extrema gravidade do contexto demonstrado ao julgador.

Logo, o assunto não é matemático e cada caso merece ser examinado e refletido não só com base na lei e na doutrina, mas com as lentes dos julgados atuais.

O Judiciário tem sido cada vez mais cauteloso ao examinar pedidos de indenização por dano moral, havendo unanimidade na exigência de configuração de ofensa anormal à personalidade e à dignidade da pessoa humana, em especial quando realizadas por meio de aplicativos de mensagens, como o WhatsApp.